O desafio da governança e transparência

22 de março de 2010

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Foi-se o tempo em que os rumos das empresas eram decididos em reuniões de cúpula a portas fechadas. Em tempos de globalização, assumir uma postura transparente e compartilhar a tomada de decisões com diversos públicos de interesse é uma forma de as empresas gerirem melhor riscos e oportunidades.
Nesse cenário, as boas práticas de governança corporativa se apresentam como um caminho para agregar valor à companhia, facilitar o acesso ao capital, contribuindo para a sua perenidade. E em se tratando de longo-prazo não há como desconsiderar as questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável. Dessa forma, governança e sustentabilidade devem caminhar juntas.
Aferir os resultados decorrentes de uma postura de transparência e responsabilidade, na sua maioria baseados em ativos intangíveis – como ganhos de imagem e reputação –  é um dos grandes desafios para consolidar as boas práticas nessa área. Confira o que pensam os principais especialistas sobre o assunto.

Governança e suas origens

A abertura de capital das empresas trouxe um desafio novo de gestão: como administrar os conflitos decorrentes da relação entre proprietários (sócios/ acionistas) e a diretoria, incumbida de tomar as decisões que definirão os rumos da empresa.
Na primeira metade dos anos 90, acionistas, principalmente dos Estados Unidos, encabeçaram um movimento para estabelecimento de novas regras que os protegessem de eventuais abusos da alta administração das empresas.
A boa governança corporativa surgiu, portanto, da preocupação de criar um conjunto eficiente de mecanismos, tanto de incentivos quanto de monitoramento, a fim de assegurar que o comportamento dos executivos estivesse sempre alinhado ao interesse dos acionistas.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) orienta que as práticas das companhias estejam assentadas em quatro princípios: transparência, prestação de contas (accountability), eqüidade e responsabilidade corporativa.
“A transparência consiste em dar as informações que o outro lado quer ouvir, baseadas em aspectos tangíveis e intangíveis. Outro princípio, a equidade, trata-se de não cometer injustiças com as diversas partes envolvidas. A accountability (prestação de contas) também é importante porque na governança corporativa se define o processo de tomada de decisão e, portanto, são estabelecidos mandatos, o que cada um faz e quem dá satisfação para quem. Todo mundo que tem um mandato tem que dar satisfação do que fez e o que não fez e assumir as conseqüências. E tem o princípio da responsabilidade corporativa que é justamente incorporar aspectos ambientais e sociais no processo de tomada de decisão”, afirma Carlos Eduardo Lessa Brandão, co-coordenador do Grupo de Estudos de Sustentabilidade do IBGC.
Mas segundo a organização, além de disseminar esses princípios, a boa governança corporativa requer a existência de um acordo claro de propriedade entre os sócios, um Conselho de Administração, Auditoria Independente e Conselho Fiscal.
No final da década de 90 e início dos anos 2000, as crises mundiais como a asiática, em que inúmeros escândalos bancários despontaram na região, e os casos de fraude contábil da Enron, World Com. e Parmalat ressaltaram a importância de práticas institucionais que enfatizem a transparência, a ética e a segregação de funções nas empresas. Percebeu-se também que os mecanismos de adesão voluntária, sozinhos, não eram suficientes para consolidar a boa governança corporativa.
“Os escândalos levantaram questionamentos sobre a responsabilidade das organizações e o que devem fazer por iniciativa própria ou por regulamentação. Diante de fraudes como a da Enron e World Com., os Estados Unidos reagiram rapidamente, transformando algumas práticas de governança em regulamentação”, explica Brandão.
Em 2002, o Congresso norte-americano editou a Lei “Sarbanes-Oxley”, que intensifica os controles internos das companhias. Dessa forma, os executivos tornam-se claramente responsáveis por fixar, aferir e acompanhar a eficácia dos controles internos sobre informações financeiras e divulgações de fatos relevantes.
