Especial – Quem produz “verde” no Brasil? – Parte III

Especial – Quem produz “verde” no Brasil? – Parte III

Educação de consumidores é palavra de ordem
Representando o elo final entre produtores e consumidores, o varejo desempenha papel crucial na educação para a sustentabilidade de milhões de pessoas que passam por seus estabelecimentos todos os dias. Algumas redes, inclusive, desenvolvem suas próprias linhas de produtos ambientalmente amigáveis para estimular o consumo e ganhar vantagem competitiva.
Na avaliação de Roberta, da FGV, o varejo enfrenta hoje o dilema da baixa demanda de produtos com aspectos sustentáveis, tanto devido ao fato de o consumidor não compreender o seu diferencial, quanto pela falta de acesso econômico para a maioria da população. “O setor entendeu que precisa disponibilizar esses produtos e tem feito um esforço. Mas, muitas vezes, não há demanda suficiente. Falta aceitação”, afirma.
Carrefour Brasil apresenta um portfólio de orgânicos, com destaque para o Viver Orgânico, uma das principais famílias da linha Viver, marca própria lançada em 2006. Os produtos são certificados por empresas independentes que definem os critérios de certificação de orgânicos no mundo – livres de agrotóxicos, pesticidas, antibióticos, e objetos de uma produção sustentável. Segundo Paulo Pianez, do Carrefour, graças à sua capacidade “única” de comunicação com o consumidor, as redes de supermercado têm o dever de estimular a educação, exercendo um “papel fundamental na consolidação de um mercado sustentável.”
Em 1991, por causa da doença da vaca louca, o Carrefour criou o programa Garantia de Origem na França para assegurar ao cliente, por meio de um certificado, a boa origem da carne bovina oferecida em suas gôndolas Desde então, passou a acompanhar todas as etapas da criação até o abate do rebanho. Atualmente, a iniciativa certifica cerca de 700 produtos em todo o mundo.
No Brasil, essa iniciativa teve início em 1999 e hoje disponibiliza cerca de 75 itens, entre legumes, verduras, frutas, ovos caipiras, queijos e carnes. Para integrar o programa, o produto precisa cumprir requisitos como, por exemplo, controle de pragas e doenças por meio de agentes naturais e a disposição de depósitos ou reservatórios para abrigar as embalagens vazias até que sejam enviadas para reciclagem. Hoje, 15% de tudo que é vendido na rede já contem o selo “Garantia de Origem”.
De acordo com Roberta, da FGV, existe uma pré-disposição maior dos consumidores para comprar produtos orgânicos ou itens com origem e regularidade dos processos atestados. Já os produtos com um apelo socioambiental enfrentam mais dificuldades. “Há diversas barreiras culturais dependendo da solução que se apresenta. No caso dos orgânicos, os consumidores sabem que esses alimentos possuem menos agrotóxicos, o que mostra que o consumo ainda está muito ligado à questão individual da saúde”, avalia.
No Wal-Mart, a linha “Sentir Bem” possui 100 itens de venda e a rede pretende chegar a 200 ainda em 2009. Alguns produtos exclusivos, como o sabão em pedra TopMax, (o chamado produto de ciclo fechado) recolhe o óleo de cozinha arrecadado dos clientes, envia-o a uma empresa que fábrica o sabão e posteriormente o revende de novo em suas lojas. O produto é vendido no Maxxi Atacado do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, uma loja de atacado do grupo Wal-Mart, e até o final do ano o deve chegar a outros estados.
Esse produto já vendeu cerca de 11 toneladas, tem o preço mais baixo do que o líder da categoria e possui o mesmo desempenho de seus concorrentes. “No primeiro mês, vendemos umas poucas unidades. No segundo mês, o volume começou a aumentar e hoje o sabão é líder. Fizemos ações de comunicação em um ponto de venda tanto para trazer o óleo quanto para falar ao consumidor sobre os benefícios do produto final. Além de ser um produto sustentável, ele é bom para o ambiente e também para o bolso”, afirma Yuri Feres, consultor de sustentabilidade do Wal-Mart.
Disponível em todas as lojas da rede, outro produto desenvolvido pelo Wal-Mart é o Eco-line, um telefone, cujos componentes de plástico são feitos de carcaça de computadores usados. A rede procurou uma empresa que lhe vendia aparelhos de telefone com a ideia de tentar criar um produto diferente e essa companhia parceira buscou sucata de computadores velhos para produzir as novas peças. A empresa também investe em um cobertor 100% feito de garrafa PET. Cada unidade utiliza 200 garrafas recicladas. Desde o lançamento em fevereiro de 2008, já foram comercializados mais de 100 mil exemplares nas lojas do grupo. “Há empresas que já tem metas relacionadas a produtos sustentáveis para cada uma de suas categorias. Essa ligação entre o produtor e o varejo é o que precisa ser trabalhado. Às vezes, o varejo deseja ter mais produtos, porém não sabe onde encontrar. Os produtores alternativos desconhecem os caminhos para apresentar seus produtos”, destaca Roberta, da FGV.
Trabalhar em parceria com fornecedores é uma questão central para a inserção da sustentabilidade no varejo. Na iniciativa intitulada “Pacto pela sustentabilidade”, o Wal-Mart firmou uma série de compromissos com 300 fornecedores, 200 ONGs, além de outros stakeholders em relação a temas como desenvolvimento sustentável da Amazônia, redução de embalagens e cadeias produtivas mais sustentáveis. Para a construção desses compromissos, a empresa realizou os “Diálogos pela Sustentabilidade”, fórum com representantes da sociedade civil, governo, fornecedores e funcionários.
Os desafios do pós-consumo
O esforço de desenvolver um produto sustentável não se encerra com a compra deste pelo consumidor. Em um ciclo fechado, o pós-consumo inicia, na verdade, outra etapa fundamental, em que o produto segue o ciclo contrário ao de produção. Busca-se formas de reaproveitar ou reciclar seus componentes, reduzindo ao mínimo os resíduos gerados.
No pós-consumo está o maior desafio relacionado ao desenvolvimento de produtos sustentáveis. Ainda que esforços sejam dedicados à redução de materiais, substituição de substâncias nocivas, não recicláveis ou não biodegradáveis, o descarte inadequado prejudica a qualidade de todo o ciclo.  Poucas empresas, no entanto, se dispõem a recolher seus produtos após o uso, até porque qualquer ação desse tipo requer cooperação com o poder público e, principalmente, com os consumidores. “Graças aos catadores não estamos numa situação caótica. Como não há uma legislação clara sobre o tema, a maior parte das empresas se finge de morta e deixa essa responsabilidade na mão do consumidor. Já que o Estado não se manifesta, as empresas deveriam tomar a iniciativa e se engajarem em projetos de educação ambiental”, propõe Mascaro.  
No caso da HP, o que a empresa tem feito é buscar formas de reinserir os resíduos no próprio processo produtivo. Cerca de 50% dos cartuchos novos da companhia contém resíduos de antigos cartuchos. Além disso, a empresa implementou, no último mês de fevereiro de 2009, o centro de reciclagem de cartuchos, por meio do qual os resíduos, após tratamento e readitivação no Canadá, voltam a compor o processo produtivo das impressoras, componentes, partes e peças.
“A diferença entre fazer isso e não fazer são milhões de dólares investidos em pesquisa e desenvolvimento. Isso diferencia muito as empresas que trabalham com uma visão sustentável de outras empresas nas quais a única preocupação é coletar. Em logística reversa, coletar não é gestão de sustentabilidade. É bom fazer, mas quando se coleta, está apenas se juntando o lixo, não conferindo-lhe uma disposição sustentável no processo”, avalia Saidi, da HP
Leia mais perspectivas do consumo responsável e sobre comportamento do consumidor no Brasil na matéria a seguir (página XX)

