Especial – Energia para mover o mundo sem destruir o planeta – Parte II

Especial – Energia para mover o mundo sem destruir o planeta – Parte II

Brasil potência, na economia de baixo carbono

O relatório Tendências Globais de Investimento em Energias Sustentáveis destaca o Brasil como o maior mercado mundial de energias renováveis. Por suas condições favoráveis, que permitem o desenvolvimento de fontes de energia diversas, e matriz energética limpa, baseada em hidreletricidade, a posição de liderança do País na perspectiva de uma economia de baixo carbono é, de fato, algo razoável de se projetar. No entanto, as políticas energéticas não têm se mostrado eficientes para atrair investimentos para o setor, de modo a explorar todo o seu potencial.
“Perdemos grandes oportunidades nos anos em que a economia mundial cresceu muito. Tínhamos que ter atraído muito mais investimentos em energia, considerando o fato de que a natureza nos premiou muito em relação a esse quesito. O grande problema é que nem o governo atual nem o anterior conseguiram acoplar essa benesse a uma política capaz de gerar grandes investimentos”, afirma Pires.
A decisão que causou maior alarde – ressalta Pires– foi o anúncio do plano decenal de energia, que prevê a criação de 82 usinastermelétricas até 2017. Além de causar mais impactos ao meio ambiente, as térmicas também podem resultar em aumentos no preço da energia, uma vez que estão sujeitas às oscilações do preço do petróleo. “Os resultados de leilões de energia elétrica, dos quais as térmicas saíram vencedoras, mostram um Brasil andando para trás. Enquanto o mundo inteiro está querendo mudar a matriz para fontes mais limpas e renováveis, privilegiamos fontes fósseis”, critica Pires.
Por todas essas razões, o planejar — um ponto crítico em qualquer segmento – tornou-se tarefa urgente na gestão da energia. “O paradigma da discussão está muito pobre. No setor elétrico, o governo começou a pensar que está tudo bem, desde que não haja apagão. Aí o governo se apavora e compra um monte de porcaria. A ausência de planejamento, de políticas adequadas e a incapacidade de gestão no núcleo central do governo é que ocasionou essa situação, danificando o cenário energético e ambiental brasileiro”, afirma Ildo Sauer, pesquisador do Instituto de Eletrotécnica da Universidade de São Paulo (USP).
Para Sauer, faltou competência do governo para, nos anos 2003 e 2004, organizar o portfólio de projetos, e realizar os estudos ambientais e de passivo social para obter as licenças em um ritmo mais veloz. “Abriu-se a porteira para uma das coisas mais horrendas da história do Brasil, uma Itaipu de poluição que é contratação de quase 14.000 megawatts de usinas a óleo e a carvão. Isto é produto da falta de política e de gestão adequadas na área de energia no Brasil. Não é problema da área ambiental”, afirma.
A falta de diretrizes claras e políticas de longo-prazo constitui-se como a principal barreira para novos investimentos em energia no Brasil. “A política brasileira de energia é muito ciclotímica e não dá sinais de longo prazo nem para o investidor, nem para o consumidor. Quando se aumenta o preço do petróleo se arruma instrumentos para incentivar o consumo, por exemplo, do etanol. Se o preço do petróleo cai, o etanol é esquecido para voltar a consumir gasolina. Na hora que tem gás sobrando, o governo elabora ferramentas para viabilizar um grande consumo desse insumo e assim por diante”, afirma Pires.
Marina Grossi, diretora do Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), reforça ainda a importância de um projeto de país que direcione todos os esforços em uma mesma direção. “O mesmo governo que consegue fazer um plano de combate às mudanças climáticas, aprova um plano decenal de energia, que prioriza térmicas. Falta planejamento e políticas consistentes para impulsionar novos projetos”, destaca.
Papel indutor do governo