O objetivo da Lei, ao explicitar essa responsabilidade, é evitar a repetição dos casos da Enron e World Com., nos quais os executivos buscaram se eximir de qualquer responsabilidade, sob a alegação de não terem conhecimento dos atos ilegais praticados pelas companhias.

Avanços e desafios no Brasil

Com a aceleração do movimento de abertura da economia brasileira, em meados da década de 90, o volume de investidores estrangeiros atuando no Brasil aumentou. Além disso, algumas empresas nacionais de capital aberto começam a listar suas ações nas bolsas de valores norte-americanas. A partir daí, essas companhias tiveram contato com acionistas acostumados a investir em mercados com práticas de governança corporativa mais avançadas do que as aplicadas no mercado brasileiro. Ao número crescente de investidores estrangeiros soma-se uma maior participação de investidores institucionais brasileiros de grande porte e mais conscientes de seus direitos.
O cenário acima descrito favoreceu o avanço das práticas de boa governança no Brasil. Como conseqüência, em 1999, o IBGC lançou o primeiro código sobre o tema.
Outro importante marco no processo de evolução da boa governança corporativa no País se deu com a reformulação da Lei das Sociedades Anônimas, em 2001. Durante muito tempo os acionistas brasileiros, institucionais ou não, posicionaram-se fora da gestão da empresa, o que induzia a uma administração pouco transparente e que muitas vezes não objetivava a maximização dos resultados da empresa no longo prazo.
Segundo Edson Garcia, superintendente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), a cultura nos anos 60 e 70 – marcada pela política governamental de incentivos fiscais por meio da qual empresas foram financiadas por acionistas, utilizando-se de renúncia fiscal – forjou no Brasil um minoritário com pouco apetite para exercer os seus direitos e um controlador pouco treinado em prestar contas e ver no minoritário o seu sócio.
“O acionista minoritário tinha uma cultura de que investia com recursos do tesouro e o controlador, por sua vez, preferia pensar que recebia investimentos governamentais e não do acionista que usava imposto de renda para subscrição de ações. A partir de 2000, a governança veio mostrar que os acionistas minoritários devem desempenhar uma supervisão mais efetiva, cobrando e indicando condutas que ajudam a perenidade da companhia”, ressalta Garcia.
Em 2002, a Comissão de Valores Imobiliários (CVM) lançou uma cartilha sobre governança com o objetivo de orientar quanto às questões que afetam o relacionamento entre administradores, conselheiros, acionistas controladores e minoritários, assim como auditores independentes.
No mesmo ano, a Bolsa de Valores de São Paulo criou três segmentos diferenciados de governança: Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado.
Para Brandão, do IBGC, a criação de segmentos especiais de listagem foi um grande marco no avanço das boas práticas de governança no Brasil. “Essa não foi uma decisão fácil, tendo em vista que o desenvolvimento do mercado de capitais avançava em ritmo lento no País e o raciocínio mais óbvio para reverter isso seria facilitar as regras para entrada das empresas na bolsa. Mas a Bovespa fez, justamente, o contrário ao apostar na valorização das companhias que tinham boas práticas. Assim, quando houve a expansão da economia, o mercado estava bem mais preparado em relação aos padrões internacionais de governança”, ressalta Brandão.
Basicamente, o segmento de Nível 1 caracteriza-se por exigir práticas adicionais de liquidez das ações e disclosure (revelação de informações). Enquanto o Nível 2 tem por obrigação práticas adicionais relativas aos direitos dos acionistas e Conselho de Administração.  O Novo Mercado diferencia-se do Nível 2 pela exigência para emissão exclusiva de ações com direito a voto.
Segundo o IBGC, apesar do aprofundamento dos debates sobre governança e da crescente pressão para a adoção das boas práticas nessa área, o Brasil ainda se caracteriza pela alta concentração do controle acionário, pela baixa efetividade dos conselhos de administração e pela alta sobreposição entre propriedade e gestão. O que demonstra vasto campo para o conhecimento, ações e divulgação dos preceitos da governança corporativa.

