Especial – Energia para mover o mundo sem destruir o planeta – Parte III

Especial – Energia para mover o mundo sem destruir o planeta – Parte III

O sol aponta a direção
No mercado para energia solar o cenário se repete. Seu desenvolvimento ainda está muito condicionado a estímulos e programas de governo. Essa não é uma exclusividade brasileira. Uma breve análise, por exemplo, da conjuntura global, aponta que o maior mercado para energia fotovoltaica está nos chamados sistemas conectados à rede elétrica. Por meio deles, indústrias, estabelecimentos e residências podem instalar painéis solares e vender o excedente de energia para as concessionárias.
No Brasil, o desenvolvimento desse segmento depende de uma política de subsídios, assim como ocorreu nos países que hoje lideram esse modelo, principalmente Alemanha, Japão e Espanha
Por aqui, a grande oportunidade se concentra nos chamados sistemas isolados, que abrangem as regiões não atendidas pela rede elétrica. Nessa perspectiva, o Programa Luz Para Todos se tornou um grande incentivo para o setor de energia fotovoltaica no País, uma vez que essa fonte passou a ser explorada nas áreas mais remotas, onde a conexão com a rede elétrica seria pouco viável.
“Quem precisa da energia solar? As comunidades que estão muito longe da energia e, normalmente, não têm poder aquisitivo para adquirir um sistema solar. Na área urbana, as pessoas têm condições de instalar painéis solares, mas ainda não contam com incentivos para fazê-lo. Por isso, o suporte do governo é fundamental para o desenvolvimento do mercado para a fotovoltaica”, afirma Sérgio Beninca, diretor comercial da Kyocera Solar, empresa-líder no segmento de energia fotovoltaica.
Por meio de programas federais e estaduais de universalização do acesso à energia, a companhia já instalou cerca de 21.000 sistemas solares. Outro mercado importante para essa alternativa é o de telecomunicações, que conforme determinação do governo, deve instalar pelo menos um telefone público em áreas com mais de 300 pessoas. Nas regiões mais remotas, o segmento também recorre à tecnologia de geração de energia fotovoltaica.
Segundo Beninca, a Kyocera aposta na expansão desses programas, sobretudo do Luz Para Todos, projetando um crescimento de até 50% para o próximo ano, caso essas ações tenham continuidade. Diante da confirmação dessa tendência de crescimento, a companhia de origem japonesa planeja instalar uma fábrica no Brasil e passar a montar localmente os sistemas.
Fóssil não está fora de questão
Na busca por aliar demanda e oferta de energia, as fontes fósseis também podem ser consideradas em uma perspectiva de baixo carbono. Ao menos essa é a aposta feita com o investimento em energias de Captura e Armazenamento de Carbono (do inglês,capture and storage).
Seguindo a trajetória das grandes petrolíferas globais, a Petrobras tem investido nessa tecnologia desde 2007. A companhia possui hoje três projetos na área, dois desenvolvidos sob forma piloto nos reservatórios da Bacia do Recôncavo Baiano, na Bahia. Em um deles, o CO2 é injetado em um aquífero salino profundo e, no outro, em um campo de petróleo, ambos em terra, nos campos de Rio Pojuca e Miranga. O terceiro projeto prevê o aprisionamento de gás natural extraído da Bacia de Campos, no Rio de Janeiro. Além disso, a companhia começa a estudar a possibilidade de realizar um projeto de sequestro geológico no recém-descoberto campo de Tupi, na Bacia de Santos.
Os projetos contam com o suporte do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), que realiza estudos para avaliar e quantificar o potencial de injeção de gás carbônico em reservatórios geológicos das bacias do Recôncavo, Campos, Potiguar, no Rio Grande do Norte e Paraná.
Para assegurar a sustentabilidade de seus negócios, a Petrobras também tem investido fortemente em energias renováveis, particularmente em biocombustíveis. Tanto que, em 2008, criou uma subsidiária para atuar especificamente nesse mercado. O objetivo é chegar a 2013 produzindo 25% do biodiesel e 10% do etanol brasileiros.
O plano de negócios da companhia prevê investimentos de US$ 2,4 bilhões no segmento de produção de biodiesel e etanol para o período de 2009 a 2013. Esse valor faz parte do total de US$ 2,8 bilhões destinados ao negócio de biocombustíveis. Desses recursos, US$ 400 milhões serão investidos em infraestrutura, para construção de alcooldutos, por exemplo. Na área de pesquisa e desenvolvimento, US$ 530 milhões serão destinados à área.
Os investimentos totais em biocombustíveis representam um aumento de 87% em relação ao plano anterior.
O verde da cana e o seu valor em ouro
Uma área em relação à qual todos são unânimes em reconhecer grande potencial é a de biocombustíveis. Segundo o relatório Brasil Sustentável, da Ernst&Young, o mercado para essa alternativa será sensível aos preços do petróleo e deverá se expandir com a permanência desse último acima de US$ 40 por barril. “A inclusão de etanol e demais biocombustíveis na matriz energética é um fator de extrema importância não só do ponto de vista ambiental, mas também de segurança do fornecimento”, destaca o estudo.
A experiência brasileira de desenvolvimento do etanol de cana-de-açúcar e introdução maciça desse combustível em sua matriz energética tem motivado a ONU a eleger o Brasil como um dos maiores mercados para energias renováveis do mundo.
Em seu estudo, Tendências Globais para Investimentos em Energias Sustentáveis, a organização ressalta que, em 2008, 90% dos novos carros brasileiros utilizavam etanol, representando 52% de todo o combustível consumido por veículos leves no País.
