Plataforma Liderança Sustentável na Europa

Plataforma Liderança Sustentável na Europa

Entre os dias 01 e 07 de abril último, o consultor Ricardo Voltolini, diretor presidente de Ideia Sustentável: Estratégia e Inteligência em Sustentabilidade fez uma rodada de encontros para apresentar a Plataforma Liderança Sustentável nas cidades de Lisboa e Paris. Na capital portuguesa, conversou com cerca de 20 representantes de empresas, fundações e universidades.

E na França, participou como palestrante de encontro de Ecosofia, na Sorbonne. “Estava especialmente curioso sobre como as ideias e conteúdos da Plataforma Liderança Sustentável seriam recebidos em países com realidades completamente diferentes da nossa no Brasil. Foi uma surpresa muito positiva. A sustentabilidade está num estágio mais avançado aqui do que em empresas portuguesas e francesas. E essa não é a minha opinião, mas a de importantes líderes portugueses e franceses com quem conversei”, afirma Voltolini.

Na entrevista a seguir, o autor do livro Conversas com Líderes Sustentáveis conta como foram seus encontros e palestras.

Ideia Sustentável: Qual o saldo dos encontros feitos em Lisboa?

Ricardo Voltolini: Bastante positivo. Em Lisboa, conversei com consultorias em sustentabilidade do mesmo porte de Ideia Sustentável, líderes de empresas de comunicação, representantes de universidades e fundações e dois importantes executivos reconhecidos por sua atuação no tema.

Nos encontros, apresentei a Plataforma Liderança Sustentável com o objetivo de testar as ideias e conceitos de liderança para a sustentabilidade num país com realidade europeia. Há uma perspectiva muito boa de levar o programa para lá. E achei, portanto, que deveria, antes, avaliar as reais condições, considerando o quadro de cultura de sustentabilidade nas empresas daquele país e o peso da  atual situação de crise econômica.

IS: E qual o estágio de sustentabilidade das empresas portuguesas?

RV: Pela classificação que criei aqui no Brasil, as empresas de Portugal estão entre o estágio 2 (Cidadania Corporativa) e o 3 (Práticas Socioambientais). Mais no 2 do que no 3. Isso  significa que muitas ainda estão concentradas em investimento social privado, lembrando uma realidade típica do Brasil nos anos 1990. Algumas, as líderes, começam a desenvolver políticas para minimizar e eliminar seus impactos ambientais, algo que, no Brasil, ganhou impulso após a disseminação dos Indicadores Ethos, em 2001. A inserção do conceito na estratégia de negócio (estágio 4) ainda não aconteceu.

Por causa disso, minha primeira impressão era de que um programa como o da Plataforma Liderança Sustentável – que difunde histórias inspiradoras de líderes e propõe ações para conectar e educar jovens líderes – poderia não ter muito espaço em Portugal. Mas a aceitação foi grande. Até porque, lá, como no Brasil, há uma elite de bons líderes identificados com o tema.

Percebi um interesse claro de, a despeito da atual crise – quando as empresas se focam na noção de sobrevivência, no horizonte de curtíssimo prazo –, começar a construir uma cultura de liderança para a sustentabilidade nas empresas. O sentimento é de que as crises são passageiras. Mas lideranças sustentáveis são definitivas, criadora de novas culturas. Representam um instrumento fundamental para a prosperidade.

Universidade Nova de Lisboa

IS: O que te deu essa certeza?

RV: Diálogos muito ricos com profissionais de diferentes formações e organizações. É claro que na crise, como já vimos no Brasil e em outros lugares do mundo, temas como o da sustentabilidade tendem a ser vistos com menor ênfase do que os de natureza meramente econômico-financeira. Quando estive na Espanha, no início do ano, ouvi sobre uma certa “ecofadiga” entre os executivos de empresas.

Na crise, ante a necessidade de “crescer”, expandir horizontes comerciais e enfrentar a concorrência, os temas ambientais – há mais de 15 anos discutidos na Europa – costumam ser tratados como uma espécie de empecilho, um desvio de foco. Os profissionais de comunicação, consultoria em sustentabilidade, universidades e empresas com quem conversei acham que, também na Europa, muitas empresas falam mais do que fazem em sustentabilidade. Todos foram unânimes em reconhecer, no entanto, que com crise ou sem crise esse tema segue sendo um dos grandes desafios deste início de século 21. E a sua força se impõe pelos fatos.

IS: Na prática, como as universidades e empresas portuguesas estão trabalhando?

RV: Conversei com o diretor de uma escola de negócios da Universidade Nova de Lisboa que está realizando um importante programa de Responsabilidade Social Corporativa. Em sua análise, os jovens futuros líderes têm grande interesse nesse tipo de formação. Também falei com um importante líder empresarial, identificadíssimo com o tema, Gilberto Jordan, do Grupo Jordan, que administra o Belas Clube de Campo, um dos empreendimentos mais sustentáveis da Europa.

E a sua visão é a mesma dos líderes de uma importante empresa de comunicação local, o grupo Lift: apesar de um certo conservadorismo, característico daquele país, o tema está entrando cada vez mais na vida das empresas portuguesas. Fiquei bastante surpreendido com o alto nível, por exemplo, dos programas de sustentabilidade que estão sendo desenvolvidos pela Pepsico Ibéria. E também com o trabalho belíssimo feito pela Fundação EDP, uma espécie de motor das boas coisas que acontecem no campo do investimento socioambiental de Portugal.