Gestão de riscos e sustentabilidade

Um dos propósitos da governança corporativa é prover orientação estratégica à empresa, baseada em uma visão no curto, médio e longo-prazos. No que diz respeito, principalmente, ao último fator a sustentabilidade exerce influência significativa. A companhia que não considera em seu planejamento o equilíbrio do ecossistema com o qual interage – desde a disponibilidade de recursos até o desenvolvimento das comunidades do seu entorno – pode colocar em xeque a perenidade do negócio.
“A governança dá a orientação estratégica para a empresa.  E, se essa orientação contempla que a sustentabilidade seja assimilada pela organização, a governança é a ‘porta de entrada’ do tema  no ambiente corporativo e depois, pode ser a ‘guardiã’ do  alinhamento dos aspectos econômicos, ambientais e sociais”, afirma Glaucia Térreo, representante da Global Reporting Initiative no Brasil.
Brandão, do IBGC, defende que a sustentabilidade deve ser tema de responsabilidade da alta administração da companhia e, por isso, estar na pauta dos conselhos.
“Se as questões relacionadas a sustentabilidade estão fora da pauta, não há como governar estrategicamente, pois ela está diretamente relacionada à perenidade da companhia. Cabe ao conselho administrativo, discutir temas como as mudanças climáticas, assim como mapear os stakeholders, os impactos de cada um para a companhia e vice-versa”, destaca Brandão.
Antes restrita a acionistas, colaboradores, clientes e fornecedores, a rede de relacionamentos da companhia tem se tornado cada vez mais complexa. Hoje, as chamadas partes interessadas se estendem a comunidade, formadores de opinião, organizações da sociedade civil ou, segundo alguns especialistas defendem, todos aqueles que se sentirem impactados de alguma maneira pelas atividades da empresa.
“A concepção de governança não se restringe à relação de pequeno espectro. Hoje, as companhias devem desenvolver uma relação de amplo espectro com a comunidade em que está inserida. Antigamente, bastava que a empresa tratasse bem o consumidor, os funcionários, mas essa rede foi se estendendo para os acionistas, investidores e não parou mais de ampliar-se. A geração de valor para a companhia depende cada vez mais das relações de confiança estabelecidas com esses públicos”, ressalta Garcia, da Amec.
Mais do que ganhos de imagem e reputação, o engajamento com as partes interessadas proporciona uma gestão mais eficaz dos riscos do negócio. “Uma empresa não tem capacidade de sozinha escolher os melhores caminhos. Isso só é possível a partir do diálogo com diferentes stakeholders”, defende Geraldo Soares, superintendente de relações com investidores do Banco Itaú.

Relatórios de sustentabilidade

Estratégica do ponto de vista do planejamento do negócio, a sustentabilidade também é um parâmetro cada dia mais utilizado por investidores na hora de escolher empresas, principalmente em segmentos conservadores que buscam segurança e constância no retorno.
Sendo assim, muitas empresas têm integrado resultados financeiros, ambientais e sociais em um único relatório de sustentabilidade. A elaboração do documento pode se transformar em uma ferramenta importante de governança corporativa, à medida que proporciona a comunicação com diferentes áreas e públicos da empresa.
“Elaborar um relatório de sustentabilidade – de forma consistente, como ferramenta de gestão – pode ajudar a governança a tomar decisões com base em uma visão mais holística e sistêmica, ajudando a companhia a gerenciar oportunidades e riscos e alinhar aspectos econômicos, ambientais e sociais”, afirma Glaucia Terreo, da GRI.
A organização, criada em 1999, estabelece princípios para elaboração de relatórios de sustentabilidade que, de tempos em tempos, são revisados com base em consulta pública com especialistas e leitores de todo o mundo.
