Mercado de Carbono gera oportunidades para agricultura sustentável

Mercado de Carbono gera oportunidades para agricultura sustentável

A regulação do mercado de créditos de carbono, que tem sido amplamente discutida entre lideranças globais, pode significar boas oportunidades de negócios e investimentos para a agricultura sustentável no país.

O tema, que é discutido há anos por lideranças globais, foi destaque na COP25, conferência da ONU que ocorreu no ano passado e levantou questões importantes sobre o Acordo de Paris. O tratado, assinado por 194 países, tem como objetivo a redução das emissões de gases de efeito estufa e prevê a compra e venda de créditos de carbono.

Saiba mais sobre o mercado de créditos de carbono e sua relação com o Acordo de Paris: O que é Mercado de Carbono e como isso pode beneficiar o Brasil?

As discussões ganharam ainda mais fôlego nas últimas semanas, em um momento em que lideranças empresariais se posicionam a favor da sustentabilidade como instrumento de inovação para superar a crise econômica causada pela pandemia de covid-19.

Além de diversos manifestos a favor da sustentabilidade e contra o desmatamento – como a Carta Aberta às Lideranças Empresariais assinada por diversas entidades empresariais – os líderes têm assumido papel importante ao pressionar o governo por políticas públicas que favoreçam o desenvolvimento sustentável, e a proposta de criação de um mercado de carbono no Brasil é uma das principais pautas das reuniões realizadas com representantes do Governo.

Agricultura sustentável como geradora de créditos

O Brasil possui aproximadamente 50 milhões de hectares de áreas degradadas, segundo estudo publicado pela revista Science. Além de compor parte das metas do Acordo de Paris, transformar essas terras em espaços de reflorestamento ou em áreas produtivas com sistemas agroflorestais e de agricultura de baixo carbono poderão gerar créditos para o Brasil e atrair investimentos.

Panorama da agricultura no Brasil

De acordo com o Ministério da Agricultura, o Brasil conta com uma área total de lavouras – o que inclui grãos, cana de açúcar, cacau, café, laranja e mandioca – de 77,7 milhões de hectares. Esse número deve subir, ainda, para 88,2 milhões até 2030, segundo o estudo “Projeções do Agronegócio, Brasil 2018/2019 a 2028/2029”, produzido em parceria com a Embrapa.

O crescimento da área de lavoura é puxado pelo aumento da demanda de grãos, como milho e soja, que deve saltar de 250,9 milhões de toneladas para 318,3 milhões.

Infográfico sobre a projeção para os próximos 10 anos. A imagem possui a ilustração de um silo e um gráfico com duas barras, uma referente a 2019/2020 - 250,9 milhões - e outro referente a 2029/2030 - 318,3 milhões -. Há o escrito "acréscimo de 27".
Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

“A área plantada de grãos vai aumentar 16,7% e a produção deve aumentar 27%. Isso significa que o crescimento vai se dar pelos ganhos de produtividade. Mesmo nas áreas de fronteira, a produtividade vai puxar o crescimento, não a área”, comenta José Garcia Gasques, coordenador-geral de Avaliação de Política da Informação do Ministério da Agricultura.

Contudo, a regulação do Mercado de Carbono no Brasil, as metas exigidas pelo Acordo de Paris e o posicionamento de líderes e da própria sociedade geram uma pressão para que o país busque o desenvolvimento sustentável, o que afeta diretamente a produção agrícola.

Paradoxo climático da agricultura

A atividade no campo é completamente dependente do equilíbrio no clima global. Cada cultura tem suas próprias características e, portanto, se adapta melhor a determinadas regiões. O que é plantado no sul do país é diferente do que é cultivado na região Centro Oeste que, por sua vez, difere dos cultivos no Nordeste. Isso se dá pelas diferenças de temperatura, umidade do ar, condições do solo, altitude e latitude, entre outras condições específicas de cada região.

As mudanças climáticas, causadas principalmente pela emissão de gases de efeito estufa, impactam diretamente no clima das microrregiões e, consequentemente, afetam de forma negativa a produtividade agrícola.

Por outro lado, a atividade no campo é um dos principais responsáveis pelas mudanças climáticas. “Pelo menos um quinto das emissões totais de gases do efeito estufa pode ser atribuído ao setor agrícola”, afirmou José Graziano da Silva, diretor-geral da ONU para a Alimentação e a Agricultura (FAO), durante a COP25.