Fundação EDP

IS: Há espaço para a Plataforma Liderança Sustentável em Portugal?

RV: Penso que sim. Há espaço para suas ideias e conceitos. Na medida em que há organizações sérias interessadas em oferecer apoio, líderes consagrados no tema com histórias inspiradoras e necessidade de criar cultura de sustentabilidade nas empresas e entre os jovens líderes, há espaço para uma metodologia como a da Plataforma. Alguns importantes líderes já foram apresentados ao livro Conversas com Líderes Sustentáveis e às ideias do projeto. É preciso criar as condições concretas para fazer acontecer.

IS: Em Paris, como foram recebidas as ideias da Plataforma Liderança Sustentável?

RV: Muito bem também. Participei de um encontro de Ecosofia, na Sorbonne, a convite do professor Massimo di Felice, da Escola de Comunicações e Artes da USP e do CEAQ, órgão ligado àquela importante escola, sob a direção do consagrado professor Michel Maffesoli.  Lá, compus, com Tetra Pak, Petrobras e AES Brasil, uma mesa redonda cujo objetivo era apresentar a experiência brasileira em sustentabilidade.

Abri os trabalhos, apresentando as conclusões do livro Conversas com Líderes Sustentáveis, os impactos gerados pela Plataforma junto aos jovens líderes brasileiros e as histórias de alguns líderes retratados no livro, como Fábio Barbosa, Guilherme Leal, José Luciano Penido e Paulo Nigro. Os ouvintes da palestra – especialistas franceses e italianos – se disseram impressionados com o fato de haver líderes empresariais brasileiros que se dispõem a educar jovens líderes para a sustentabilidade. Na Europa, os líderes estão preocupados apenas com negócios.

IS: E as empresas francesas, como estão em sustentabilidade?

RV: Havia no encontro representantes de empresas francesas de distribuição de energia e design. Eles próprios reconheceram que a experiência brasileira está à frente. Segundo Stephan Hugon, do Ceaq, um dos responsáveis pelo encontro, o tema sustentabilidade é novo entre as empresas locais. Começou a ser discutido há pouco mais de 3 anos.

E lá, ao contrário do Brasil, o tom é de catastrofismo. Os governos aterrorizam as empresas e as pessoas para que elas mudem seus hábitos sob a ameaça de uma hecatombe. Na minha contextualização inicial, expus uma ideia que foi bem aceita pelos participantes do Encontro de Ecosofia: enquanto na Europa os governos puxaram a discussão de sustentabilidade, pressionados pelos compromissos do Protocolo de Kyoto com a redução obrigatória de emissões de gases de efeitos estufa, no Brasil foram as empresas que tomaram a frente da discussão. Isso explica a diferença de estágios entre Brasil e França, ou Brasil e Portugal.

IS: O que mais chamou a atenção dos franceses nas ideias da Plataforma Liderança Sustentável?

RV: Eles se mostraram especialmente mais animados com o tipo de dinâmica (um movimento de líderes consagrados para jovens líderes) que criamos para disseminar os conhecimentos de liderança para a sustentabilidade, com a visão humanista dos líderes brasileiros (a quem chamaram de “homens webberianos”), com a integração (inédita para eles) entre empresas, academia e sociedade civil e com a expansão feita a partir do apoio das redes sociais e dos formadores de opinião. Um dos temas do encontro era justamente a importância da formação de redes digitais. A Ecosofia é um conceito muito interessante. Tratar a sustentabilidade a partir de seus pressupostos significa considerar um conjunto de variáveis como cultura, territorialidade, imaginário e comportamento, colaboração e redes. Na avaliação dos participantes, a Plataforma se enquadra perfeitamente nesse conceito de Ecosofia.

IS: E como foram recebidas as experiências das três empresas brasileiras participantes da mesa?

RV: Igualmente, muito bem. Nem poderia ser diferente. A missão de reciclagem da Tetra Pak, a nova Política de Sustentabilidade da AES Brasil e os projetos culturais patrocinados pela Petrobras foram recebidos com grande entusiasmo porque representam uma novidade para a realidade de franceses e italianos. Uma expressão dita pelo professor Michel Maffesoli expressa muito como somos vistos: “O Brasil é hoje o mais importante laboratório da pós-modernidade.”

Na análise do professor, a Europa estagnou, está envelhecida, acomodada. O Brasil, ao contrário, representa o novo, a criação, a diferença num mundo que tende a ficar homogêneo e saturado. Com a força de sua cultura rica, de sua diversidade e hibridismo, o Brasil sobressai como uma potência para discutir a sustentabilidade a partir do conceito de Ecosofia.

IS: Qual o saldo prático deste encontro de Ecosofia na Sorbonne?

RV: Começou a nascer uma rede de profissionais de Brasil, França e Itália que tem como principal objetivo compartilhar, estudar e discutir práticas de utilização de sustentabilidade a partir do conceito de redes digitais e Ecosofia. De agora em diante, serão realizados todos os anos dois encontros, um na Sorbonne e outro no Brasil.

Maffesoli e sua turma devem vir para São Paulo em outubro próximo. É mais um espaço aberto de diálogo e interação entre academia, empresa e sociedade civil. Do ponto de vista mais imediato, no que se refere à Ideia Sustentável, pensamos em desenvolver um programa de educação em conjunto com a Sorbonne, realizado em Paris, para líderes brasileiros.

Inscreva-se em nossa newsletter e
receba tudo em primeira mão

Conteúdos relacionados

Entre em contato
1
Posso ajudar?