Por Roseli Gonçalves
De 18 a 20 de setembro, a Universidade de Aarhus, uma pequena cidade na costa leste da Dinamarca, sediou a “2nd CSR Communication Conference”.
Dando continuidade à primeira conferência, realizada em Amsterdã em 2011, o evento deste ano teve como fio condutor a busca de uma maior conectividade entre teoria e prática na área de Comunicação de atividades de Responsabilidade Social Corporativa (CSR).
Durante três dias, cerca de 100 participantes vindos de 23 países diferentes discutiram em sessões e oficinas paralelas temas como “legitimidade e confiança”, “CSR e relações com stakeholders (partes interessadas)”, “CSR como fator de risco em tempos de crise”, “CSR na prática”, “CSR, identidade e cultura”, “comunicação de CSR em países emergentes”, “CSR e mídias sociais”, entre outros.
Professores universitários de prestígio internacional, doutorandos e mestrandos apresentaram seus trabalhos de pesquisa e alguns casos de estudo, enquanto que profissionais dos setores de marketing, relações públicas e comunicação contribuíram com exemplos concretos de como corporações têm concebido e comunicado suas atividades na área de responsabilidade social.
No contexto de desenvolvimento sustentável e gestão responsável, o conceito de marketing tem evoluído nos últimos anos, de uma lógica “um-para-muitos, dominada pela maximização do lucro” para uma lógica mais diversificada e inclusiva. A capacidade dos stakeholders essenciais de uma organização de responder às suas atividades de gestão responsável vem se tornando um elemento-chave na área de marekting desde o ano 2000. A crescente afluência à moderna tecnologia de informação permite que indivíduos possam se expressar e colaborar uns com os outros.
A proliferação das mídias sociais abre ao público a possibilidade não somente de consumir informação, mas também de criar notícias e ideias, assim como de interagir diretamente com um vasto espectro de grupos sociais, inclusive corporações. Esta nova forma de comunicação permite que indivíduos se transformem de meros consumidores em “prossumidores”, os quais têm o poder de influenciar e até mesmo de decidir sobre a sobrevivência de uma empresa no mercado.
Dentro deste contexto, a prática do “greenwashing” não é mais considerada como uma “infração menor”. Não somente consumidores, mas a a sociedade como um todo está exigindo práticas de negócio mais coerentes e transparentes. Governos e instituições internacionais estão criando o quadro normativo necessário para que o setor privado possa lidar com as mudanças. A credibilidade de uma marca tornou-se uma conditio sine qua non para garantir e manter reconhecimento/reputação no mercado.
Desta forma, tão importante quanto o “walking the talk” é a habilidade de uma empresa de comunicar seu compromisso com sustentabilidade de forma eficaz. Portanto, o “talking the walk”, apoiado por uma estratégia de comunicação de CSR bem concebida, pode trazer inúmeras vantagens para um negócio.
A chave para um processo eficaz de marketing e comunicação da sustentabilidade de uma corporação está em alcançar um alto equilíbrio entre o valor criado para seus stakeholders e o grau de eficácia da comunicação, de forma que mensagens fidedignas sobre o desempenho sustentável da empresa sejam plenamente compreendidas por estes stakeholders. Ou seja, “o x da questão” está em despertar nos stakeholders o sentimento de boa vontade, seguido de credibilidade na marca (stakeholder goodwill).
Em minha contribuição para a conferência, na sessão “CSR na prática”, eu analisei o modelo de negócio sustentável da empresa americana TerraCycle, bem como suas atividades de marketing e comunicação. Tendo iniciado com a ideia de comercializar adubo feito de excremento de minhocas, a empresa vem inovando e expandindo seus negócios de forma extraordinária no setor de coleta e reciclagem de lixo, desde a sua fundação em 2001, alcançando hoje o marco de mais de 250 produtos, patrocinados por mais de 100 marcas em 23 países.
O Brasil foi o primeiro país estrangeiro no qual a empresa se instalou, em 2009, e constitui hoje seu segundo maior mercado. Além de seu conceito inusitado para o tratamento de resíduos que normalmente iriam parar em um “lixão” ou em um incinerador, a TerraCycle vem aplicando com sucesso algumas ferramentas de comunicação de marketing responsável e CSR em todos os países onde atua, a saber:
– Cause-related marketing: Suporte a escolas e organizações sem fins lucrativos através da doação de 2 centavos por unidade coletada (da respectiva moeda de cada país, doados pelo patrocinador do respectivo programa).
– Social marketing: Toda a estratégia de marketing da TerraCycle visa “eliminar a ideia de lixo”, incitando as pessoas a repensar sobre seus padrões de consumo e seu conceito do que é lixo (behaviour change).
– Vision and Mission Statement: As práticas da TerraCycle (tanto internas como externas) têm mostrado que a empresa vem perseguindo de forma coerente e firme sua visão de que um negócio de sucesso não pode mais estar desligado das questões ecológicas e sociais.
Desde a sua criação, a empresa vem utilizando a estratégia de promoção tipo “pull”, comunicando-se diretamente com seus grupos-alvo através de diversos canais, predominantemente via sua página web, mídias sociais, vídeos curtos e artigos em jornais online. As equipes de trabalho também recebem frequentemente convites para entrevistas no rádio e na TV. Vale ressaltar que a TerraCycle não dispõe de um orçamento para atividades de marketing e relações públicas. Todas as suas atividades de comunicação são de “produção caseira”, concebidas e realizadas pelas suas próprias equipes de trabalho.
O painel de encerramento da conferência apontou uma questão crucial no contexto de CSR e sustentabilidade: a Comunicação de CSR, que começou como uma espécie de “solução-tampão”, vem se tornando cada vez mais uma “questão de gestão de risco”. Atuar de forma ética e comunicar de forma eficaz constituem hoje um binômio inseparável e indispensável para se garantir a credibilidade de uma marca.
Considerando o caráter do negócio da TerraCycle e a sua trajetória nesses doze anos de existência, eu diria que a empresa vem cumprindo esta premissa, ou seja, “they are walking the talk and talking the walk”. Que muitas outras organizações possam inspirar-se em exemplos como este!
Os interessados em saber mais sobre a conferência e a TerraCycle podem acessar as respectivas páginas web: www.csr-communication-conference.org e www.terracycle.com.br.
Roseli Gonçalves é graduada em Estatística pela UFRJ, cursou Letras (alemão e línguas românicas) na Universidade de Bremen/Alemanha e é mestre em Gestão Responsável pela Steinbeis University Berlin. Vive e trabalha em Bremen desde 1991.