“Reduzir o desmatamento, recuperar terras e florestas degradadas, acabar com as perdas e o desperdício de alimentos, melhorar o ‘sequestro de carbono’ pelo solo e promover a pecuária com baixas emissões são apenas algumas das soluções conhecidas para abordar, ao mesmo tempo, a fome, a pobreza e a sustentabilidade”, completa José Graziano em seu discurso.

Segundo o estudo do Ministério da Agricultura, a expansão do setor, de modo a atender o aumento da demanda de produção, exigirá investimentos em infraestrutura, pesquisa e financiamento. Se esse investimento é crucial para o desenvolvimento do setor, cabe ao Governo atender as expectativas globais traduzidas no Acordo de Paris e nos manifestos assinados pelas lideranças empresariais e sociedade civil e investir em um desenvolvimento que considere a redução dos gases de efeito estufa e promova a agricultura sustentável.

Soluções para o Brasil

O aumento da produção agrícola e a diminuição das emissões de gases de efeito estufa não são, necessariamente, fatores antagônicos. É o que afirma Eduardo Bastos, diretor de Sustentabilidade da Bayer, em entrevista para a Ideia Sustentável.

Bastos é uma das lideranças que têm discutido com o Governo a criação de um mercado de carbono no Brasil. Para ele, no caso da agricultura, o setor representa uma grande oportunidade para a geração de crédito de carbono e pode atrair investimentos para o desenvolvimento sustentável do país. E por acreditar nesse potencial, a própria Bayer tem investido em inovação para o setor.

Em parceria com a Embrapa no Brasil, a empresa lançou um programa para recompensar agricultores que gerarem créditos de carbono a partir de práticas agrícolas sustentáveis. Intitulado Iniciativa Carbono Bayer, o projeto utiliza uma metodologia de mensuração da captura de carbono, baseada em dados científicos e anos de pesquisa.

A iniciativa, que tem como uma de suas metas reduzir 30% das emissões do setor, envolverá aproximadamente 1.200 agricultores no Brasil e nos Estados Unidos, e todos receberão assistência da empresa para a implementação de práticas sustentáveis com foco em produtividade com baixo impacto climático. No Brasil, foram selecionados cerca de 500 produtores rurais, de 14 estados brasileiros, que possuem cultivos principalmente de soja e milho, culturas que devem aumentar sua produção em 27% em 10 anos, conforme o estudo do Ministério da Agricultura.

De acordo com Eduardo Bastos, para participar da iniciativa foram selecionados produtores sem nenhum tipo de problema socioambiental, como trabalhos análogos à escravidão ou desmatamento de áreas de preservação ambiental. E todos têm demonstrado interesse em melhorar suas práticas agrícolas, contribuindo com a sustentabilidade do país e com a reputação do agronegócio.

Tecnologia para agricultura sustentável

Não falta tecnologia e conhecimento para levar a sustentabilidade ao campo, afirma o diretor da Bayer, mas falta acesso, infraestrutura e investimentos.

“Quando falamos de conhecimento em sustentabilidade no campo, algumas práticas são até milenares, como a rotação de cultura para preservar o solo. E é nosso objetivo incentivar essas boas práticas, como o uso racional de agrotóxico, a melhoria na gestão de pragas, o plantio direto, a preservação ambiental no entorno e a própria rotação de culturas. Sobre as mudanças climáticas, o produtor entende muito bem como afeta negativamente a microrrealidade na qual está inserido, e também por isso o interesse na iniciativa tem sido bastante alto”, comenta.

Segundo ele, além do incentivo a boas práticas para uma agricultura sustentável, que inclui a captação de carbono, a iniciativa quer promover a digitalização de dados, para que se possa contribuir com gestão de conhecimento e mensuração dos resultados, além de outros benefícios como rastrear pontos de desmatamento e, também, conectar os produtores que geram crédito de carbono a esse mercado em desenvolvimento.

“O Brasil é uma grande potência agrícola e uma grande potência ambiental. Podemos trabalhar com ambos potenciais, pois além de não serem antagônicos, podem se tornar complementares se investirmos no desenvolvimento sustentável do país”, conclui Eduardo Bastos.

Os agricultores participantes desse programa liderado pela Bayer também são usuários da plataforma digital Climate FieldView. De acordo com a empresa, a ferramenta tem papel importante nas medições e implementação do programa. A iniciativa já está em início para a safra 2020/2021, em cerca de 60.000 hectares. O investimento estimado no Brasil é de cerca de 5 milhões de euros ao longo de três anos.

Leia também: Sustentabilidade é estratégia para vencer a crise

Escrito por Marcos Cardinalli

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