Uma lição de sustentabilidade

4 de agosto de 2008

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Darcy Winslow é chefe do setor de calçados femininos da Nike, a famosa empresa de artigos esportivos que, em 1996, foi objeto de escândalo global, após a denúncia de que havia trabalho escravo e infantil em um de seus fornecedores na Indonésia. O caso tornou-se – como já se sabe -paradigmático no debate sobre a responsabilidade social.
Há sete anos, coube a Winslow o desafio de desenvolver processos e produtos ambientalmente responsáveis. Para dar conta dele, a executiva reuniu colaboradores e criou um “grupo de estratégias empresariais sustentáveis”, uma espécie de força-tarefa cuja missão era integrar os departamentos de inovação, os designers, gerentes de produtos, engenheiros e empregados em torno da idéia de “pensar verde” e “ fora da caixa.”
Segundo a própria Winslow, iniciado o processo colaborativo de incluir as pessoas no planejamento da mudança, não demorou muito para que emergissem o que ela classifica como “paixões profundas.” De forma espontânea, sem que fosse necessário adotar qualquer artifício de estímulo à participação, os funcionários começaram a falar sobre o tema, a compreender intimamente a sua importância e a associar sustentabilidade  com inovação, não por acaso um das características mais marcantes da cultura Nike.
Na análise da executiva, quando os times concentraram o seu olhar no quanto a inovação sustentável poderia impactar os produtos da empresa “idéias e energia fluíram de maneira espantosa.”  O resultado veio na forma de metas concretizadas antes do tempo. Além de estabelecer padrões elevados em redução de desperdício e responsabilidade coletiva na fabricação, a Nike, como parte da ação do seu quadro engajado de colaboradores, criou peças de vestuário á base de algodão orgânico, repensou componentes de borracha livres de toxinas químicas, retirou os solventes dos processos de manufatura e ainda hoje evolui, sem perder o ritmo, no uso de materiais ecológicos, alternativos ao PVC, em toda a sua linha de produtos.
A corporação, que um dia foi o anti-exemplo de responsabilidade social, esforça-se para reelaborar  princípios de design visando criar produtos inteiramente desmontáveis na ponta final de seu ciclo de vida, com componentes reutilizáveis e recicláveis.
A história da Nike é uma das pérolas do livro Presença: Propósito Humano e o Campo do Futuro, escrito por  Otto Scharmer, Joseph Jaworski, Betty Sue e o já famoso Peter Senge.  Na obra, ela se destaca como estudo de caso de mudança organizacional para a sustentabilidade, uma comprovação da validade da chamada Teoria do U – que se fundamenta nos pilares do Sentir (observar, tornando-se um com o mundo), Presenciar (recolher-se e refletir para deixar vir á tona o saber) e Concretizar (agir rapidamente num fluxo natural).
Perguntada por Senge, o papa da gestão de conhecimento, sobre como chegara à conclusão de que a Nike deveria ser líder em sustentabilidade, Winslow receitou, sem fazer menção direta, os três movimentos da Teoria do U. Primeiro, ela e seu time analisaram os cenários (de dentro deles e não como olheiros externos), observaram as dificuldades ambientais das empresas e se indagaram sobre quem eram  e quais deveriam ser os seus compromissos mais profundos para com a preservação do planeta. Como exercício de lógica racional,  mais do que descobrir o óbvio (Nike tem tudo a ver com boa forma, saúde e qualidade de vida),  todo o grupo  sentiu e vivenciou a descoberta, passando, em seguida, a traduzi-la em novas formas de a empresa conduzir os negócios em suas diferentes áreas, sempre em completa sintonia com a sua cultura altamente inovadora e competitiva. A ação de mudança ocorreu de modo natural. Quando a equipe percebeu que o planejamento não fora imposto, que ninguém ali se sentia obrigado a mudar apenas por mudar, mas que o fazia por absoluta identificação (não por conveniência mas por convicção), novos processos e produtos, mais sustentáveis, ganharam vida na corporação.
A julgar por seu depoimento, Winslow não acredita que a Nike seja um estudo de caso finalizado em sustentabilidade. E nem poderia. Admitindo um longo caminho a percorrer, com desafios importantes de infra-estrutura em escala global, ela vê o interesse crescente do consumidor pelo tema como um elemento fundamental para a irreversibilidade do processo. Da história de Winslow, as empresas hoje interessadas em acelerar a mudança rumo à sustentabilidade podem extrair uma lição:  se quiserem ser mais efetivas em seu intento terão que substituir os modelos convencionais de mudança planejada, excessivamente autoritários e diretivos,  por outros mais sistêmicos, que proporcionem espaço ao sentir, ao partilhar e à construção coletiva de significado.
Enquanto a sustentabilidade for tratada como um conjunto de metas a alcançar, uma obrigação conveniente para não perder negócio ou o mero objeto de um plano com cuja essência as pessoas parecem não se identificar intimamente, então as soluções encontradas serão sempre superficiais, utilitárias e de curtíssimo espectro. Nunca é demais lembrar: sustentabilidade não representa um trabalho a mais, um custo a mais ou uma função a mais com que se preocupar numa corporação. Significa o modo mais humano – e portanto, o melhor – de pensar e fazer negócios.

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