Diversidade: um imperativo no cenário pós-pandemia

Diversidade: um imperativo no cenário pós-pandemia

O nosso planeta é um ecossistema complexo de muitas cores, sabores, cheiros e paisagens. É difícil explicar os diferentes tons de verde das árvores, as diferentes cores das borboletas, as diferentes texturas dos pelos dos animais. Cada lugar tem um cheiro, um aroma. Já os seres humanos são um capítulo à parte. Altos, baixos, magros, gordos, pretos, brancos, amarelos, com deficiência, sem deficiência e isso falando apenas de algumas pouquíssimas características de cada um, sem falar das diferentes e infinitas personalidades. Podemos afirmar que vivemos rodeados pela diversidade em tudo e todos que conhecemos. Ela faz parte da nossa vida e nem nos damos conta. É natural!!! Ela está no nosso dia a dia, como o ar que respiramos.

Não precisamos fazer nenhum esforço para promover a diversidade, ela simplesmente existe. Nosso planeta é incontestavelmente diverso. Você concorda?

Somos mais de 7,5 bilhões de seres humanos diversos em características, personalidades, crenças, sonhos e desejos. Mas, antes de continuar a falar sobre seres humanos, gostaria de falar sobre as espécies vegetais.

São conhecidas até o momento cerca de 400 mil espécies vegetais em todo o mundo e, todos anos, mais espécies são catalogadas. É muita diversidade vegetal, não? A ideia não é discorrer sobre essa diversidade e sim, mostrar como diversidade, resiliência e resistência são fundamentais no reino vegetal.

Em um estudo realizado, no Canadá, pela Universidade de Guelph¹ e publicado pela revista Nature, os cientistas descobriram que, quanto menor a diversidade de espécies em uma região, mais suscetível ao fogo essa região está, enquanto as regiões com maior diversidade de espécies, há maior resistência ao fogo e nos casos de incêndio recuperam-se mais rapidamente dos danos causados. Isto é, as florestas mais resistentes são as que possuem a maior variedade de plantas.

Um grupo de cientistas, em um outro estudo, na Amazônia, também publicado pela revista Nature, conseguiu demostrar por meio de um modelo biogeoquímico que florestas com maior diversidade não só de características, mas também de funcionalidades de plantas, são mais resilientes, possuindo maior potencial de adaptação a mudanças no clima. De acordo com Boris Sakschewski, do Instituto de Pesquisa de Impactos Climáticos de Potsdam, que liderou o trabalho, “é nítido que a biodiversidade não é um benefício adicional, e sim um aspecto fundamental para a sobrevivência a longo prazo das grandes reservas de biomassa da Terra, como a floresta amazônica”.

A natureza nos oferece pistas da importância da diversidade para a sua perpetuação e manutenção da sua exuberância. Não há árvores mais importantes ou mais fortes ou ainda mais bonitas que outras. É o conjunto de diferentes espécies que faz a diferença, garante a sua sobrevivência e a sua defesa contra ataques externos.

Monocultura
Floresta com biodiversidade

Aproveitando esse ensinamento da natureza e trazendo-o para dentro das organizações e para os seres humanos, um estudo realizado pela consultoria Korn Ferry, intitulado “The Inclusive Leader” (tradução livre para O Líder inclusivo) de 2016 demonstrou que equipes com maior diversidade são mais produtivas que as equipes homogêneas no médio e longo prazo.

Fonte: The Inclusive Leader, Korn Ferry

No curto prazo, pela similaridade de opiniões dos membros e ausência de discordância de ideias, as equipes homogêneas são mais produtivas, porém no médio e longo prazo, as diferenças de pensamento, de opiniões, de experiências de vida, de cultura, de família, de regionalidade, enriquecem as discussões e debates, a partir dos diversos pontos de vista, aguçam a criatividade e, consequentemente, a inovação nas empresas que possuem equipes diversas.

Então, não são só as florestas que se tornam mais fortes e perenes com a diversidade. As organizações também se beneficiam e muito dela.

Reflita comigo: como as empresas podem desenvolver produtos ou serviços que atendam às necessidades e anseios de seus clientes se não entendem as especificidades deles? Como é possível entender as especificidades de diferentes grupos de pessoas que possuem gênero, idade, classe social, raça, etnia, deficiência ou cultura diferentes se as equipes da sua empresa são formadas por membros de uma mesma universidade, de uma mesma classe social, com experiências de vida parecidas?

