Especial – O desafio de educar líderes para uma economia verde – Parte I

Especial – O desafio de educar líderes para uma economia verde – Parte I

Expansão do mercado de empregos verdes expõe déficit em formação de profissionais e pressiona escolas de negócios de todo o mundo a inserirem as questões socioambientais em seus currículos e proposta de ensino
Alguns meses após o anúncio de pacotes de estímulo a investimentos em energias renováveis e eficiência energética – anunciados pelos governos do Reino Unido, Estados Unidos e China – recrutadores já alertam para a dificuldade de encontrar profissionais capacitados para preencher as vagas criadas no setor de empregos verdes.  Fica claro, portanto, que a transição para uma economia de baixo carbono só virá acompanhada de uma profunda reforma educacional.
Coincidentemente, os sinais de preocupação  se manifestam também nos Estados Unidos, onde a ruptura com os modelos atuais tem sido sobretudo emblemática, a considerar o estilo de vida baseado no consumo perdulário que aquele país consagrou e disseminou para o mundo nos últimos anos. “Os homens e mulheres que, em 20 anos, vão liderar os negócios, instituições de ensino e agências de governo estão na escola agora. Precisamos oferecer a eles formação acadêmica e profissional que os preparem para enxergar e criar um novo mundo”, ressalta Kevin Coyle, vice-presidente de educação e treinamento da organização norte-americana National Wildlife Federation, no relatório Campus 2008.
Ainda segundo ele, esse novo mundo com certeza terá formas mais limpas de produção de energia, transporte, agricultura, gestão dos recursos naturais, saúde, pesquisa científica, modelos de negócios e outros avanços tecnológicos essenciais. “Alcançá-lo, na velocidade necessária, demandará um suporte sério, incluindo acompanhamento e financiamento do governo federal e estadual e uma revisão completa das propostas de ensino em todas as áreas do conhecimento”, conclui.
O chamado para uma economia verde ecoa principalmente nas instituições de ensino, que são cobradas a assumir um papel mais ativo no debate de soluções voltadas ao desenvolvimento sustentável. Para George Stein, professor no Insper, na FIA e na PUC-SP, além de pesquisador do GEPI (Grupo de Estudos e Pesquisa em Interdisciplinaridade – PUC/SP), a quantidade de mobilizações e troca de experiências entre empresas e organizações da sociedade civil têm ocorrido em uma escala e velocidade superiores às da atividade acadêmica. Por isso, segundo ele, a percepção da academia como detentora exclusiva do conhecimento precisa ser revista  a fim de mudar a direção para uma ação conjunta com esses diferentes atores. “O primeiro passo é estabelecer uma pré-disposição para criar conhecimento e compartilhá-lo de uma maneira mais participativa, segundo a qual empresas, academia e sociedade trabalhem lado a lado visando formar o mais rápido possível profissionais preparados para os novos desafios da sustentabilidade”, ressalta.
Em resposta a essa pressão, muitas instituições de ensino têm revisado suas práticas. Mas o levantamento da National Wildlife Federation, realizado junto a universidades norte-americanas, mostra que as ações de boa cidadania corporativa nem sempre vêm acompanhadas pela adaptação de currículos para a sustentabilidade, pelo menos não com o mesmo vigor. O diagnóstico foi feito a partir da comparação dos resultados do levantamento de 2008 com os primeiros dados colhidos no primeiro relatório Campus, publicado em 2001. “Há muitas mudanças positivas ocorrendo nas instituições de ensino norte-americanas, especialmente no que diz respeito ao `esverdeamento` dos campus. Inesperadamente, no entanto, a análise do período de 2001 a 2008  revelou que a quantidade de programas relacionados à sustentabilidade não cresceu. Como um educador, acredito que esse é um motivo de preocupação”, ressalta Coyle.
Para Stein, essa tendência não se observa apenas nas instituições norte-americanas. Segundo ele, as universidades estão começando por onde é mais fácil começar. “De fato, daqui alguns anos será inconcebível uma instituição que não tenha boas práticas socioambientais. Mas uma universidade deve ser cobrada muito menos pela sua pegada ecológica e muito mais pela responsabilidade de formar pessoas mais competentes nesse assunto”, afirma.

MBAs na vanguarda
Os programas de MBA têm se mostrado mais ágeis na adaptação de seus currículos e atividades à crescente valorização do tema da sustentabilidade. Na opinião de Stein, isso se deve à maior proximidade que possuem com a realidade das empresas. “As grandes companhias estão mais preocupadas em atender seus públicos de interesse e já sentem a necessidade de começar a formar profissionais diferentes”, afirma.
A diversidade da teia de stakeholders que passou a orbitar em torno dos negócios também se reflete nas turmas de MBAs, que hoje não se limitam mais a executivos de empresas. Empreendedores sociais, consultores, gestores públicos, banqueiros sentam lado a lado e partilham do mesmo propósito de buscar soluções que aliem benefícios econômicos, sociais e ambientais. Essa é a realidade à qual as escolas de negócios vêm tendo que se adaptar à medida que os diferentes segmentos da sociedade se deparam com o desafio da sustentabilidade, iniciando uma corrida por especialização na área.
“Cada vez mais os programas de especialização em negócios  reconhecem a necessidade de preparar líderes com valores que entendam a importância de um ambiente saudável, comunidades fortes e sustentabilidade no longo-prazo”, reforça a publicaçãoBusiness as UNusual 2008, da Net Impact, um rede global com mais de 7000 lideranças na área de sustentabilidade, que compilou a opinião de 1.552 estudantes-membros da organização e 62 líderes de programas de ensino.
A primeira edição da pesquisa foi realizada em 2006 em resposta à procura crescente de candidatos às escolas de negócios que recorriam a Net Impact em busca de informação sobre os programas que melhor integravam questões sociais e ambientais aos seus currículos. Na outra ponta, as universidades também batiam à porta da organização norte-americana, interessadas em demonstrar como seus programas tratavam essas temáticas.
Desde então, o levantamento Busines UNusual vem servindo como uma ferramenta para que as instituições possam comparar seus esforços e desenvolver currículos de maior impacto social.
Outra publicação na mesma linha é o guia Beyond Grey Pinstripes, do Aspen Institute, organização não governamental sediada nos Estados Unidos, um levantamento que traz um ranking dos programas de MBA líderes no movimento de integração de questões sociais e ambientais nos currículos. “Essas escolas já preparam os estudantes para a realidade de amanhã, munindo-os com as perspectivas econômica, ambiental e social requeridas para o sucesso do negócio em um mundo competitivo e de rápidas mudanças”, enfatiza o Aspen Institute em sua publicação.
Em seu site na internet, a organização publica uma síntese dessa pesquisa com informações de mais de 130 MBAs. Para seleção dos melhores programas, foram avaliados aspectos como o número de disciplinas eletivas e cursos relacionadas a questões socioambientais oferecidas pela universidade, bem como a relevância de suas propostas. O Aspen Institute também considerou os artigos publicados na área, projetos e departamentos dedicados à sustentabilidade.
Esses critérios, segundo Stein, também podem ser utilizados no momento de buscar o melhor curso de especialização em sustentabilidade. Tão importante –ressalta — quanto analisar a oferta do curso é demandar qualidade. “Vejo o estudante como umstakeholder importante, que tem uma voz mais forte do que a que está sendo ouvida hoje em dia”, aposta.

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