Especial – Inovação e Sustentabilidade – parte 2

Especial – Inovação e Sustentabilidade – parte 2

Liberdade como via inovadora
Entre as empresas mais emblemáticas do século 21, o Google tem sido sinônimo de ousadia e inovação.  Desde o seu nascimento, a companhia norte-americana vem revolucionando o mercado com a introdução de soluções voltadas às necessidades reais dos usuários.
Por trás de seus serviços e produtos inovadores, está uma estrutura organizacional e um ambiente de informalidade favoráveis à colaboração, à liberdade de expressão e à troca de idéias entre os funcionários.
“Aqui as pessoas são estimuladas a dedicar 20% do tempo de trabalho a pensar em algo realmente inovador. Elas podem refletir sobre como usar as ferramentas já existentes para novas finalidades ou ainda sobre a integração de funcionalidades diferentes. Mas também podem criar algo completamente novo, seja um produto, uma idéia inusitada ou um serviço não disponível no mercado”, explica Félix Ximenes, diretor de comunicação do Google Brasil.
À medida que os esforços de inovação da empresa se voltam para a sustentabilidade, surgem iniciativas interessantes como a do Google Earth Outrech, que disponibiliza versões mais avançadas do software de imagens de satélite para organizações não-governamentais. O objetivo do projeto é oferecer às entidades mecanismos para difundir e proteger causas socioambientais.
A idéia partiu de uma engenheira do grupo, Rebecca Moore, hoje diretora global do Google Earth Outrech, quando uma área verde do bairro em que morava na Califórnia passou a ser ameaçada por um empreendimento imobiliário. Para mostrar o que estava acontecendo naquela comunidade, Rebecca criou uma programação no Google Earth e passou disparar imagens que registravam a retirada de madeira local, o impacto nas nascentes dos rios, na fauna, flora e em toda a biodiversidade da região.
“O resultado foi surpreendente. Pessoas de todo o mundo se mobilizaram contra a obra, que acabou sendo embargada. Diante disso, Rebecca percebeu que a ferramenta poderia ser útil na promoção de causas ambientais e sociais”, afirma Ximenes.
A experiência tem inspirado outras iniciativas dirigidas à sustentabilidade. Ximenes conta que os projetos nessa área – surgidos, a princípio, da iniciativa de funcionários – não só receberam apoio como motivaram a companhia a dedicar esforços à busca de tecnologias mais limpas.
Em 2007, o Google anunciou o compromisso de se tornar carbono neutro. Desde então, vem mobilizando o seu time de funcionários e empresas do setor de Tecnologia da Informação a desenvolver energias renováveis. No mesmo ano, fundou, junto com a Intel, o Climate Savers Computing Initiative, um consórcio sem fins lucrativos, cuja meta é baixar pela metade o consumo de energia dos computadores até 2010, reduzindo as emissões de carbono em cerca de 54 milhões de toneladas por ano.
Outra frente de atuação se dá com o Projeto Predict and Prevent, criado para utilizar a tecnologia da informação na prevenção de ameaças iminentes antes que elas se tornem crises locais, regionais ou mesmo globais. Esses eventos podem incluir doenças infecciosas, o desmatamento e até mesmo as mudanças climáticas.
Há ainda iniciativas para facilitar o acesso à informação de comunidades, com o propósito de estimular o empreendedorismo ou de fomentar políticas para melhoria dos serviços públicos. Para Ximenes, todas essas soluções resultam de características e valores que a companhia procura identificar e incentivar  entre os funcionários. “Preferimos pessoas que tenham um padrão ético e moral sólido, que desejem fazer o bem, construir algo diferente. Nossos profissionais precisam querer mudar o mundo. Essa é a ambição que nos move”, destaca Ximenes.
Voluntariado e inovação
Ao estreitar os laços com a comunidade da qual faz parte, a empresa têm mais condições de conhecer as reais necessidades dos consumidores e alinhar o processo de inovação à sustentabilidade.
Na General Eletric, a prática do voluntariado tem auxiliado a empresa a atender às expectativas de seus mercados e, ao mesmo tempo, oferecer respostas para dilemas complexos colocados pelo desenvolvimento sustentável.