A última pesquisa da GRI “Count me in: The readers’ take on sustainability reporting”, realizada em parceria com a KPMG e SustainAbility, revelou que nove em cada dez leitores de relatórios de sustentabilidade acham que os documentos impactam positivamente a sua percepção em relação à companhia e adicionam valor à marca.
No entanto, os entrevistados alertaram que os relatórios devem servir menos como uma ferramenta de marketing e mais como fonte de informação.
As expectativas dos leitores em relação aos relatórios vão ao encontro das diretrizes divulgadas pelo GRI desde 2006, com o lançamento dos princípios G3.
Averiguação por auditorias externas, participação dos stakeholders e equilíbrio de resultados positivos e dilemas a serem enfrentados pela empresa são algumas das diretrizes para elaboração de relatórios de sustentabilidade.
Além de ser uma ferramenta para prestação de contas, ao elaborar um relatório de sustentabilidade de acordo com os princípios do GRI, a empresa reforça a postura de transparência, o que pode contribuir para a solução de alguns dos seus dilemas. “Ao comunicar não só realizações, mas também os problemas, a empresa deixa a porta aberta para o diálogo com diferentes partes interessadas. A partir desse engajamento, ela tem a oportunidade de buscar soluções junto aos públicos impactados direta ou indiretamente pelos seus negócios”, explica Terreo.
Para Ana Paula Grether, coordenadora do Balanço Social e Ambiental da Petrobras, o relatório de sustentabilidade proporciona outros pontos de vista sobre os diferentes indicadores da empresa. “O relatório não representa apenas uma prestação de contas à sociedade, mas sim uma ferramenta de gestão interna na empresa. A análise crítica dos aspectos positivos e negativos permite a identificação de pontos de melhoria e onde podemos avançar em relação ao negócio”, completa.
As companhias já não podem mais ignorar os sinais dados pelos diversos públicos com os quais se relaciona em assuntos que podem afetar diretamente os negócios. O Banco Real, por exemplo, fez uma série de entrevistas com stakeholders visando identificar os principais temas que deveriam ser abordados no relatório anual. “Esse rico diálogo gerou várias oportunidades de melhoria não só nos conteúdos e na forma do relatório, mas também quanto à nossa estratégia e posicionamento”, afirma Fernando Byington Egydio Martins, diretor-executivo de Estratégia da Marca e Comunicação Corporativa do Grupo Santander.
A adaptação a padrões internacionalmente aceitos, processos de averiguação mais relevantes aumentam a credibilidade das informações prestadas e possibilitam a comparação entre os relatórios de diferentes empresa, fazendo dos relatórios de sustentabilidade ferramentas importantes de avaliação da governança corporativa.
“Esse tipo de abordagem vai se intensificar por exigência das partes interessadas, na medida em que, cada vez mais, elas desejarão tomar decisões com base nas informações divulgadas nos relatórios de sustentabilidade pelas empresas”, afirma Luzia Hirata, consultora da Sustain Capital.
Em busca de modelos para mensurar intangíveis
A integração da sustentabilidade na estratégia do negócio chamou atenção para a necessidade de novos modelos de mensuração capazes de considerar ativos intangíveis.
“Ao utilizar como base, informações advindas do instrumento de contabilidade tradicional a governança leva em conta somente os tangíveis e, deixa de lado o que é mais valioso: goodwill, marca, reputação, qualidade da gestão, histórico de respeito aos direitos humanos, aspectos sociais e trabalhistas e a consideração ao meio-ambiente, comunidade de entorno etc ”, ressalta Glaucia.
Apesar de haver certo consenso de que a perenidade do negócio depende de uma gestão baseada no equilíbrio dos aspectos econômicos, ambientais e sociais, pouco se sabe quanto ao valor gerado pela sustentabilidade.