Box 1:
Mercado promissor
Alguns números divulgados por importantes companhias revelam um cenário promissor para os produtos verdes. As vendas da Philips no mundo, por exemplo, aumentaram 12,5% em 2008, crescendo para 22,6%, ante 19,8% em 2007. Em 2006, foram introduzidos no mercado 57 produtos da linha Green Flagships, representando um aumento de 24% em relação aos 46% de 2005. Atualmente, o Green Flagships possui mais de 200 itens, com vendas totais de €2,2 bilhões.
Na Siemens, a receita originada da venda de produtos sustentáveis foi de cerca de €17 bilhões (23% da receita total). A empresa almeja chegar a €25 bilhões em 2011, contribuindo para abater 275 milhões de toneladas de CO2. A companhia fatura anualmente €77 bilhões, 19 bilhões dos quais faturados por sua linha de produtos verdes.
Box 2:
Para não levar gato por lebre…
Entenda o que significa alguns atributos socioambientais
Orgânico: produto obtido sem a utilização de substâncias químicos ou de hormônios sintéticos que favoreçam o seu crescimento de forma não natural. Inclui alimentos e produtos manufaturados produzidos a partir de produtos não sintéticos, tais como os sapatos feitos de couro natural e de roupas feitas de algodão orgânico.
Ciclo produtivo fechado: além das etapas convencionais de um processo produtivo (transformação de matérias-primas, produção e uso dos produtos), compreende o pós-consumo. Dessa forma, o projeto dos produtos, assim como sua destinação final devem proporcionar sua separação, reutilização ou reciclagem.
Ciclo de vida: compreende toda a trajetória de um produto ou processo, desde o seu início, por exemplo, com a extração dasmatérias-primas, até a destinação final, consumo e pós-consumo. Por essa razão, a metodologia para avaliar os impactos ao longo do ciclo de vida de um produtos ou processo também é chamada de “análise do berço à cova”.
Pegada de Carbono de Produto: trata-se de uma análise que tem como objetivo mensurar todas as emissões resultantes do processo produtivo de determinado item e, em alguns casos, considera-se também os gases de efeito estufa gerados no consumo.
Carbono neutro: produto ou processo, cujas emissões de gases de efeito estufa foram mensuradas e compensadas a partir de metodologias de seqüestro de carbono, sendo a mais comum o plantio de árvores.
Biodegradável: todo material que após o seu uso pode ser decomposto pelos microorganismos usuais no meio ambiente.
Reciclável: todo material que após ser utilizado pode ser reutilizado para fabricação de novos produtos
Reciclado: proveniente do processo de reciclagem de algum material já manufaturado.
Leia aqui a íntegra do levantamento sobre produtos verdes realizado por Ideia Sustentável.
<<Anterior>>                                                                                    <<Próxima>>

Inscreva-se em nossa newsletter e
receba tudo em primeira mão

Conteúdos relacionados

Entre em contato
1
Posso ajudar?