Especial – Uma década de sustentabilidade no Brasil – Parte 1

Especial – Uma década de sustentabilidade no Brasil – Parte 1

Fotos: Érico Hiller

Não se sabe ao certo a data precisa da história recente da humanidade em que surgiram os conceitos de responsabilidade social empresarial (RSE) e sustentabilidade. O que se sabe é que, mais do que sucedâneos, eles nasceram de matrizes ligeiramente diferentes –a social e a ambiental – mas complementares, o que explica, em alguma medida, porque muitas vezes são tratados quase como sinônimos nos discursos empresariais.
Alguns especialistas arriscam que o termo sustentabilidade teria sido usado pela primeira vez na década de 1970, a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em junho de 1972, em Estocolmo. À época, no entanto, a palavra guardava um significado restrito, relacionado somente aos aspectos ambientais. Tal como é conhecido hoje, o conceito só foi disseminado após a publicação, em 1987, do relatório Nosso Futuro Comum, da Comissão para o Meio ambiente da ONU, que passou para a história como “Relatório Brundtland”, em homenagem à sua coordenadora, a ex-primeira ministra da Noruega, Gro Brundtland. Os debates da Rio-92 e, na Inglaterra, a criação da consultoria SustainAbility, de John Elkington, responsável pela difusão da idéia do triple bottom line (resultados econômico-financeiros combinados com sociais e ambientais), ajudaram a popularizar de vez o termo e o que ele significa e representa.
É seguro falar, no entanto, que o debate mais consistente no âmbito da responsabilidade social começou no Brasil com o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade, que neste ano completa uma década. Pioneira na América Latina, esta organização não-governamental foi criada por um grupo de empresários e executivos preocupados em gerir negócios de forma socialmente responsável, com a missão de mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a analisar suas práticas de gestão e aprofundar seus compromissos com a responsabilidade corporativa.
Antes de o Ethos deflagrar o movimento da RSE no Brasil, e transformá-lo em agenda empresarial, havia iniciativas socialmente responsáveis aqui e ali, dispersas e isoladas, empreendidas por líderes com perfil fora da curva e tratadas como simpáticas exceções.  Empresa que era empresa tinha que se preocupar exclusivamente com lucro e retorno máximo aos acionistas – este era, regra geral, o único papel dos negócios. Governos e entidades assistenciais que cuidassem das questões sociais.
Da visão filantrópica ao paradigma do negócio sustentável
De acordo com Cláudio Boechat, professor e pesquisador na área de Responsabilidade Corporativa da Fundação Dom Cabral, o tema da responsabilidade social no meio empresarial remete ao movimento pela qualidade – de produtos, atendimento e satisfação do cliente –, bastante forte nas décadas de 1980 e 1990. “A responsabilidade ampliou a capacidade de gestão das empresas para outros âmbitos de relacionamento, como os sociais. Foi a forma de integrar questões de atendimento às necessidades de mercado e às de relacionamento com a sociedade”, explica.
No primeiro momento, lembra, predominou uma visão filantrópica, caritativa, de ação social pura. Com o amadurecimento do debate, cresceu a percepção entre as corporações de que a questão da responsabilidade extrapolava esses aspectos, incluindo também o diálogo franco com as partes interessadas, questões éticas, de transparência e governança. Apenas nos cinco últimos anos, reforça, esse movimento foi sendo substituído pelo da sustentabilidade. Na opinião do professor, a onda sustentável  agrega à anterior a preocupação com uma gestão empresarial mais cuidadosa em relação ao futuro do homem e do planeta.
Ainda segundo Boechat, as etapas se sucederam sem que necessariamente tivessem esgotado suas missões. “Avanços foram observados no âmbito da proposta da responsabilidade social. Algumas questões andaram apenas parcialmente, outras acabaram abandonadas. Agora, a premência é cuidar das gerações vindouras, especialmente nas questões ambientais, o que nos leva, mais uma vez, a abandonar temas e nos dedicar  a outros para os quais estávamos menos atentos”, reflete.
Sobre o espaço que esses temas passaram a ocupar no mundo empresarial, a maioria dos analistas concorda que, em uma década, eles se deslocaram da periferia para o centro das estratégias dos negócios, atendendo ao crescente interesse da sociedade pelos temas sociais e ambientais. “Não é uma moda passageira, que teve um pico e depois entrou em declínio. É algo que vem se intensificando e incorporando todos os segmentos da sociedade: legislação, organismos multilaterais, academia, empresas, iniciativas de organizações do terceiro setor, associações e representantes da sociedade civil”, avalia Homero Santos, consultor da Fundação Dom Cabral e do UniEthos.
Até o final dos anos 1990, convencer as empresas sobre a importância da RSE não era tarefa difícil. O discurso soava utópico, ingênuo em seus preceitos e fundamentado em racionalidade que parecia divergir da lógica do lucro. Hoje, ao contrário, são as próprias corporações que recorrem a ele para conferir um novo sentido ao planejamento estratégico de seus negócios, certas de que não sobreviverão em mercados cada vez mais competitivos, e mais regulados por critérios não financeiros, se não tiverem a reputação de empresas éticas, transparentes, socialmente responsáveis e sustentáveis. “Agora as companhias sabem que existe uma necessidade de ética social para cuidar do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável”,  observa Rolf-Dieter Acker, presidente para a América do Sul da BASF, empresa do setor químico, um dos mais visados pelos militantes na defesa do meio ambiente. “É inegável a crescente discussão sobre responsabilidade social em vários setores da sociedade, congregando, cada vez mais, a participação das companhias”, complementa Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras.

Inscreva-se em nossa newsletter e
receba tudo em primeira mão

Conteúdos relacionados

Entre em contato
1
Posso ajudar?