Especial – Quem produz “verde” no Brasil?

Especial – Quem produz “verde” no Brasil?

Levantamento destaca principais tendências em produtos verdes e revela quem está aproveitando – e como – oportunidades de negócios socioambientais
Nas últimas décadas, os produtos industrializados trouxeram uma série de facilidades de tal modo incorporadas ao cotidiano que é difícil imaginar a vida moderna sem bens de consumo, como a máquina de lavar roupas e o automóvel, apenas para citar dois exemplos. Todo esse esforço de inovação, no entanto, não veio acompanhado da devida democratização do acesso a tais benesses, tão pouco da internalização dos custos dos impactos causados ao meio ambiente para sua produção e consumo.
Excesso de embalagens, utilização de materiais não recicláveis ou tóxicos, processos que demandam grande quantidade de água e energia são algumas características da produção industrial do século 20, que em tempos de escassez de recursos e aquecimento global tornaram-se objeto de preocupação. Diante da pressão pública por soluções menos impactantes em termos ambientais e sociais, a sustentabilidade tem ganhado ênfase nos processos de inovação e posicionamento de mercado de muitas empresas, esforço que pode ser verificado pelo aumento do número de produtos disponíveis no mercado que oferecem vantagens socioambientais.
A tendência, já consolidada em muitos países desenvolvidos, começa a dar sinais nas economias emergentes. E o Brasil, devido às suas vantagens comparativas naturais (matriz energética limpa e rica biodiversidade), além de um mercado consumidor em expansão, apresenta grandes oportunidades para o desenvolvimento sustentável.
No entanto, muitas empresas nacionais ou com atividades no País ainda receiam fazer grandes investimentos na área por não saberem a real disposição dos consumidores em recompensar – por meio da sua decisão de compra – as soluções “verdes.” Já os consumidores, por sua vez, apontam como barreiras ao consumo responsável a falta de opções e informações claras quanto aos atributos socioambientais e a diferenciação de preço em comparação aos itens convencionais.
A procura de respostas para este quadro, Ideia Socioambiental decidiu investigar quem investe e quem consome produtos sustentáveis no Brasil? Nos últimos dois meses, a equipe de redação levantou os principais estudos nacionais e internacionais sobre o tema e iniciou um levantamento que tomou como ponto de partida um universo de 60 companhias (B2Bs, indústrias de bens de consumo e varejistas). Contatadas, essas organizações receberam um questionário com as seguintes perguntas: (1) Sua empresa possui produtos sustentáveis destinados ao mercado brasileiro?  Quais são essas soluções, suas vantagens e a que públicos se destinam? Qual o investimento destinado ao desenvolvimento desses produtos?
Finalizada a primeira etapa, Ideia Socioambiental recebeu respostas de 20 companhias, cujo conteúdo — apresentado, discutido e analisado a seguir –ajuda a refletir sobre o estágio da produção verde no Brasil. Saiba o que pensam empresas, consumidores e especialistas e tire também suas conclusões.
Diferencial ou pré-requisito?
Orgânico, ambientalmente amigável, responsável, verde, carbono neutro, ecoeficiente, sustentável. São muitos os adjetivos utilizados para descrever os atributos socioambientais de um produto. O campo para desenvolvimento dessas vantagens é bastante vasto. Vai desde a eliminação de substâncias tóxicas e redução de quantidade de matéria-prima e energia por unidade produzida até a utilização de materiais biodegradáveis ou recicláveis e o prolongamento da vida útil dos produtos. Tais características constituem um elemento importante de diferenciação no mercado.
Segundo Roberta Cardoso, pesquisadora do Centro de Excelência no Varejo da Fundação Getúlio Vargas, corporações que investirem e souberem comunicar os benefícios socioambientais de um produto terão vantagem competitiva, seja com seus clientes B2B ou com os consumidores finais.