“Hoje, os modelos tradicionais de contabilidade consideram os intangíveis como custo. Esse tipo de valor fica no âmbito da percepção e o fato de não ser quantificado faz com que sua volatilidade seja muito alta. Em momentos de crise, por exemplo, a empresa vai cortar tudo aquilo que não apresenta valor quantificável e os intangíveis podem ser comprometidos. Essa atitude representa um tiro no pé porque são esses ativos que vão trazer valor para a empresa no médio e longo prazos”, afirma Daniel Domeneguetti, presidente da DOM Strategy Partners.
Começa a surgir no mercado um movimento em busca de novas métricas para descobrir o impacto dos intangíveis na geração de valor para empresa.
Tendência reforçada com a aprovação da Lei 11.638/07, segundo a qual a mensuração de intangíveis passará a ser uma exigência, a partir de 2010, para empresas brasileiras baseadas em sociedades por ações e de capital fechado com ativos acima de R$ 240 milhões ou receita bruta superior a R$ 300 milhões. Por conta dela, as companhias terão que apresentar suas demonstrações contábeis conforme o padrão internacional baseado nas regras do IFRS (International Financial Reporting Standards).
Entre as iniciativas em busca de novas métricas para mensurar o valor econômico da sustentabilidade, destacam-se os estudos de Bob Willard, autor de “The Sustainability Advantage”.
Willard analisou centenas de estudos de caso de companhias, utilizando, como ponto de partida, o cruzamento de informações de seus balanços comerciais.
Para o economista, são sete os benefícios decorrentes de um comportamento mais sustentável. Com base nos recursos destinados a diferentes áreas-chave da empresa, ele calculou as economias proporcionadas a partir da incorporação da sustentabilidade na estratégia do negócio. Para estimar os ganhos, utilizou uma hipotética empresa de tecnologia da informação, a SD Inc., uma composição das cinco maiores companhias da área (IBM, Hewlett-Packard, Compaq, Dell e Xerox) em 2005, ano em que Willard escreveu o livro. Juntas elas possuem receitas de US$ 44 bilhões e 120 mil funcionários.
Com base nos recursos destinados a diferentes áreas-chave da empresa, ele calculou as economias proporcionadas a partir da incorporação da sustentabilidade na estratégia do negócio. Para estimar os ganhos, utilizou uma hipotética empresa de tecnologia da informação, a SD Inc., uma composição das cinco maiores companhias da área (IBM, Hewlett-Packard, Compaq, Dell e Xerox) em 2005, ano em que Willard escreveu o livro. Juntas elas possuem receitas de US$ 44 bilhões e 120 mil funcionários.
O Intangible Value Assessment Rating – IVA é outra iniciativa interessante no campo da mensuração do valor econômico da sustentabilidade. Criada pela Innovest Strategic Value Advisors tem como objetivo avaliar a performance das empresas no campo ambiental e social, assim como assuntos estratégicos de governança, com foco no impacto na competitividade, rendimento e valor de mercado de uma companhia.
Ao se basear em diferenciais que normalmente são desconsiderados pelas análises tradicionais, o IVA revela novos riscos e valor potencial aos investidores. Os conceitos das avaliações das empresas variam de AAA (melhores performances) a CCC (piores).
A ferramenta tem se popularizado entre os investidores em busca de informação extra-financeira, necessária para uma análise mais completa das perspectivas da companhia.
No Brasil, a DOM também desenvolveu uma metodologia com esse fim, denominada Intangible Assets Management – IAM.
A ferramenta, que já está em fase de implementação em 17 companhias, consiste na avaliação do desempenho da empresa nas três dimensões da sustentabilidade (econômica, ambiental e social).
A partir desses resultados, chega-se a um coeficiente que é aplicado ao valor dos intangíveis. O cruzamento dessas informações permite a aferição do valor do capital sustentável ou qualquer outro intangível definido como estratégico para a empresa.
