Martins Lees

Martins Lees

Junto ao grupo de industriais e cientistas do Clube de Roma, Martins Lees prenunciou, em 1972,  ao apresentar o relatório “Limites do crescimento”, as crises ambientais e sociais que o mundo vivencia hoje. Passados mais de 30 anos, o fracasso do modelo atual de desenvolvimento se tornou evidente, mas os caminhos alternativos à economia de mercado ainda são nebulosos.
Os anos de experiência conferem a Lees as lentes necessárias para fazer uma leitura crítica do cenário atual e arriscar projeções. Para o secretário-geral do Clube de Roma, a transição para o desenvolvimento sustentável virá com a destruição criativa do próprio capitalismo de mercado. “Há certos setores da economia como o de energia e petróleo que sofrerão consequências à medida que avançarmos para uma economia de baixo carbono. No entanto, haverá muitos outros que serão enormemente beneficiados e também a sociedade como um todo. E há exemplos práticos disso. No Canadá, a terceira maior indústria é a de bens e serviços ambientais”, ressalta.
A tese de Lees assemelha-se ao conceito de destruição criativa, proposto pelo economista Joseph Schumpeter. Segundo ele, quando introduzidas no mercado, ao mesmo tempo em que destroem, novas tecnologias e estruturas de produção também criam. O progresso é, portanto, consequência desse processo destruidor e criativo.
Em visita ao Brasil para participar do “Diálogos da Terra”, evento realizado em novembro de 2008 pela Green Cross International e Governo do Estado de Minas Gerais, Martin Lees expôs suas ideias á Juliana Lopes, editora-assistente da revista Idéia Socioambiental.
RETROSPECTIVA
Desde a divulgação dos “Limites do Crescimento” em 1972, avançamos em relação a compreensão dos riscos de um crescimento insustentável. Também há um movimento cada vez maior de empresas e governos para tornar suas atividades mais sustentáveis. Mas, em termos de gestão dos assuntos relacionados ao desenvolvimento sustentável, não avançamos muito. Basta olhar dois aspectos em particular: um diz respeito às mudanças climáticas e o outro aos ecossistemas. A humanidade está usando, pelo menos, 130% dos recursos do Planeta a cada ano, o que é, obviamente, insustentável. Esse perigo é real. A comunidade científica já mostrou que enfrentamos um grande risco e por isso temos que agir rápido.
EXTERNALIDADES
A economia clássica apresenta três limitações. A primeira diz respeito ao reconhecimento das externalidades. Para ela, aquilo que não se consegue mensurar, não tem impacto. Essa não é uma boa regra para conduzir os negócios porque exclui aspectos importantes que afetam a vida humana e o Planeta. Em segundo lugar, a economia não tem se mostrado eficaz em lidar com bens de propriedade comum, como rios e a própria atmosfera, o que tem impacto direto na discussão de questões como o aquecimento global. Segundo Nicholas Stern [autor de relatório que mostrou os custos econômicos do aquecimento global], o tratamento que vem sendo dado às mudanças climáticas representa o maior fracasso da economia de mercado na história da humanidade.  O terceiro está relacionado ao pensamento de curto prazo, característico da economia de mercado.  A forma como pensamos o crescimento e estratégias econômicas precisam ser revistas. Isso tem se tornado cada vez mais claro, sobretudo depois dessa última crise financeira. O business as usual fracassou, por isso precisamos projetar uma nova tendência para o desenvolvimento econômico.
ECONOMIA DE MERCADO ÀS AVESSAS
Mecanismos econômicos são muito poderosos e podem ser extremamente úteis se forem oferecidos incentivos às pessoas com o intuito de conduzir o desenvolvimento na direção correta.  A precificação para o uso de recursos escassos ou a taxação de atividades poluidoras, por exemplo, podem ser muito úteis, mas precisam ser aplicadas no contexto correto. Não se pode, por exemplo, simplesmente privatizar a água de modo que o preço se torne tão alto que as pessoas mais pobres não tenham acesso a esse recurso. Se pegamos o caso do carbono, vemos que as pessoas continuam lançando CO2 na atmosfera indiscriminadamente e não há incentivos suficientes para que parem. O sistema chamado cap and trade é uma forma de fazê-lo a partir do estabelecimento de taxas para o carbono. Outra forma seria impor metas de redução. Somente quando começarmos a precificar seriamente o carbono, as pessoas compreenderão a necessidade de reduzir emissões. Nesse cenário, o papel do governo deve ser o de assegurar os direitos comuns em um país, enquanto que o mercado deve promover a inovação.
