A disponibilidade de recursos naturais e de matéria-prima é fundamental para o desenvolvimento da sociedade, que demanda cada vez mais novos produtos e soluções das empresas e indústrias. Há pouco tempo, entretanto, a compreensão de que os recursos não são inesgotáveis e de que sua escassez pode se tornar uma realidade não eram grandes preocupações sociais, e nem mesmo a importância da biodiversidade para a manutenção da vida humana no planeta.
De alguns anos para cá, contudo, as questões socioambientais têm ganhado cada vez mais espaço nas discussões sociais, acadêmicas, políticas e governamentais. As pessoas desenvolveram a consciência sobre a importância da preservação ambiental, sobretudo para garantir desenvolvimento para as próximas gerações.
Esse discurso foi difundido principalmente pela ONU, que adotou o termo desenvolvimento sustentável. A expressão passou a ser utilizada a partir da Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ocorreu no ano de 1972, em Estocolmo, Suécia.
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A partir dessas discussões – e dos estudos que apontam as consequências da degradação do meio ambiente e da perda de biodiversidade – levaram as empresas a perceberem que as matérias-primas já não eram mais tão fartas, e que como o seu preço varia conforme a oferta de recursos naturais, o custo de produção tem ficado cada vez mais caro.
Além disso, o entendimento de que a disponibilidade de recursos naturais, a biodiversidade, o desenvolvimento econômico e o bem-estar social estão conectados levou a sociedade a iniciar um questionamento sobre os hábitos de consumo e produção, e a aumentar suas exigências sob as empresas nas quais adquirem produtos e serviços.
“Ao longo dos anos, o tema se consolidou como diferencial competitivo de reputação, inovação e engajamento, e passou a ser visto como fonte de inúmeros benefícios”
Ricardo Voltolini, consultor e especialista em sustentabilidade empresarial
Nesse novo cenário, a sustentabilidade é o termo-chave para o desenvolvimento econômico e social. As ações e iniciativas que valorizam a biodiversidade e promovam pesquisa, preservação e recuperação da flora e da fauna – bem como a promoção da diversidade nos ambientes sociais – são cada vez mais pautadas pelas empresas e instituições.
Relação entre biodiversidade e diversidade social
A mesma linha de raciocínio utilizada para a defesa da biodiversidade pode ser utilizada para a promoção de ações que valorizem a diversidade social.
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Enquanto os ecossistemas com diversidade biológica – com diferentes espécies animais e vegetais – representam equilíbrio e maior riqueza natural; os ambientes sociais com diversidade de pessoas – com características únicas e diferentes experiências e visões de mundo – são mais sustentáveis, ricos culturalmente, possuem maior capacidade de resolução de problemas e têm maior potencial de desenvolvimento.
Para as empresas, a diversidade representa inúmeras vantagens, das quais se destacam:
- 1. Empresas diversas tendem a ser mais lucrativas e competitivas;
- 2. Nas empresas diversas, funcionários são mais colaborativos e engajados;
- 3. Senso de pertencimento maior;
- 4. Empresas focadas em diversidade são mais criativas e inovadoras;
- 5. Atração e retenção de talentos
Além disso, quanto mais diversa uma empresa, maior será a sua capacidade de compreender e atender melhor às necessidades do mercado e de gerar soluções mais eficazes.
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Cada um desses benefícios são aprofundados no Guia Diversidade para Empresas & Boas Práticas, que pode ser acessado ao clicar na imagem abaixo.
Os desafios para a biodiversidade
A Amazônia, cujo maior território está no Brasil, é um dos principais ecossistemas do planeta. Sua biodiversidade é riquíssima, tanto em espécies vegetais quanto animais. Além disso, sua existência garante regulação do clima, das chuvas e da qualidade do ar.
A biodiversidade da Amazônia sustenta, também, muitas comunidades, como de povos indígenas e ribeirinhos, que dependem da floresta para sua sobrevivência. A Amazônia possui grande potencial de exploração sustentável, principalmente para a pesquisa e produção da indústria farmacêutica e cosmética.
Entretanto, de acordo com as últimas informações de satélites, a Amazônia – que deveria ser protegida pelo programa de Desmatamento Zero proposto pelo Governo Brasileiro nos fóruns mundiais de clima – perdeu mais de 950 mil hectares de área em unidades de Conservação (UCs) e em terras indígenas e quilombolas, que deveriam ter permanecido integralmente preservados. Segundo os dados dos satélites, a Amazônia perdeu, em apenas 3 décadas, 18% de floresta.
Entre os principais fatores que colocam a biodiversidade da Amazônia em risco está a agropecuária insustentável, que desmata grandes proporções florestais para aumentar áreas de plantio e de pasto, além do intenso uso de agrotóxicos, que têm dizimado populações animais, sobretudo de agentes polinizadores fundamentais para os biomas, como as abelhas.
Segundo um levantamento realizado pela Agência Pública e Repórter Brasil, em três meses, mais de 500 milhões de abelhas foram encontradas mortas por apicultores, considerando apenas quatro estados brasileiros. De acordo com o estudo, a principal causa da morte dos insetos foi o contato com agrotóxicos à base de neonicotinoides e de Fipronil, proibidos na Europa há mais de dez anos.