Índices de sustentabilidade
Avaliar os resultados decorrentes de boas práticas de governança e responsabilidade socioambiental pode não ser o forte do mercado. No entanto, há de se reconhecer o mérito de iniciativas como a criação de índices de sutentabilidade, que têm contribuído para assimilação, pelo mercado, do valor de uma gestão baseada no triple bottom line.
Nesse campo, a Bolsa de Nova York é pioneira com o lançamento, em 1999, do Índice Dow Jones de Sustentabilidade. Outras bolsas pegaram carona no movimento e estabeleceram seus próprios índices, como são os casos da de Londres, que criou o FTSE4Good (Footsiefor good), em 2001, a de Johanesburgo, com o JSE (2003), e a Bovespa, com o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), em 2005.
A metodologia desenvolvida pelo Índice Dow Jones de Sustentabilidade seleciona 10% das 2500 companhias líderes na prática desse conceito em cada um dos 58 segmentos, a partir de uma avaliação sistemática dos fatores econômicos, ambientais e sociais de longo prazo.
Estratégias de combate às mudanças climáticas, eficiência energética, desenvolvimento do capital humano, gestão do conhecimento, relacionamento com stakeholders e governança corporativa são alguns dos quesitos avaliados. Há ainda outros específicos conforme o segmento de atuação da empresa.
O Índice Dow Jones de Sustentabilidade tem registrado um retorno anual de 16,1%, enquanto o Morgan Stanley Capital Index (MSCI) oferece um 15,6% por ano. Uma evidência numérica de que ser sustentável faz bem para o negócio no Novo Mercado.
No Brasil, a Bovepa conduziu experiência semelhante ao lançar o Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE, em 2003.  Esse índice nasceu para atender a um grupo de investidores em ascensão, preocupado com o retorno do seu investimento no longo prazo.
Com 32 empresas de 13 setores, somando 40 ações e um valor de mercado de R$ 927 bilhões, o ISE representa 39,6% da capitalização da Bovespa. A sua média de crescimento nos últimos dois anos é equivalente à do Ibovespa. No período de novembro de 2005 a janeiro de 2008, o Ibovespa demonstrou uma evolução de 96,77% enquanto o ISE fechou com alta de 90,04%.
Impacto nas empresas
Os índices de sustentabilidade funcionam como uma espécie de “selo de qualidade”. Ao integrá-los, as empresas são reconhecidas pelo mercado pela responsabilidade social corporativa e sustentabilidade com que atuam no longo prazo.
Segundo Djalma Bastos, presidente da Cemig, empresa listada no Dow Jones, esse reconhecimento mundial facilita a prospecção de novos negócios e parcerias. “Outro ponto importante é a possibilidade de ampliação do acesso a um crescente mercado dirigido aos investidores de longo prazo, que prezam pela responsabilidade ambiental e social na gestão dos negócios. Adicionalmente, a Cemig pode se beneficiar da menor volatilidade no preço de suas ações, sendo bem classificada pelo mercado investidor, o que permite a captação de financiamentos com custos de capital mais baixos e, conseqüentemente, a agregação de valor aos investimentos dos acionistas”, afirma Bastos.
Primeira companhia latino-americana do setor de energia a integrar o Dow Jones de Sustentabilidade desde que ele foi criado em 1999, a Cemig está, portanto, entre as empresas mais sustentáveis do mundo. Nos últimos cinco anos, o seu valor de mercado aumentou quatro vezes, passando de R$ 4 bilhões (2002) para R$ 16 bilhões (2007).
Para o superintendente de relações com investidores do Itaú, Geraldo Soares, integrar índices de sustentabilidade gera um impacto positivo na estrutura interna da empresa na medida em que, para atender às exigências estipuladas pela nova condição, ela passa a agir e pensar de forma integrada. “Os questionários são tão complexos e amplos que acabam envolvendo vários departamentos. Assim cria-se um espaço para discussão do conceito e desenvolve-se uma cultura de sustentabilidade na companhia”, ressalta.