Segundo Marcelo Mosci, presidente da GE para a América Latina, o voluntariado contribui na formação de profissionais, principal fator de inovação da empresa. “É um caminho de ida e volta. Cada pessoa tem uma competência que pode ser colocada a serviço da comunidade. Em troca obtém um ensinamento único que o ambiente de trabalho dificilmente proporciona. Ao perceber que pode melhorar o meio em que vive, o profissional começa a pensar diferente e basear suas ações em propósitos”, afirma.
A empresa conta com um grupo de voluntários desde 1928, ano da criação do GE Volunteers. Mas foi só recentemente que o voluntariado começou a assumir contornos mais estratégicos. Segundo Mosci, a prática também melhora a capacidade de gestão da empresa. Essa descoberta surgiu a partir do momento em que a empresa passou a incorporar atividades junto à comunidade em reuniões de equipe e treinamentos. “Todas as vezes que fazíamos grandes reuniões de staff, contratávamos alguém para criar um ambiente integrado entre as pessoas. Até que em um encontro no México, nasceu a idéia de realizar um serviço comunitário para esse fim”, ressalta.
Os profissionais da GE se dedicam a atividades voluntárias dentro do seu horário de trabalho. No Brasil, o GE Volunteers possui quatro conselhos distribuídos em São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro. Além das atividades realizadas com as entidades parceiras, a GE realiza círculos de leitura com alunos da rede pública de ensino. Os encontros ocorrem na companhia e são conduzidos pelos multiplicadores do Instituto Fernand Braudel e voluntários da GE.
Segundo Alexandre Alfredo, diretor de comunicação da empresa, as crianças e jovens que participam dos círculos convidam os voluntários a refletir sobre o mundo à sua volta, estimulando novas atitudes. “No início, tivemos receio de que a integração com o grupo pudesse não ocorrer. Mas fomos surpreendidos. Começamos a ler clássicos, como os de Platão e Sócrates, por exemplo, e não demorou muito para que surgissem perguntas do tipo: ‘qual o paralelo disso com a nossa sociedade?’. Essa experiência convoca nossos profissionais a refletirem e pensarem fora da caixa”, afirma.
Além de orientar as atividades de voluntariado, a busca de soluções voltadas para os principais problemas da sociedade tem se mostrado um importante nicho de negócio para a empresa. Em 2004, a GE lançou a linha Ecoimagination e o compromisso de investir US$ 1,5 bilhão de dólares na pesquisa e desenvolvimento de soluções sustentáveis até 2010.
A linha conta com cerca de 60 produtos que incluem desde turbinas com baixa emissão de gases de efeito estufa até sistemas de automação para casas que visam reduzir o consumo de água e energia.  Em 2007, as vendas de produtos da Ecoimagination atingiram quase 10% das vendas globais da companhia, totalizando 14 bilhões de dólares. Segundo estimativas da própria empresa, o faturamento da Ecomagination cresce três vezes mais rápido que a média de todos os produtos da GE. Deverá atingir 25 bilhões de dólares em 2010.
O alinhamento da estratégia à sustentabilidade funciona como uma via de mão dupla. A decisão de construir soluções sustentáveis reforça nos funcionários o sentimento de que podem transformar a realidade, o que, consequentemente, aumenta as chances de sucesso da própria estratégia. “As pessoas admiram a plataforma Ecoimagination porque sabem que se trata de algo inovador. Por menor que seja a contribuição de cada um nesse processo, é gratificante saber que podemos fazer a diferença a partir do desenvolvimento de soluções que proporcionam benefícios não só para a empresa, mas também para o meio ambiente e a sociedade como um todo”, afirma Alfredo.
