Especial – Um novo olhar sobre o mundo que envelhece (parte 2)

Especial – Um novo olhar sobre o mundo que envelhece (parte 2)

Os dois lados da moeda social

Se a empregabilidade do idoso ainda caminha a passos lentos entre as empresas, ONG’s e universidades investem suas energias em projetos que visam colocá-lo em atividade, melhorar sua auto-estima e a sua qualidade de vida. Entre as iniciativas de destaque estão o Prêmio Talentos da Maturidade do Banco Real e a Universidade Livre da Terceira Idade, da Universidade Metodista de São Paulo.
Em 1999, quando a ONU decretou o Ano Internacional do Idoso, o ABM Amro Real lançou um prêmio de abrangência nacional para valorizar atividades feitas por idosos e voltadas para ele. Ao concorrer ao prêmio, pessoas com mais de 60 anos mostram suas competências na arte de contar histórias, música, literatura e artes plásticas. Também são destacadas monografias sobre a questão do idoso e iniciativas sociais destinadas a esse público.
“Ainda se tem o paradigma de que o idoso não é mais ativo, não tem mais o que fazer na sociedade. O Banco não o vê assim, considera que ele tem de continuar ativo e participando”, diz Rodrigo Villaboim de Carvalho Franco, coordenador do Talentos da Maturidade, projeto nascido para ser uma iniciativa pontual e que entrou no calendário fixo de atividades do ABN Amro Real graças à repercussão, inclusive institucional. Franco conta que o Real recebe, em média, 30 cartas por semana elogiando a iniciativa e que ela também serviu como incentivo para novos clientes. “O interessante é que isso aconteceu mesmo não tendo a ação nenhum propósito de captar clientes. Tanto que o prêmio não pode ser usado em campanhas para obter retorno direto para a instituição financeira”
Segundo o coordenador, uma das preocupações do prêmio foi atingir todas as classes sociais. “Não é uma ação promovida para a classe média, mas para todos os degraus da pirâmide social. Os vencedores refletem isso. No ano passado, entre os agraciados havia desde aqueles que fizeram projetos pela Internet até gente que nunca teve telefone em casa. Isso foi propositalmente calculado, pois o objetivo era atuar no âmbito da emoção, melhorando a auto-estima dessas pessoas e mostrando a elas que têm muito valor”, diz. Para Franco, os vencedores do prêmio acabaram se transformando em personalidade e exemplos a serem seguidos, especialmente nas comunidades mais pobres. “Um caso que acredito mostrar bem o quanto um prêmio como este muda a vida das pessoas foi de uma senhora que queria participar, mas achava que não se encaixava em nenhuma das categorias. Ela escolheu pintura sem nunca ter colocado um pincel nas mãos em toda sua vida. Ficou tão motivada que foi fazer cursos e se capacitou durante três anos. Virou objetivo de vida para ela. Participou, ganhou e continua pintando”, relata.
Embora não disponha de um estudo específico, Franco acredita que o Talentos da Maturidade mudou inclusive a relação dos funcionários do banco com as suas famílias. Ao tomar contato com o projeto –crê –, eles passaram a olhar com mais sensibilidade os idosos que têm na família. Internamente, o Real tem um programa de preparação de funcionários para a aposentadoria para que eles se tornem ativos posteriormente e que saibam lidar com o rompimento do vínculo com a empresa.
Em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, a Universidade Metodista resolveu trazer as pessoas de mais idade de volta para a escola. Como nem todos na época em que eram jovens, conseguiram se formar no ensino médio foi criado um curso livre, sem necessidade de comprovação de escolaridade anterior, que pode durar de dois a quatro anos, dependendo do objetivo do aluno. Com preço simbólico, de aproximadamente R$ 50 a mensalidade, e aulas duas vezes por semana, a Faculdade de Educação e Letras já colocou em seu campus mais de 200 idosos.
Coordenada pelo profesor Moses Benadiba, a Universidade Livre da Terceira Idade nasceu com objetivo de reinserir o idoso na sociedade, aproveitar tudo que ele tem de bom e produtivo e melhorar a sua qualidade de vida. A preocupação com a auto-estima foi um fator determinante na estruturação do curso. “Tínhamos muito receio em oferecer uma capacitação profissional para os idosos e o tiro sair pela culatra em relação ao resgate da auto-estima, caso eles tivessem dificuldade de voltar para o mercado de trabalho. Optamos então pela formação do Agente Social para atuar em organizações e projetos sociais onde as portas costumam estar bem mais abertas”. Na universidade são esses alunos que cuidam de eventos internos, até mesmo da recepção dos calouros. “A turma é encarada pela instituição como qualquer outra. E essa integração com os cursos de graduação vem provocando um novo olhar dos alunos e até dos professores sobre suas próprias famílias e relações sociais”, conclui.
Outra ferramenta importante que tem sido pauta nos cursos voltados para idosos é a informática. E ao contrário do que muita gente pensa, eles vêm se dando bem com a tecnologia. “Por meio da informática, é possível desencadear no aluno idoso novas descobertas sobre si mesmo e seu potencial em aprender. A resistência em lidar com recursos tecnológicos é rompida, a confiança em viver situações novas é adquirida. Ele se sente incluído na sociedade tecnológica. Consegue provar a familiares sua capacidade para lidar com botões/ícones e explorar funções/programas do computador. Alem de tudo isso, o mundo do idoso se amplia coma Internet, o que provoca avanços nas relações virtuais ou não com filhos, sobrinhos, netos, parentes e amigos distantes” conta a professora Vitória Kachar, coordenadora executiva do curso de extensão em Educação e Envelhecimento de PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Enquanto isso…