No entanto, a responsabilidade pelos impactos de todo o processo produtivo, assim como no pós-consumo, deveria ser um pré-requisito para as empresas no atual contexto que coloca desafios urgentes como o combate às mudanças climáticas. “Hoje, falamos de atributos socioambientais como algo especial, que possui um diferencial. Mas, em breve, isso deve se tornar um padrão no mercado”, afirma Roberta.
A trajetória mais comum percorrida pelas empresas no campo da inovação sustentável começa com o lançamento de linhas de produtos baseadas em atributos “verdes.” Desse modo, a grande maioria dos projetos nasce nos núcleos corporativos de pesquisa e desenvolvimento que, em conjunto com as equipes de marketing, assumem a missão de construir soluções que integrem benefícios econômicos, ambientais e sociais, alinhadas às necessidades do consumidor.
Para não errar a mão, algumas delas contam com ferramentas específicas que orientam suas decisões de investimento. É o caso, por exemplo, da BASF, que implantou a análise de ecoeficiência, possibilitando a avaliação dos impactos ao longo do ciclo de vida.
Hoje a empresa tem 350 projetos mapeados, entre eles produtos como o EcobrasTM, um plástico biodegradável de fonte  renovável que se comporta como um composto orgânico normal, podendo
ser aplicado  em  diversas embalagens.
A HP, por sua vez, conta, desde 2008, com um comitê executivo denominado HP Eco Solutions Team para atender à demanda de negócios e metas de sustentabilidade da empresa, com foco em comunicação junto a seus stakeholders. Os computadores da companhia foram os primeiros a atingir 80% de eficiência energética.
Para Kami Saidi, diretor de sustentabilidade ambiental da HP, quando se fala em sustentabilidade, só discurso vale pouco: ou a empresa exerce o conceito na prática ou simplesmente não o faz.  “Não é apenas um ato, mas um processo que começa na concepção do produto, passa pela manufatura, e segue na distribuição e pós-consumo. Muitas empresas podem alegar, por exemplo, que trabalham com logística reversa e, por isso, seus produtos são sustentáveis. Mas não basta. É necessária uma gestão completa”, ressalta o diretor.
Ciclos produtivos fechados
Estabelecer ciclos produtivos fechados é uma das preocupações das companhias. Dessa forma, além da retirada e transformação das matérias-primas, a destinação final dos produtos também passa a ser considerada no projeto.
Na Philips, o conceito EcoDesign consiste em diretriz para o desenvolvimento de uma série de produtos, com cinco focos principais de criação, chamados green focal areas, que incluem aspectos como peso, uso de substâncias tóxicas, consumo de energia, reciclagem/descarte final e embalagem. Para a produção de lâmpadas, existe uma preocupação extra relacionada ao tempo de vida útil.
A Henkel, por sua vez, participa da iniciativa global Product Carbon Footprint (Pegada de Carbono de Produto), que visa mensurar as emissões de carbono dos produtos ao longo de todo o ciclo de vida. O projeto, que teve seus primeiros resultados divulgados recentemente, identificou a necessidade de uma medição padronizada das emissões de gases que causam o efeito estufa, além da importância de comunicar essas conclusões de forma clara ao consumidor. “O produto acabado é avaliado, inclusive, na fase de consumo. Essa pegada de carbono é muito mais significativa em detergentes, produtos de higiene pessoal e cosméticos, nos quais grande parte do ciclo de vida depende da forma de utilização pelo consumidor”, ressalta Sergio Crude, gerente de Engenharia e Sustentabilidade da Henkel.
Até o final do projeto-piloto, a empresa pretende fornecer análises para selantes utilizados na construção civil (de sua linha Sista) e de adesivos para embalagem industrial (da linha Liofol), disponíveis no mercado nacional.
Responsável pela revolução do plástico no século 20, a indústria petroquímica começa a desenvolver alternativas a esse material de uso intensivo de petróleo. O polietileno verde da Braskem é um bom exemplo de investimento nessa direção. Além de ser biodegradável, o material provém da cana-de-açúcar, uma fonte renovável. O audacioso projeto para produção do PE Verde (também chamado de plástico verde) foi anunciado em julho de 2007 e a planta para a sua produção começou a operar em outubro de 2009. O esforço da empresa também se dá em outras duas frentes: na divulgação do conceito do polietileno verde em todo o mundo e na busca de parcerias com clientes e pesquisa em novos produtos. O investimento total, que compreende a construção da planta, é de R$ 500 milhões.