A adaptação das empresas às exigências de ingresso e permanência nos índices de sustentabilidade também contribuiu para criar as condições para gestão dos ativos intangíveis. Na Petrobras, por exemplo, eles são classificados em quatro tipos de capital: humano, organizacional, de relacionamento e de domínio tecnológico.
Para a empresa, a gestão dos ativos intangíveis teve papel fundamental na criação de valor, no diferencial competitivo e na conquista de resultados no longo prazo. Entre 2005 e 2007, o valor de mercado da Petrobras cresceu 148%.
A incorporação da sustentabilidade na estratégia do negócio também teve impacto significativo na reputação da empresa. Em 2007, a companhia energética saltou da 83ª para a 8ª posição no ranking das empresas mais respeitadas do mundo, organizado pelo Reputation Institute, de Nova York.
A participação da Petrobras nos índices Dow Jones de Sustentabilidade e no ISE amplia o acesso a um mercado potencial de investidores em empresas social e ambientalmente responsáveis, avaliado pela ONU em mais de US$ 4 trilhões.
O Bradesco também integra, desde 2005, o Dow Jones de Sustentabilidade e o ISE da Bovespa. Apesar de o banco não dispor de nenhum instrumento específico para aferição do valor que a sustentabilidade adiciona ao negócio, Jean Philippe Leroy, diretor de relações com o mercado do Bradesco, atribui parte da boa performance dos últimos anos à incorporação desse conceito às práticas da organização. Em 2007, o Bradesco superou pela primeira vez os R$ 100 bilhões em valor de mercado. Para se ter uma idéia, em 2003, o banco era negociado a 1,7 vezes do seu valor patrimonial. Quatro anos depois, passou a 13,5 vezes.
Princípios da governança corporativa
Transparência: a Administração deve cultivar o “desejo de informar”. Postura essa que não deve restringir-se ao desempenho econômico-financeiro, mas sim contemplar os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação empresarial e que conduzem à criação de valor.
Equidade: caracteriza-se pelo tratamento justo e igualitário de todos os grupos minoritários, sejam do capital ou das demais “partes interessadas” (stakeholders), como colaboradores, clientes, fornecedores ou credores.
Prestação de contas: os agentes da governança corporativa devem prestar contas de sua atuação a quem os elegeu e respondem integralmente por todos os atos que praticarem no exercício de seus mandatos.
Responsabilidade corporativa: uma visão mais ampla da estratégia empresarial, contemplando todos os relacionamentos com a comunidade em que a sociedade atua.
Benefícios da governança corporativa para as empresas:
? Agregar valor de marca e mercado
? Melhorar o desempenho
? Facilitar o acesso ao capital a custos mais baixos
? Contribuir para a perenidade
Box: Benefícios da sustentabilidade para o negócio
Possíveis conseqüências decorrentes da ausência de bons sistemas de governança corporativa:
– Abusos de poder (do acionista controlador sobre minoritários, da diretoria sobre o acionista e dos administradores sobre terceiros);
– Erros estratégicos (resultado de muito poder concentrado no executivo principal);
– Fraudes (uso de informação privilegiada em benefício próprio, atuação em conflito de interesses).
Fonte: Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC
Linha do tempo
1992 – Publicação do Relatório Cadbury, considerado o primeiro código de boas práticas de governança corporativa. Elaborado por uma comissão coordenada por Sir Adrian Cadbury, surgiu como resposta aos escândalos registrados no mercado corporativo e financeiro da Inglaterra no final dos anos 1980.
1994 – Pesquisa realizada pelo Calpers (California Public Employees Retirement System), revela que mais da metade das 300 maiores companhias dos EUA tinham desenvolvido manuais próprios de recomendações de governança corporativa.
1995 – Fundação do Instituto Brasileiro de Conselheiros de Administração (IBCA), atual IBGC.
