Luiz Pinguelli Rosa – Planejamento estratégico

Luiz Pinguelli Rosa – Planejamento estratégico

Em um cenário de crescimento da demanda por energia no Brasil e no mundo, os rumos dos investimentos no setor e as discussões sobre o papel das energias renováveis ganham contornos estratégicos, principalmente com a proximidade da reunião da Conferência do Clima a ser realizada no mês de dezembro, em Copenhague.
Neste contexto, o secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas e coordenador do Programa de Planejamento Energético da COPPE, Luís Pinguelli Rosa, destaca o papel de liderança do Brasil. Segundo ele, o País deve lutar para pelo reconhecimento de tecnologias mais limpas desenvolvidas localmente, como é o caso do álcool. “Deve haver regras claras que impeçam o desmatamento para a produção do etanol a partir da cana-de-açúcar. E a mesma coisa para hidroeletricidade. O Brasil tem que ter uma política pró-ativa de demonstração de que a utilização de energia renovável está de acordo com as regras do jogo internacional”, ressalta.
No entanto, a falta de planejamento pode comprometer a trajetória de desenvolvimento até então baseada em uma matriz de fonte renovável. “Existe um gap enorme entre o planejamento teórico e a realização de leilões e a oferta real de energia, o que acaba resultando hoje em algumas termoelétricas com combustíveis que emitem muitos gases de efeito estufa como o carvão mineral”, afirma.
Confira abaixo a íntegra da primeira entrevista do Especial Panorama Energético.
Ideia Socioambiental: Considerando a questão das mudanças climáticas e o potencial de geração de empregos, o setor de energia conseguirá atrair mais investimentos nos próximos anos? Quais as tendências para esse segmento no médio e longo prazo?
Luís Pinguelli: O setor brasileiro de energia tem tido investimentos, a própria descoberta do pré-sal e do gás é resultado do investimento da Petrobras e de outras empresas também. Também está em andamento a construção das usinas elétricas do rio madeira e há a expectativa de um leilão dedicado a energia eólica e em relação à expansão de álcool. A produção de álcool está sendo bem significativa, o consumo do álcool automotivo já ultrapassou o da gasolina, então a produção de etanol tem progredido bastante. Há investimento na área de energia, mas há alguns pontos fracos, a energia solar é um deles. Também tem a questão do lixo urbano que recebe algum investimento, mas poderia ter muito mais.

IS: Qual é o cenário para investimentos em pesquisa e desenvolvimento na área de energias renováveis no Brasil? Qual iniciativa desenvolvida pode se tornar uma tendência nos próximos anos?
LP: No caso do Brasil, temos alguns investimentos importantes. Universidades estudam a energia solar, energia eólica e, no caso da COPPE existe um investimento muito importante no uso das ondas do mar que é totalmente pioneiro. Existem estudos análogos na Inglaterra e em outros países, mas a nossa tecnologia é completamente diferente e muito mais adequada. Então existem outros estudos, outras fontes de energia como a célula combustível para utilização em veículos, que também pode ser uma coisa muito importante.
IS: No âmbito das energias renováveis, quais, na sua opinião, têm maior potencial de desenvolvimento no Brasil? Dentro das novas linhas de pesquisa e desenvolvimento de energias alternativas, como biocombustível de algas, nitrogênio, células fotovoltaicas, geotermia, por exemplo, quais têm maior potencial na sua opinião?
LP: Como energia renovável, a própria hidroenergia é renovável apesar de não ser de pequena escala, agora, das energias chamadas “novas”, vejo uma perspectiva importante para a eólica, há um potencial em energia solar, uma expectativa para seu uso nas obras de residências de baixa renda que estão incluídas no programa de governo incluir coletores solares nessas residências. Essa medida pode estimular muito o setor de energia solar industrialmente além das outras formas que citei. Retomando, energia do mar, energia da célula combustível e o álcool, que é uma grande energia renovável para o automóvel, para veículos que já se usa no Brasil em grande escala, mas que tem investimentos tecnológicos importantes como, por exemplo, a hidrólese da madeira para produção de álcool, que tem sido estudada em vários países e no Brasil também.