A empreitada tem estimulado a empresa a rever processos produtivos em outros segmentos que ainda utilizam derivados do petróleo. “A área de desenvolvimento de mercado auxilia nossos clientes a reduzir o peso das embalagens e fazer estruturas mais leves, que ajudam a atender a demanda de produtos mais sustentáveis”, destaca Leonora Novaes, líder do projeto PE Verde da Braskem.
No Brasil, a companhia já tem contratos assinados com a Brinquedos Estrela, que lançou uma edição limitada do Banco Imobiliário Sustentável, fabricando as peças plásticas do jogo em PE Verde. Outras parceiras são a Cromex, líder brasileira de concentrados de cor, e a Acinplas, que produz sacos plásticos para hortifruti. Recentemente, a Braskem também firmou uma parceria com a Johnson & Johnson para produzir as embalagens da linha de protetores solares Sundown a partir do verão de 2011/ 2012.
A somatória de esforços, recursos financeiros e expertises aumenta as chances de sucesso de qualquer projeto verde. Essa foi a aposta da Siemens e da Eletropaulo ao desenvolverem conjuntamente o transformador a seco submersível Drysub, que não utiliza óleo e não contamina o meio ambiente. Para criar soluções desse tipo, a empresa mobiliza um grupo de trabalho multidisciplinar, com engenheiros, especialistas em métodos e processos, fornecedores e colaboradores da fábrica, treinando-os, quando necessário, na sede alemã.
Atuando no mesmo segmento, a General Eletric dispõe de uma linha denominada Eco-imagination, que reúne soluções como a locomotiva Evolution, capaz de reduzir as emissões de carbono em 40% na comparação com os modelos das primeiras locomotivas certificadas nos EUA de acordo com as especificações ambientais da agência reguladora do governo. Além disso, o modelo proporciona uma economia de custo de manutenção da ordem de 10% aos consumidores. No Brasil, a companhia desenvolve pás eólicas por meio de uma empresa parceira, a Tecsis.  Lançada em 2004, a linha Eco-imagination, que contabiliza cerca de 80 produtos em todo o mundo, já tem 38 deles em circulação no País.
Para o presidente e CEO da GE para a América Latina, Rogério Patrus, há uma demanda significativa por soluções mais sustentáveis. “O governo está investindo, e requisitando mais tecnologia, assim como empresas brasileiras do porte da Petrobras, Vale e Embraer. Vemos um mercado crescente para compartilhar nossas soluções. Há uma grande oportunidade para desenvolver produtos e projetos em transportes, energia, infraestrutura e recursos hídricos, entre outros”, destaca o CEO da GE.
Na área de varejo, as parcerias do programa Garantia de Origem, do Carrefour, envolvem de pequenos a grandes produtores para atender as exigências socioambientais estabelecidas pela companhia. Hoje, o programa conta com 75 itens de quase 200 fornecedores já classificados. “A própria empresa toma a iniciativa de buscar fornecedores que possam se enquadrar no perfil, levar o know-how e auxiliar na adaptação necessária do produtor para uma posterior certificação”, revela Paulo Pianez , diretor de sustentabilidade do Carrefour.
O Wal-Mart iniciou em 2009 o projeto Index, um sistema de indicadores para produtos. A proposta é desenvolver, em cinco anos, um sistema por meio do qual se consiga conferir uma nota de sustentabilidade para o produto, inserindo-a na embalagem como se fosse um código de barra, para que o consumidor tenha acesso à informação de natureza socioambiental na hora de decidir.
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Leia aqui a íntegra do levantamento sobre produtos verdes realizado por Ideia Sustentável.

Confira aqui as entrevistas feitas com as emresas participantes.

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