“Decifra-se ou serás devorada”
Conhecer a fundo as competências e incapacidades da empresa é pré-requisito para a inovação. De acordo com Symantob, da FGV, as empresas inovadoras sustentáveis, são, antes de tudo, grandes psicanalistas de si mesmas. Essa é uma habilidade que, segundo ele, a Embraer desenvolveu muito bem. Como sabia que não conseguiria produzir aeronaves grandes, a companhia brasileira decidiu usar o conjunto de suas competências para bater fabricantes de máquinas de vôos regionais, como a Bombardier.
A conexão com pólos de conhecimento, acesso a matérias-primas essenciais, custo de mão-de-obra competitivo, conhecimento do mercado de rotas curtas e flexibilidade produtiva são os pontos fortes da empresa. Ao reconhecê-los, ficou mais fácil –crê Symantob– traçar uma estratégia e centrar seus esforços de inovação.
O desenvolvimento de tecnologias mais limpas é hoje uma das principais apostas da Embraer. Em 2004, a empresa lançou o pulverizador Ipanema, primeiro avião no mundo a operar totalmente com biocombustível (álcool). A tecnologia foi premiada pela revista Scientific American como uma das 50 invenções mais importantes de 2005.
Para Guilherme Freire, diretor de estratégias e tecnologias para o meio ambiente da Embraer, o investimento em pessoas e o compromisso da alta administração com o tema foram fatores essenciais para construção de uma cultura de inovação fundamentada na sustentabilidade. A cooperação é outro aspecto que a Embraer procura desenvolver. “Valorizamos a colaboração não só entre os funcionários, mas também com a Academia. Temos algumas parcerias com o MIT (Massachusetts Institute of Technology) para tratar de pontos específicos que toda a indústria trabalha, entre eles o desafio das mudanças climáticas”, explica Almeida.
Em abril de 2008, a Embraer, juntamente com outras empresas do setor aeronáutico, assinou a declaração sobre mudanças climáticas durante a 3ª Conferência de Aviação e Meio Ambiente (Aviation & Environment Summit).
De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas das Nações Unidos (IPCC) as viagens em aeronaves são responsáveis por 2% de todo o dióxido de carbono produzido pela atividade humana. Em resposta a este desafio, a Embraer tem feito um esforço para economizar combustível, aperfeiçoar a aerodinâmica dos aviões e utilizar novos materiais. Melhorias tecnológicas desse tipo proporcionaram a redução de 3% no consumo de combustível dos jatos EMBRAER 190 e EMBRAER 195, os maiores fabricados pela empresa.
De acordo com Symantob, da FGV, a Embraer consegue desenvolver e lançar novos produtos acompanhando as necessidades do mercado porque a inovação está consolidada em sua cultura. Ainda segundo o especialista, para tornar o processo de inovação contínuo, a organização deve, portanto, “abrir seu próprio DNA” e, se for preciso, transformá-lo por meio da criação de novas competências, da correção de rumos, do abandono de recursos improdutivos que não reproduzam o valor do capital.
“A companhia precisa formular estratégias ancoradas na sua identidade. Deve fazê-lo em atenção ao chamado da mitológica esfinge, monstro épico destruidor da cidade de Tebas, apenas derrotado após a resolução do enigma, que parafraseado ficaria: decifra-se, ou serás devorada”, ressalta.
Empresa sou “eu”