A melhor maneira, segundo as pesquisas realizadas por renomadas consultorias que estudam o impacto da diversidade no ambiente organizacional é ter essa diversidade representada nas próprias equipes. Quanto mais a diversidade humana presente na empresa se aproxima da diversidade populacional do local onde ela está instalada, maiores são as probabilidades dessa empresa obter resultados superiores aos dos seus concorrentes.

Na pesquisa intitulada “Delivering through Diversity” (tradução livre para Resultados através da Diversidade), realizada pela consultoria McKinsey em 2018, com mais de 1000 empresas em 12 países, os achados são que empresas com maior diversidade de gênero são 21% mais propensas a ter lucratividade acima da média, e empresas com maior diversidade étnica, 33%.

No Brasil, a Hay Group realizou uma pesquisa com 170 empresas em 2015 e identificou que 76% dos colaboradores das empresas que se preocupam com a Diversidade e Inclusão sentem que têm espaço para expor suas ideias e inovar no trabalho, contra 55% das demais e quando o ambiente de diversidade é reconhecido, os colaboradores estão 17% mais engajados.

Tanto a natureza, com sua sabedoria de bilhões de anos, como as pesquisas realizadas sobre o impacto da Diversidade e Inclusão nas organizações nos mostram o mesmo resultado. Diversidade fortalece os ecossistemas, torna-os mais resistentes e resilientes para enfrentar adversidades, capazes de se recompor com maior agilidade quando atacados.

Mais do que nunca, no cenário atual e de pós-pandemia, as empresas precisarão de criatividade, inovação, resiliência, assertividade, empatia e agilidade para enfrentar e vencer os desafios que já foram colocados à mesa. Diversidade nas equipes será um diferencial e, talvez, um dos fatores mais importantes nesse novo cenário mundial para as corporações, sejam elas pequenas, médias ou grandes.

Durante o Summit 2017 a Singularity University (comunidade global que usa tecnologias para enfrentar os maiores desafios do mundo) previu que são três as principais habilidades do futuro: ciatividade, coragem e empatia. Com a aceleração do futuro que já tivemos com o coronavírus, esse futuro é agora.

Não dá para desenvolver o olhar empático se não tivermos a oportunidade de conviver com o outro, entender suas necessidades, seus obstáculos, seus desafios e se não entendermos do outro, não conseguiremos, por exemplo, pensar em desenvolver produtos e/ou serviços para públicos que possuem especificidades diferentes das nossas e, consequentemente, não seremos criativos para públicos diferentes de nós. Somente quando compreendermos a necessidade do outro, podemos fazer algo para mudar isso e, então, encontraremos a coragem para transformar, propor, experimentar.

Infelizmente, muitas organizações têm dificuldade de enxergar o potencial de uma equipe diversa. Para que você entenda melhor o que quero dizer, faço um recorte dos seres humanos que possuem algum tipo de deficiência no mundo.

Estatísticas mostram que existem mais de um bilhão de pessoas com algum tipo de deficiência no planeta. No Brasil, segundo dados do Censo de 2010 realizado pelo IBGE, 45,6 milhões de pessoas possuem algum tipo de deficiência. É uma população maior que a de muitos países inteiros, como Colômbia e Argentina, por exemplo. Se fizermos ainda um outro recorte em relação às pessoas com deficiência que possuem idade para trabalhar, estatísticas mostram que 66% são economicamente ativas, porém menos de 1% possuem emprego formal.

Por outro lado, o Brasil possui, desde 1991, legislação para a inclusão de pessoas com deficiência em empresas que possuem 100 ou mais colaboradores. Porém, a minoria das empresas entenderam que essa obrigatoriedade poderia se tornar uma grande vantagem competitiva, ao favorecer a diversidade no ambiente organizacional por meio da inclusão de pessoas com deficiência. Em uma pesquisa realizada pela consultoria i.social em 2016, 86% das empresas responderam que contratam pessoas com deficiência somente para cumprir com a obrigatoriedade da “Lei de Cotas” (Lei 8.213/91).

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), com base em dados de 2011, cerca de 14% da população do planeta possui algum tipo de deficiência, isso daria uma pessoa com deficiência em cada sete. As pessoas com deficiência auditiva ou surdas são mais de 360 milhões em todo o mundo e, no Brasil, representam cerca de 5,1% da população, sendo que mais de 70% delas não se comunicam por meio da Língua Portuguesa e sim pela Língua Brasileira de Sinais (Libras). Em relação às pessoas com deficiência visual ou cegas, dados da OMS de 2013 informam que existem mais de 39 milhões de pessoas cegas no mundo e outras 246 milhões sofrem de perda moderada ou severa de visão. No Brasil, mais de 6,5 milhões de pessoas possuem alguma deficiência visual.