Um recente relatório da ONU alerta que 1 milhão de espécies de animais e plantas enfrentam risco de extinção. O documento ainda afirma que as ações humanas ameaçam mais do que nunca a biodiversidade do planeta. Além das informações sobre o estado da natureza e dos ecossistemas, o estudo da ONU também discute o progresso em metas internacionais, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e o Acordo de Paris sobre mudança climática.
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O papel das empresas na conservação da biodiversidade
Os ODS são compromissos globais propostos pela ONU, e que englobam a sociedade civil, governos e empresas. As instituições privadas, portanto, possuem um importante papel para se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
A atividade econômica pode ter impacto positivo na conservação da biodiversidade. Aliás, ações de conservação de ecossistemas e serviços ambientais ganham cada vez mais adeptos no universo corporativo.
Para Beatriz Bulhões, diretora do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), a biodiversidade é um fator essencial para as estratégias de desenvolvimento sustentável.
“As empresas precisam conhecer seu negócio primeiro, os impactos que causam e os serviços ambientais que condicionam sua atividade. Precisam tentar entender as relações complexas e interações entre a biodiversidade e o negócio”
Beatriz Bulhões
O respeito à biodiversidade é parte integrante da responsabilidade socioambiental e dos programas de sustentabilidade de uma empresa.
De acordo com uma publicação do CEBDS, denominada “As empresas & a biodiversidade”, as estratégias de desenvolvimento sustentável devem ser diferenciadas conforme o tipo de atividade e segmento da companhia, conforme os exemplos a seguir.
- Companhias de exploração de recursos naturais (atividade florestal, pesca, recursos hídricos, mineração, petróleo e gás): como a biodiversidade está mais ligada à gestão dos ecossistemas, as empresas desse segmento precisam extrair os recursos de forma mais responsável, causando o menor impacto ambiental possível.
- Indústria florestal: como depende de recursos renováveis, as empresas desse setor precisam se atentar para uma gestão ou o manejo florestal sustentável. O reflorestamento e a conservação dos habitats originais, por exemplo, devem ser uma preocupação dessas companhias.
- Empresas de extração de recursos não renováveis: essas corporações precisam adotar práticas adequadas de gestão ambiental. Além da suspensão da licença de operação, uma gestão inadequada pode resultar na perda de oportunidades de negócios futuros.
- Indústrias de produção: de modo a não causar impactos à biodiversidade, suas instalações, localização e modo de produção devem ser planejados considerando esse fator.
- Setor farmacêutico e cosmético: a própria biodiversidade pode ser fonte de matéria-prima para a fabricação de produtos de maior qualidade.
- Segmento de serviços: as questões referentes à biodiversidade estão associadas à imagem e reputação dessas empresas, e com as causas que defendem. Além disso, esse segmento pode estar ligado a atividades que afetam a biodiversidade, como o setor de turismo. Suas práticas, portanto, devem contribuir, também, com a conscientização e sensibilização de seus públicos de interesse.
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A importância da biodiversidade para os negócios
Além dos imensuráveis benefícios que a preservação da biodiversidade representa para o planeta, os ecossistemas disponibilizam uma série de vantagens às empresas e à economia – também conhecidas como serviços ambientais.
As florestas, por exemplo, oferecem madeira, fibras e recursos genéticos, purificam o ar e regulam a temperatura. Já os rios disponibilizam água doce, energia e recreação. As áreas costeiras, por sua vez, filtram a poluição e evitam enchentes. E tudo isso pode agregar valor ao negócio.
Os líderes e gestores precisam mensurar e atribuir valor econômico a esses serviços ambientais, desenvolvendo estratégias para gerenciar riscos e oportunidades de negócio. Ao conectar a biodiversidade com a estratégia do negócio, as empresas adotam práticas mais sustentáveis e estimulam políticas públicas para proteção e recuperação dos ecossistemas. E todos os stakeholders precisam estar envolvidos, desde os cliente e funcionários até as comunidades do entorno que, de alguma maneira, são afetadas pela relação da comporação com a biodiversidade e ecossistemas.
“A conservação dos ecossistemas pode parecer dissociada da produção, mas na verdade não é. A degradação dos recursos naturais traz conseqüências negativas não só para a sociedade, mas também para o negócio”
Beatriz Bulhões
De acordo com a publicação do CEBDS, ações em prol da biodiversidade representam os seguintes benefícios para as corporações:
- Garantia de licença de operação;
- Fortalecimento da cadeia de suprimentos;
- Melhor relacionamento com todos os públicos de interesse;
- Imagem mais positiva junto aos consumidores éticos;
- Garantia de crescimento sustentável;
- Atração de investidores socialmente responsáveis;
- Melhoria na produtividade dos colaboradores.
Quando tratada como oportunidade de negócio, a biodiversidade torna-se uma aliada de empresas cuja imagem e reputação podem ser construídas a partir do conceito de sustentabilidade. E, ainda, gera bons resultados financeiros. Em empresas nas quais a biodiversidade é insumo básico de sua atividade, ações de preservação e recuperação dos ecossistemas equivale a uma estratégia de negócio.
Sobre o assunto, a Ideia Sustentável já produziu estudos sobre a biodiversidade como tendência de negócios. Esses conteúdos formam a base de palestras, workshops e treinamentos específicos sobre o tema.
Escrito por Marcos Cardinalli