De acordo com Sauer, o único agente que tem o controle e os mecanismos para alterar qualitativamente as trajetórias do uso e produção de energia é o governo, em coordenação, evidentemente, com o mercado. “As energias renováveis precisam ter escala e, para que isso aconteça, são necessárias políticas públicas. Tomando o exemplo da energia eólica, se houvesse um aumento da escala, como ocorreu em relação ao álcool, o preço unitário cairia, com ganho de produtividade. Sendo assim, essa fonte poderia ter um espaço muito maior no Brasil”, afirma.
As parcerias público-privadas também se mostram efetivas no desenvolvimento de fontes renováveis. Mas Leonardo Dutra, gerente de sustentabilidade da Ernst&Young, acha que será necessário criar mecanismos de incentivo. “O Brasil precisa de energia, para gerar mais negócios e empregos. A iniciativa privada tem um papel importante, mas depende do suporte do governo no sentido de criar incentivos fiscais. Acredito que vai haver alguma diferenciação para o investimento em energias renováveis”, reforça.
O estudo Tendências Globais de Investimento em Energias Sustentáveis, da ONU comprova essa tese. Segundo o documento, os mecanismos de mercado e incentivos desempenharão um papel-chave tanto em países desenvolvidos, quanto em desenvolvimento, incluindo a revisão de cerca de US$ 200 bilhões de subsídios destinados, anualmente, a combustíveis fósseis.
Ao sabor e a favor do vento
No Brasil, as iniciativas de fomento do governo brasileiro às energias renováveis continuam bastante tímidas. Tomando novamente o exemplo da energia eólica, apesar de todo o potencial de geração dessa fonte e da vantagem de complementaridade que oferece às usinas hidrelétricas, foram instalados apenas 359 MW, dos 1,4GW de capacidade dessa alternativa, contratados pelo Programa de Incentivo a Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) O programa foi estabelecido em 2002 para encorajar projetos de energia eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas. E um de seus objetivos era estimular a Impsa, empresa global de soluções de geração de energia elétrica, a iniciar naquele ano suas operações no setor de eólica no Brasil. “Com o Proinfa, o governo gerou confiança para as empresas viabilizarem seus investimentos no longo prazo”, diz Juan Carlos Fernández, vice-presidente da Impsa.
Para o executivo, o diferencial dos ventos brasileiros oferecem o dobro da qualidade da média mundial. Somando as suas operações de energia hidroelétrica e eólica no Brasil, a Impsa planeja faturar aproximadamente R$ 500 milhões em 2009. Na mesma trajetória de expansão, empresa estima um faturamento de R$ 700 milhões em 2010.
De origem argentina, a companhia está realizando um programa tecnológico no Brasil, por meio do qual investirá R$ 50 milhões no desenvolvimento de um aerogerador de 4 MW para usinas eólicas on-shoreoff-shore. “O projeto é parte de uma série de testes e pesquisas que estamos conduzindo para adaptar nossos equipamentos às regiões tropicais”, destaca Fernández.
O entusiasmo com que o setor privado respondeu ao primeiro leilão de energia eólica, a ser realizado por meio do Proinfa em 25 de novembro, atesta o potencial para investimentos na área.  Foram cadastrados 441 projetos, com 13.341 MW de potência, quase 32 vezes a capacidade eólica atual do país, estimada em 417,5 MW. O montante cobriria 12% da matriz elétrica brasileira, superando em quase três vezes a capacidade instalada prevista (4.682 MW) para a fonte em 2030.
Diante da grande procura, o setor espera que a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) amplie a participação da energia eólica na revisão do Plano Nacional de Energia (PNE), com horizonte até 2035, previsto para ser divulgado no próximo ano.
A Impsa não tem poupado esforços para abocanhar esse novo mercado em ascensão, confirmando a tendência de predominância das empresas de capital estrangeiro na área. Segundo Fernández, a proximidade da realização do leilão, já trouxe um aumento da demanda da Impsa, que deseja ampliar a sua capacidade de geração dos atuais 600 MW para 1000 MW. Ele crê, no entanto, ser importante contar com respaldo do governo. “A discussão de políticas equitativas e favoráveis à competição deve ser mantida. O setor de energias renováveis é responsável pela geração de muitos empregos, além de apresentar grande potencial de crescimento. Por esses motivos precisa ser defendido”, argumenta.

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