GOVERNOS MAIS FORTES
Desde a década de 80, quando ganharam espaço as políticas de Reagan e Thatcher, as pessoas vêm desacreditando no papel dos governos. Esse pensamento tem resultado nos problemas atuais. Por isso, devemos corrigir as deficiências do modelo atual e desenvolver outro que equilibre o papel do Estado e dos negócios. Acredito que os governos ocuparão um papel central nesse processo de transição. Além disso, para combater questões complexas como o aquecimento global precisamos agir em diferentes níveis: local, regional e globalmente.  Precisamos de um engajamento, no qual todos os atores participem. E os governos, na sua posição, são os agentes que mais têm condições de articular esse acordo. O que Gordon Brown e Barack Obama querem dizer com o anúncio da criação de empregos no setor de energias renováveis é que o crescimento econômico e o uso responsável das energias e recursos naturais não são contraditórios. Esse é um sinal importante para a economia global.
LIDERANÇA GLOBAL
O poder dos líderes, especialmente, governantes tem limites. Tip O’ Neill [político democrata norte-americano] há muitos anos disse: “Toda política é local”. Dessa forma, um líder é eleito não porque é um gênio em mudanças climáticas, mas porque entende as preocupações dos cidadãos da comunidade da qual faz parte. Em um mundo totalmente interdependente, é difícil para os líderes conciliarem as demandas locais com as questões mundiais. Mas há outro fator importante. As pessoas, muitas vezes, estão além de seus políticos.  Nos EUA, por exemplo, existe uma preocupação crescente de parte significativa da população quanto ao aquecimento global. Essa tomada de consciência, no entanto, ainda não tem se refletido em políticas federais. Por isso, os problemas atuais requerem uma ação integrada de líderes dos diferentes setores no mundo. A questão é: organizações internacionais como a ONU têm condições de catalisar esse movimento, criando agendas e soluções globais? Novos mecanismos institucionais são necessários. As mudanças climáticas estão acelerando e a comunidade internacional simplesmente não terá cinco ou 10 anos para se organizar e fazer algo.  Teremos que agir de uma forma ou de outra. Poderemos reagir no desespero, quando os problemas atingirem proporções tão graves que não teremos outra escolha ou então, poderemos agir a tempo para construir um mundo melhor.
REINVENÇÃO DO CAPITALISMO
Todos aqueles que estão preocupados com as questões de ordem ambiental e social têm atuado em uma posição defensiva. Há sempre argumentos de que ser responsável implica custos adicionais, que não poderiam ser arcados pela economia, podendo comprometer o crescimento. Toda essa discussão é non sense.  Há certos setores como o de energia e petróleo que sofrerão conseqüências à medida que avançarmos para uma economia de baixo carbono. No entanto, haverá muitos outros que serão enormemente beneficiados e também a sociedade como um todo. Não podemos estar em uma posição em que o meio ambiente e a sociedade estão de um lado e o crescimento econômico de outro. Temos que encontrar um padrão de crescimento que seja, ao mesmo tempo, eficiente economicamente e responsável no uso dos recursos. E há exemplos práticos disso. No Canadá, a terceira maior indústria é a de bens e serviços ambientais.
Elementos-chave para transição ao desenvolvimento sustentável, segundo Martin Lees

  • Visão positiva do futuro;
  • Ação integrada dos diversos setores da sociedade por meio de alianças estratégicas;
  • Novo equilíbrio entre interesse nacional e global;
  • Investimentos nas pessoas;
  • Redução da pobreza;
  • Reestruturação dos sistemas educacionais, adaptando-os aos desafios colocados pela sustentabilidade.

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