Segundo a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), o setor movimenta cerca de US$ 25 bilhões por ano, gerando 850 mil empregos diretos na agricultura e indústria. Em exportações de etanol e cana-de-açúcar são US$ 8 bilhões em receitas.
Cerca de 80% da produção de etanol se destina ao mercado doméstico. De acordo com Eduardo Leão de Sousa, diretor executivo da Unica, ainda há possibilidade de expansão. “Hoje, apenas 30% da frota é constituída de carros flex, por isso ainda há um potencial grande”, destaca Sousa.
Segundo o relatório Brasil Sustentável, as projeções consideram uma
taxa de crescimento de 3,3% ao ano para o mercado de combustíveis veiculares no Brasil no período. Desse total, o volume a ser atendido pelo
etanol seria de 45%, em razão do aumento da frota e dos ganhos de eficiência energética no uso de combustíveis – espera-se que a frota brasileira tenha um
rendimento de 10,4 quilômetros por litro, considerado o mix de combustíveis. Com isso, o crescimento do mercado doméstico de etanol será superior ao da
gasolina: 4,3% contra 2,6%, respectivamente. Estima-se que as exportações de etanol cheguem a 17,4 bilhões de litros em 2030, um crescimento de 8,9% ao ano em relação às exportações de 2005.
Na perspectiva internacional, os dois grandes mercados são o americano e europeu. Nos EUA, o volume de biocombustíveis, em sua maior parte etanol a partir do milho, a ser misturado à gasolina deve chegar a 28 bilhões de litros, em 2012, e a 136 bilhões de litros, em 2022. É isso o que concluiu o Energy Policy Act, de 2005, que regulamenta o setor.
No entanto, o etanol brasileiro ainda se depara com medidas tomadas pelos EUA para proteger sua indústria, como a tarifa de 64 centavos de dólar por galão. “A grande questão é o espaço que eles vão nos dar porque hoje, logicamente, têm interesse em produzir lá o etanol. Mas o etanol de milho apresenta restrições tanto em relação ao uso, porque boa parte dele destina-se à produção de ração e alimentação humana, quanto à própria qualidade do ponto de vista ambiental e de eficiência”, explica Sousa.
Com a Diretiva 2003/30, a União Européia também avançou no uso do etanol no período de 2003 a 2005. A regulação determina que os biocombustíveis deverão substituir, em conteúdo energético, 5,7% dos combustíveis fósseis até o fim de 2010.
Segundo o estudo Brasil Sustentável, nessas duas regiões, os subsídios e os impostos de importação serão gradualmente retirados para garantir a redução de custo dos biocombustíveis.
Na análise de Sousa, outro desafio é que mais países passem a produzir o etanol, contribuindo com a comoditização do produto. “Isso confere maior liquidez para o mercado, que passa a apostar no longo prazo em investimentos de infraestrutura”, ressalta.
O levantamento da Ernst&Young aponta ainda o ritmo de entrada da produção do etanol de celulose em escala comercial como um dos elementos cruciais na formação da oferta de biocombustíveis.  “Avanços tecnológicos que permitam a produção competitiva de etanol de celulose deverão alterar substancialmente a situação desse combustível. O controle da tecnologia será o aspecto central do processo de produção, pois ampliará a disponibilidade de matéria-prima e o volume de etanol produzido”, ressalta o estudo.
O setor sucroalcooleiro brasileiro também já vê como oportunidade o avanço da tecnologia de etanol celulósico. “O mundo tem poucas opções para produzir etanol de modo sustentável sem ser o Brasil. Outros países fatalmente vão ter que recorrer à produção de etanol por celulose. Mas isso não significa necessariamente que vamos perder competitividade. Quando essa tecnologia for comercialmente viável, teremos a matéria-prima na porta da nossa fábrica, que é o bagaço e a palha obtidos a partir da mecanização”, afirma Sousa.
Outro grande potencial a ser ainda explorado é a área de co-geração para produção de energia elétrica a partir do bagaço da cana. O processo permitiu não só que as usinas se tornassem autossuficientes em energia, como também vendessem seus excedentes para as concessionárias.
“Essa tecnologia apresenta uma série de vantagens para o usineiro, que passa a ter um produto a mais no seu portfólio. Isso dilui custos fixos ao mesmo tempo em que agrega receita”, afirma Sousa, da UNICA. Segundo ele, a co-geração também oferece a possibilidade de gerar créditos de carbono (hoje há 30 projetos dessa modalidade registrados como mecanismos de desenvolvimento limpo pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, e outros 30 em fase de avaliação).
Para Sousa, o investimento em co-geração contribui para diversificar a matriz energética e evitar riscos de abastecimento. “Pode-se gerar a energia elétrica a partir da biomassa da cana durante o período seco, exatamente quando os reservatórios de água para geração de energia elétrica atingem os seus níveis mais baixos. Com isso, além da sinergia e complementariedade de oferta distribuída ao longo do ano, aumenta-se substancialmente a segurança do sistema”, afirma.
Segundo o executivo, a co-geração apresenta um potencial de suprir até 15% da demanda nacional por energia. No entanto, atende hoje apenas 3% do consumo no País. “O governo tem um papel importante ao desenvolver um ambiente regulatório que permita a comercialização com outros fornecedores de energia. Outra questão é o planejamento para minimizar custos e maximizar a eficiência da distribuição. Além disso, os próprios leilões de energia precisam continuar a fim de garantir a aquisição para os próximos anos. E por último, vem o incentivo via BNDES para desenvolvimento dessa tecnologia, que requer investimentos elevados”, ressalta.

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