O universo das pessoas que possuem alguma deficiência auditiva e visual no Brasil é de cerca 17,2 milhões de pessoas e embora haja uma lei que torna obrigatória a acessibilidade nos sítios de internet no país, em 2019, menos de 1% dos sites brasileiros estavam acessíveis para pessoas com deficiência.

No cenário de pandemia, todos nós tivemos de praticar o afastamento social enquanto o comércio físico teve regras restritivas quanto ao seu funcionamento. Isso nos levou às compras virtuais de tudo, isto é, passamos a usar a WEB e as lojas virtuais para consumir. Novos consumidores chegaram à rede e outros tantos que já estavam dentro, intensificaram suas compras virtuais. Segundo a revista Isto é Dinheiro, “O Brasil registrou um aumento médio de 400% no número de lojas que abriram o comércio eletrônico por mês durante o período da quarentena”. Desde março, foram abertas mais de uma loja virtual por minuto.

Reflita comigo: quantas das novas lojas virtuais foram planejadas, idealizadas para serem acessíveis a todas as pessoas? Não são apenas as pessoas com deficiência que se beneficiam da acessibilidade digital. A população brasileira com 60 anos ou mais (segundo a OMS, cerca de 28 milhões em 2019, o que representa 13% da população brasileira e tende a dobrar na próxima década) possivelmente necessitem de recursos de acessibilidade digital para navegar e realizar compras nas lojas virtuais, por exemplo.

Acessibilidade digital é uma série de recursos que possibilita a navegação, a compreensão e a interação de qualquer pessoa na web (independentemente de suas dificuldades), sem ajuda de ninguém. Em outras palavras: uma internet acessível pra todo mundo!

Fonte: https://mwpt.com.br

Será que a área de Marketing, Tecnologia da Informação ou Comercial da sua empresa considerou a potencialidade das vendas para os grupos de pessoas citados?

Se somarmos a população que possui algum tipo de deficiência à população com mais de 60 anos, temos 73,6 milhões de pessoas que podem não estar consumindo da sua empresa, simplesmente porque o site da empresa não foi planejado e executado quanto a usabilidade e experiência do acesso de forma a incluir todas as pessoas que tenham alguma necessidade especial.

Se profissionais com deficiência não fizerem parte do quadro de colaboradores dessas áreas; se a empresa não tratar o tema Diversidade e Inclusão (D&I) como uma estratégia de negócio; se D&I não fizer parte da cultura e dos valores da empresa é muito difícil que soluções que exijam empatia, conhecimento profundo em relação às necessidades e dores de determinado público sejam consideradas nos projetos organizacionais.

Assim como as florestas de monocultura, os profissionais de empresas sem diversidade nas equipes têm maior dificuldade de:

  • desenvolver a empatia em relação ao outro;
  • desenvolver projetos inovadores que aumente a base de clientes, fidelizando-os por meio da conexão de seus valores/ propósito aos da empresa;
  • engajar consumidores que se interessam não só pelo serviço e/ou produto da empresa, mas também pelas suas ações socioambientais.

É uma pena!!!! Sabe a razão por que todas as empresas deveriam ter especial atenção ao tema acessibilidade? Porque é o certo a se fazer. É lei. Além de ser ético e respeitoso também.

É possível que não haja profissionais com deficiência ou com 60 anos ou mais nas áreas estratégicas da sua empresa. Sendo essa afirmação verdadeira, não existe empatia por parte dos colaboradores para entender as dores, barreiras ou desafios dessa população.

Atenção, empresas!!! Um novo consumidor chegou ao mercado com tudo. Trata-se do “consumidor ativista”. Segundo Larissa Koruki, da ONG Akatu, hoje, a intenção de compra do consumidor aumenta se ele percebe que a marca, a empresa, trata bem as pessoas e pensa no bem-estar social.

Nas organizações, assim como na natureza, a ausência de diversidade ou a pouca diversidade no quadro de colaboradores enfraquece seu ecossistema, reduz a sua força e poder de resiliência, não engaja colaboradores e consumidores, empobrece as decisões colocando em risco sua própria existência.

Agora chegou a hora da onça beber água, como escreveu meu amigo Ricardo Voltolini no artigo “Como fica a sustentabilidade nas empresas depois que o vírus passar” publicado pelo NEOFEED em 15 de abril de 2020. Antes da pandemia, a estratégia de Diversidade e Inclusão era uma escolha, uma decisão (assertiva) das empresas. No cenário pós-pandemia, será um imperativo.

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