Como pressupõe o próprio nome, a responsabilidade social traduz em compromissos a proposta de desenvolvimento sustentável. Partindo desse princípio, o professor da FGV defende que os funcionários tenham consciência de que respondem pela companhia. “As pessoas contratadas para a organização precisam trazer algumas características, como a clareza de que vão trabalhar em uma organização comercial, cuja parte do resultado final será responsabilidade dela. Os profissionais precisam aprender a pensar e agir sempre na primeira pessoa do singular.”, exemplifica.
O Grupo Orsa é um bom exemplo de integração do conceito de sustentabilidade ao negócio. E também de cultura interna predisposta para o tema. Segundo Rosana Orlando, coordenadora de Responsabilidade Social Empresarial e Sustentabilidade do Grupo Orsa, os funcionários requerem atenção especial. “É preciso trabalhar a cultura organizacional e, sobretudo, conscientizar as pessoas da sua parcela de responsabilidade como cidadãos e como empregados. É importante que os funcionários se sintam fazendo parte dos resultados da empresa e, consequentemente, da diminuição do impacto das atividades do negócio no meio ambiente”, ressalta.

No Wal-Mart, as responsabilidades dos funcionários são reforçadas por meio do “Projeto Pessoal para a Sustentabilidade”. O programa incentiva a mudança de atitude em sete temas: compras responsáveis; redução e reciclagem de resíduos, saúde e bem-estar, energia, água, mobilização e voluntariado. O PPS já conta com mais de 32 mil adeptos, que escolheram seu campo de atuação, comprometendo-se a adotar valores sociais e ambientais em sua vida cotidiana.
Para Daniela Di Fiori, vice-presidente de assuntos corporativos e sustentabilidade do Wal-Mart, estimular o desenvolvimento do tema no âmbito do indivíduo é fundamental para que a sustentabilidade seja incorporada efetivamente ao modo de pensar da empresa. “O Projeto Pessoal para a Sustentabilidade é uma das formas trabalhadas para estimular os funcionários a incorporarem a preocupação sócioambiental e com a qualidade de vida. Um dos seus objetivos é mostrar que ações simples podem fazer a diferença”, destaca.
Redes de conhecimento
O ditado “em casa de ferreiro, espeto de pau” não se aplica a IBM, pelo menos no que diz respeito à utilização da tecnologia da informação para criar redes de integração social.  Ciente de que o conhecimento é o principal capital de uma organização, a empresa tem procurado desenvolver ambientes nos quais as pessoas possam registrar e compartilhar suas idéias.
Em um universo de 385 mil funcionários, distribuídos em todo o mundo, existem cerca de 10 mil blogs corporativos. Os veículos tratam desde temas técnicos até tendências, estratégias e generalidades.  “Em uma economia global, largam na frente as organizações que conseguem criar grandes comunidades a fim de agregar todo o conhecimento espalhado. Por isso, procuramos criar ferramentas capazes de integrar as pessoas”, explica Mauro Segura, executivo de comunicação da IBM.
O Innovation Jam é um evento emblemático desta filosofia de colaboração da companhia. Criado em 2001, e realizado uma vez por ano, o fórum virtual era voltado apenas para o público interno. Mas a partir de 2006, passou a integrar familiares dos funcionários, clientes e formadores de opinião sempre em torno da idéia de discutir tendências e oportunidades de negócios.
No Innovation Jam de 2007, a companhia selecionou 10 idéias. Com base nelas, está investindo US$ 100 milhões no desenvolvimento de novos modelos de negócios, entre os quais uma linha de negócios verdes. A proposta consiste na aplicação da experiência da empresa em tecnologia da informação, gerenciamento e otimização de sistemas e ciência dos materiais, em oportunidades ambientais emergentes. A IBM já identificou três áreas de interesse inicial: modelagem hídrica avançada; filtragem hídrica por meio de nanotecnologia e sistemas eficientes de energia solar.
Essa demanda do mercado já é percebida pelos líderes da companhia. Os CEOs concordam que os clientes estão se unindo a organizações socialmente responsáveis e exigindo cada vez mais produtos e serviços com este perfil. Foi o que demonstrou o “Estudo Global com CEOs”, realizado a partir de entrevistas com mais de 1000 executivos, de 40 países.
Segundo a pesquisa, o grupo de CEOs pesquisados planeja aumentar em 25% os investimentos destinados a modelos negócios baseados na responsabilidade social.

Não é a toa que, em 2008, o Innovation Jam teve como tema inovação e sustentabilidade. A plataforma registrou 32 mil comentários postados e mais de 1,5 milhão de visitas. As idéias estão sendo organizadas e orientarão a estratégia da companhia. “O grande desafio é não perder de vista as necessidades das pessoas e voltar-se para aquilo que realmente vai ser útil para o cliente e para a sociedade como um todo. Não é simplesmente a inovação pela inovação”, ressalta Ruth Arada, diretora de cidadania corporativa da IBM.
10 passos para construção de uma cultura de inovação voltada para a sustentabilidade
1. Orientação da atividade de pesquisa e desenvolvimento para o desenvolvimento sustentável;
2. Valorização das pessoas;
3. Formação de profissionais conscientes de sua responsabilidade junto à organização e à sociedade;
4. Estabelecimento de relações de trabalho mais permanentes;
5. Compromisso da alta administração com o tema;
6. Capacidade de antecipar cenários futuros;
7. Agilidade em transformar conhecimento em soluções de mercado;
8. Consciência de sua identidade, competências e limitações.
9. Desenvolvimento de novas tecnologias e modelos de gestão que favoreçam a cooperação;
10.  Criação de uma estrutura organizacional que proporcione a liberdade de expressão, capaz de reconhecer e desenvolver boas idéias.
Elementos-chave para um ambiente favorável à inovação sustentável
-Estímulo a atividades comunitárias;
-Criação de redes de colaboração;
-Flexibilização das estruturas organizacionais;
-Fomento ao debate de idéias e conflitos criativos;
-Sensibilidade ao ambiente externo;
-Tolerância a novas idéias.

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