1997 – Criação do novo mercado (Neuer Markt) da Bolsa de Frankfurt, Alemanha. No mesmo ano, a Federação Japonesa das Organizações Econômicas lança relatório com recomendações sobre governança corporativa. Em setembro, ocorre a crise asiática, fomentada, entre outras coisas, por más práticas de governança corporativa.
1997 – Aprovação da Lei 9.457, reformando a Lei das Sociedades Anônimas original (Lei 6.404/1976). A Lei revoga o Tag Along de 100% para ordinaristas, sendo considerada um retrocesso na questão do direito dos acionistas minoritários.
1998 – Lançamento do relatório britânico produzido pelo Comitê Hampel, intitulado Combined Code. Inspirado nesse documento, o Fórum de Governança Corporativa do Japão elabora “Os Princípios de Governança Corporativa – Uma Visão Japonesa”. No mesmo ano, a OCDE cria o Business Sector Advisory Group on Corporate Governance.
1998 –  Criação do primeiro fundo brasileiro voltado para a governança (Dynamo Puma), no programa de Valor e Liquidez do BNDESPar.
1999  – O grupo de governança corporativa da OCDE abre caminho para a consolidação dos Principles of Corporate Governance, divulgado em maio, contendo diretrizes e recomendações sobre as boas práticas de governança.
1999 – Lançamento do primeiro código brasileiro sobre governança corporativa, o “Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa”, de autoria do IBGC.
2000 – Banco Mundial e Mckinsey concluem em estudo que investidores estão dispostos a pagar entre 18% a 28% a mais por empresas com governança.
2000 – Em dezembro, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) lança oficialmente os segmentos diferenciados de governança corporativa: Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado.
2001 – Em novembro, são divulgados ao mundo os problemas de fraude contábil na Enron. Na seqüência, diversas empresas norte-americanas são obrigadas a refazer suas demonstrações financeiras.
2001 – Bovespa cria o Índice de Governança Corporativa (IGC) cujo objetivo é medir o desempenho de uma carteira composta por ações de empresas que apresentem bons níveis de governança. A Lei das SAs é reformada, sendo promulgada a Lei 10.303/2001, apresentando avanços, embora tímidos em relação ao projeto inicial.
2002 – O congresso norte-americano aprova a Lei Sarbanes-Oxley (SOX) em julho, como resposta aos escândalos corporativos envolvendo grandes empresas do país. No mês seguinte, a SEC (Securities and Exchange Commission) edita algumas normas complementares e a Bolsa de Valores de Nova York aprova novos requisitos de governança corporativa como condição para listagem de empresas.
2002 – Em junho, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) lança sua cartilha sobre governança: “Recomendações da CVM sobre Governança Corporativa”, voltada para as companhias abertas. CCR e Sabesp ingressam pioneiramente no Novo Mercado.
2003 – Em dezembro, ocorre um escândalo corporativo na Parmalat, sendo o primeiro de muitos problemas de governança corporativa com grandes empresas da Europa Continental.
2004 – O IBGC lança, em edição revista e ampliada, a 3ª terceira versão do “Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa”, abordando de forma didática e detalhada o papel dos diferentes públicos-alvo da governança.
2005 – É realizada a oferta de ações da primeira companhia brasileira de capital amplamente disperso (Lojas Renner), uma inovação no modelo brasileiro de governança corporativa.
2006 – Nos Estados Unidos, mais de 130 empresas são acusadas de manipular as datas de concessão dos planos de opções de ações dos seus executivos, visando aumentar seus ganhos pessoais. O escândalo, conhecido como options backdating, causa a demissão de mais de 50 CEOs e conselheiros.
2006 – Bovespa amplia regras para os níveis diferenciados de listagem. Neste mesmo ano, um caso de insider trading ocorrido durante a tentativa pioneira de aquisição hostil da Perdigão pela Sadia causa grande repercussão no mercado, aumentando a atenção do órgão regulador em operações similares.
Fonte: Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC

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