IS: Enquanto discutimos a necessidade de frear o aquecimento global e, portanto, reduzir o consumo de energia em diferentes processos, um terço da população mundial não tem acesso a energia elétrica. Como tornar o acesso à energia universal sem comprometer a sustentabilidade? Considerando a relação de oferta e demanda de energia, qual região no mundo apresenta a situação mais crítica?
LP: O Brasil tem uma divida social enorme e precisa de energia para distribuir a essa população que consome muito pouco. Esse também é o caso da Índia, China, de todo mundo em desenvolvimento principalmente. Agora, é necessário encontrar formas de fazer isso com o mínimo acréscimo de emissões de gases de efeito estufa e ao menos tempo contar que os países ricos, que possuem uma emissão altíssima, reduzam sua emissão. No caso do Brasil, a emissão não vem da energia, e sim do desmatamento, e isso deve ser reduzido. Os países em desenvolvimento têm a necessidade de distribuir mais a energia para sua população, o que não quer dizer que a parcela da população que tenha um consumo alto não deva reduzi-lo.
IS: Como o Brasil pode transformar as suas vantagens comparativas, decorrentes, sobretudo, da sua matriz energética predominantemente de fonte renovável, em vantagens competitivas de fato?
LP: Em primeiro lugar acho que é lutar pelo reconhecimento dessa forma de energia que o Brasil utiliza como o álcool que é acusado de produzir o desmatamento, deve ser tornado claro, haver regras que impeçam o desmatamento para a produção de álcool, da cana. E a mesma coisa para hidroeletricidade. O Brasil tem que ter uma política pró-ativa de demonstração de que a utilização de energia renovável está de acordo com as regras do jogo internacional.

IS: Enquanto todos discutem formas de limpar sua matriz energética, o Brasil anuncia a construção de termoelétricas. A falta de planejamento pode fazer com que o País perca o bonde da história?
LP: Isso vem desde as privatizações do setor elétrico que criaram uma certa desorganização na geração elétrica devido a falta de investimentos para a expansão da geração na medida do necessário. E criou depois um programa de termoelétricas mal planejado, em que foi mantido a utilização desse tipo de energia de uma forma inadequada. Hoje, inclusive, novas termoelétricas que vão utilizar óleo diesel ou carvão mineral de uma maneira inadequada. De fato é lamentável que a gente esteja na contramão da história nesse aspecto, isso é verdade. Hoje já existe um planejamento, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que cuida disso. Mas infelizmente, entre o planejamento teórico e a realização de leilões e a oferta real de energia existe um gap enorme que acaba resultando hoje em algumas termoelétricas com combustíveis que emitem muitos gases de efeito estufa como o carvão mineral.
IS: Nos EUA e Reino Unido o setor privado já começa a responder aos pacotes de estímulos a energias renováveis feitos pelo governo. Na sua opinião, o Brasil também precisaria de uma política de incentivo tecnológico e industrial para fontes renováveis?
LP: O Brasil precisa de uma política industrial voltada para energia. Isso não existe. Acaba de existir no caso da Petrobras porque é uma empresa com muitos recursos e com êxito, mas não é geral. Foi criada uma filial da Petrobras destinada a biocombustível que vai exercer esse papel parcialmente na parte que lhe compete, mas acho que falta em energia eólica e solar iniciativas semelhantes.
IS: No campo da eficiência energética, quais os principais avanços e desafios no Brasil? Qual o maior desafio atualmente para o desenvolvimento de novas fontes de energia limpa?
LP: No passado houve um maior avanço do que hoje, houve o Procel da Eletrobrás que cresceu muito. Mas de alguns anos para cá ele está com uma atividade menos importante do que foi no passado. Existe o Conpet da Petrobras, mas acho que poderia se fazer muito mais para o investimento em eficiência energética para dispor de mais energia com um impacto ambiental menor é se reduzir o consumo perdulário de energia usando com mais eficiência e dispondo de mais energia para ser distribuída. Na América Latina o Brasil ainda está em uma situação de liderança.

IS: De que maneira os resultados das negociações na Conferência do Clima, a ser realizada no mês de dezembro, em Copenhague podem impactar os investimentos em energias renováveis?
LP: De um lado estimula, pois a ideia de Copenhague é fazer um novo regime de compromisso para o período que se inicia em 2012. A convenção do clima, que foi no Rio de Janeiro é de 1992, mas esse compromisso foi deliberado em 1997 em Kyoto e que não está sendo alcançado os objetivos devidamente. Lamentavelmente, a maioria dos grandes países, de outros países ricos comprometidos com a redução de suas emissões não conseguiram até o momento resultados importantes. E com isso que será decidido em Copenhague vai haver um estímulo a energia renovável, embora não tenha muita ilusão de que Copenhague conseguirá dar conta do recado. Acho que esse assunto vai se prorrogar por mais tempo além de Copenhague.

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