Ao mesmo tempo em que festeja entusiasmadas iniciativas como a do Banco Real e da Universidade Metodista, a especialista Laura lembra que elas se destinam aos idosos saudáveis. Mas também há os dependentes e semi-dependentes. E atendê-los adequadamente representa um enorme desafio para o país. “Os trabalhos sociais para o idoso cresceram nos últimos tempos, mas com ênfase no idoso que tem boa saúde. São programas de lazer, de atividade física, dança e encontros sociais de grupos de convivência, que atingem os idosos felizes. E quanto aos chamados idosos dependentes?”, pergunta, para responder logo em seguida: “Estão muito mal, mesmo com o Estatuto Nacional do Idoso. Faltam o que chamamos de instituições intermediárias de cuidado. Têm-se ótimos programas voltados para os saudáveis de um lado e do outro instituições de internação, os chamados asilos, que em grande parte são locais de má qualidade, praticamente depósitos de pessoas”, conclui.
Para a consultora, o País carece de instituições como os centros-dia, nas quais o idoso dependente ou semi-dependente pode ser atendido sem deixar de conviver e morar com a sua família. “Nesse tipo de organização, ele fica durante o dia em atividades de reabilitação e à noite volta para casa. É um público esquecido e negligenciado pela política brasileira. Em termos mundiais, representa entre 4 e 5% da população. Na falta de políticas públicas adequadas, este idosos mais fragilizados se transformam em fardo para a família e até mesmo em alvo fácil de maus tratos. A constituição brasileira é muito clara quando prega que é dever dos filhos cuidar dos seus idosos. Mas em que condições?”, questiona a especialista
Segundo o Estatuto do Idoso, pessoas com mais de 65 anos de idade…

– Têm garantia de prioridade em atendimento público e privado.
– Têm assegurado o atendimento médico especializado na rede pública, inclusive com fornecimento gratuito de remédios de uso contínuo.
– Devem receber alimentação do Estado, caso sua família não tenha condições de oferecer.
– Em caso de maus tratos, devem ter suas ocorrências comunicadas às autoridades por profissionais e estabelecimentos de saúde.
– Devem ser atendidas, nas unidades públicas de saúde, obrigatoriamente por profissionais especializados em lidar com este tipo de público.
– Ter o apoio do poder público para cursos universitários específicos.
– Não podem ser objeto de discriminação e preconceito em processos seletivos de emprego.
– Devem receber benefício mensal de pelo menos um salário mínimo.
– Quando internadas em casas de repouso ou estabelecimentos semelhantes, os serviços específico de que são beneficiárias devem obrigatoriamente ser objeto de contrato de prestação de serviços.
– Em casos de situação de risco, devem ser acolhidas pelos Estado.
– Devem ter prioridade na aquisição de imóveis em programas habitacionais.
– Devem ter gratuidade nos transportes coletivos públicos
– Devem receber vagas gratuitas e desconto em passagens no transporte interestadual.
– Devem receber vagas especiais em estacionamentos públicos e privados.
– Devem ser atendidas em varas judiciais especiais, criadas para esta finalidade.
– Não devem ser objeto da veiculação de imagens ou mensagens pejorativas, sob pena de sanção judicial específica.

Inscreva-se em nossa newsletter e
receba tudo em primeira mão

Conteúdos relacionados

Entre em contato
1
Posso ajudar?