É possível valorar o capital humano e as boas práticas trabalhistas?

2 de julho de 2013

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É possível valorar o capital humano e as boas práticas trabalhistas? - Ideia Sustentável

Por Gustavo Pimentel

No campo da sustentabilidade não faltam hipóteses teóricas sobre a relação entre a performance socioambiental e o desempenho econômico das empresas. Estamos sempre escutando por aí que sustentabilidade reduz custos, abre novos mercados, melhora o acesso ao capital, atrai e retém talentos, entre outras relações que soam bem aos ouvidos, mas são difíceis de se provar, na prática, por serem intangíveis. A qualidade do capital humano e as boas práticas trabalhistas com certeza entram nesse rol de intangíveis.

Ainda mais difícil do que provar a relação com dados empíricos é determinar a relação de causalidade: a empresa tem bom desempenho econômico porque investe em capital humano (entre outras ações) ou pode investir em capital humano porque tem bom desempenho econômico? Na boa linguagem popular, trata-se do dilema do ovo e da galinha.

A academia já desenvolveu métodos de valoração ambiental que são aplicáveis a outros temas de sustentabilidade ou intangíveis, tais como os de Preços Hedônicos, Custos de Viagem, Custos de Reposição, Valoração Contingente e Custos Evitados, entre outros. Fora da academia, investidores têm desenvolvido formas de valoração, conforme demonstra o estudo Análise Integrada: como investidores estão abordando fatores ambientais, sociais e de governança na avaliação fundamentalista, lançado pelo PRI (Princípios para o Investimento Responsável, da ONU), em fevereiro de 2013. O estudo mostra casos em que os fatores socioambientais são incorporados à estrutura típica de uma avaliação econômica da empresa.

Ainda que os métodos acima sejam robustos e quantifiquem o impacto das práticas de sustentabilidade, eles são majoritariamente prospectivos, fazendo projeções sobre o futuro baseadas em premissas que podem não se materializar. Portanto, além de adivinhar o futuro, é fundamental estudar o passado.

Entram os acadêmicos

Os acadêmicos de finanças estão sempre buscando identificar os fatores que fazem as ações de empresas subirem ou caírem nas bolsas de valores. Felizmente, alguns deles já focam questões de sustentabilidade. Infelizmente, a maioria está no Hemisfério Norte e estuda o mercado americano, em função da grande disponibilidade de dados.

Os professores Meir Statman e Denys Glushkov*, da Universidade de Santa Clara, analisaram os retornos, entre 1992 e 2007, de uma carteira teórica de ações composta por empresas com alta performance em responsabilidade social, incluindo relações trabalhistas. Os resultados mostraram um retorno superior em relação à média de mercado. Essa conclusão é compatível com as evidências encontradas por Alex Edmans**, da Universidade da Pensilvânia, que demonstrou que ações de empresas com empregados altamente satisfeitos tiveram um desempenho superior às demais. Edmans notou ainda que os gestores geralmente subestimam o valor de ativos intangíveis, como a satisfação dos funcionários, porque seus custos impactam diretamente os lucros correntes, enquanto os ganhos são mais difíceis de serem enxergados por estarem em um horizonte de prazo mais longo.

As boas práticas trabalhistas geram ganhos à empresa ao elevar o número de funcionários engajados. Segundo um estudo lançado em 2009 pelo Institute for Employment Studies (IES)***, do Reino Unido, esses funcionários têm performance 20% melhor do que seus colegas menos alinhados à missão da empresa. Além disso, são mais eficientes e impactam positivamente na saúde e no bem-estar do ambiente de trabalho. Para a empresa, possuir funcionários engajados gera ganhos de eficiência que podem se traduzir diretamente em lucros. Mais ainda, funcionários engajados estão menos propensos a deixar o emprego, reduzindo custos de recrutamento, treinamento de substitutos, rescisões e processos trabalhistas. Companhias que possuem uma missão bem definida e atuam de forma positiva para alcançá-la possuem menor rotatividade e, em geral, performance acima de seus concorrentes.

Embora a análise financeira tradicional costume considerar os empregados de uma companhia apenas como custos a serem gerenciados – salários, adicionais de férias, licenças, horas extras, entre outros diversos encargos e benefícios -, funcionários podem fornecer muito mais do que simples ganhos ou perdas financeiras.

E no Brasil?

Apesar da crescente disponibilidade de dados sobre as práticas trabalhistas e de sustentabilidade das empresas brasileiras, estudos acadêmicos empíricos que os correlacionem ao desempenho econômico ainda são escassos. Mas, na falta de entendimento do passado, tentaremos projetar o futuro.

A SITAWI – organização sem fins lucrativos que desenvolve e opera soluções financeiras inovadoras para impacto socioambiental – estimou o impacto das más práticas trabalhistas no valor das empresas de diversos setores listados na BM&FBOVESPA. Esses cálculos exploratórios levaram em consideração o desempenho passado e as ações em curso das empresas em assuntos como greves, sanções por desrespeito à legislação trabalhista – como saúde, segurança e horas extras -, deterioração dos indicadores de doenças e lesões no trabalho e número de dias perdidos, rotatividade e aumento dos custos com treinamento e piora nos índices de eficiência. Podemos notar grandes diferenças intersetoriais, mas também intrasetoriais, no impacto das questões trabalhistas no valor de mercado das empresas.

Observamos, ainda, uma relação direta entre as pesquisas de clima e o desempenho das empresas na dimensão trabalhista: em geral, aquelas que apresentavam uma piora na satisfação dos empregados também estavam mais expostas a processos trabalhistas, greves e exibiam piores indicadores de saúde e segurança. Além disso, sofreram mais com o impacto reputacional, afastando clientes e fontes de financiamento.

Embora não traga ainda resultados conclusivos, a valoração de práticas trabalhistas segundo métodos prospectivos é possível e reforça a necessidade de provar outras hipóteses teóricas da sustentabilidade. Esperamos que mais analistas de investimento e acadêmicos brasileiros possam nos ajudar nesta jornada.

Gustavo Pimentel é diretor da SITAWI – Finanças do Bem (com colaboração de Fred Seifert).


* The Wages of Social Responsibility – Statman&Glushkov, 2008
** Does the Stock Market Fully Value Intangibles? Employee Satisfaction and Equity Prices – Edmans, 2008
*** Employee Engagement: a Review of Current Thinking – Institute for Employment Studies, 2009

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