Entrevistas – Diga-me quem financias – Parte 2

20 de março de 2008

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IS – Como funciona o Banktrack?
GP – O Banktrack foi criado como rede, ou seja, formado por um secretariado e com diversas ONGs membros que participam das atividades. Ele lança posicionamentos em diversos temas sobre a visão da sociedade civil sobre o setor financeiro e, por outro lado, tenta medir o quanto cada banco tem avançado nessas questões.
IS – Todos os membros do Banktrack têm o mesmo papel?
GP – Dentro do núcleo do Banktrack as ONGs têm atuações diferentes. Temos grupos muito fortes com ações específicas, como a RAN nos Estados Unidos ou a Amigos da Terra Holanda, e temos grupos que lidam mais com engajamento, olham para as políticas, ou seja, é mais advocacy, e não campanhas para bater de frente. Notamos que os grupos que já começaram na linha de confronto têm menos interação com os bancos do que nós, que sentamos à mesa e discutimos políticas – o que não significa que não façamos pressão maior às vezes. Eu sou muito bem recebido e os bancos abrem as portas para conversar.
IS – Qual é situação do Eco-Finanças hoje?
GP – Agora começamos a desenvolver policy papers junto ao Banktrack e caminhamos para manter o setor financeiro accountable aos compromissos que ele assumiu. Estamos na fase de ver a explosão do tema sustentabilidade na mídia como posicionamento de marketing. Isso é muito preocupante, porque existe certo reducionismo do desafio que é a sustentabilidade no setor financeiro, uma séria disputa de quem se apropria do assunto como estratégia de marketing e comunicação. Só que isso ainda é feito sobre uma base muito fraca na maioria dos bancos.
IS – Fale um pouco sobre como funcionou a pesquisa Mind the gap.
GP – O primeiro ponto importante da pesquisa é que parte da premissa da responsabilidade socioambiental no setor financeiro ligada ao seu portifólio e não à sua ação interna. O argumento dos bancos é que possuem muitos compromissos e que isso é um diferencial competitivo, mas, na prática, não formalizam isso nas estruturas de gestão. O setor acordou para essa questão e começou a se engajar com atividades e iniciativas setoriais, como os Princípios do Equador. São políticas coletivas super simpáticas, todas voluntárias, mas ainda sim é uma aspiração. Não podemos negar que são importantes, porque geram um movimento inicial, incentivam discussões e o compartilhamento de experiências, mas usam a participação dessas atividades “aspiracionais” como prova cabal de que estão fazendo muita coisa. Só que não é bem assim.
IS – O que significa cada ponto atribuído aos bancos?

GP – Zero significa não ter política ou que a política não é pública. Um, a política é vaga ou aspiracional. Dois, existem alguns elementos das melhores práticas, mas não é muito consistente. Três, há vários elementos das melhores práticas e de certa forma são consistentes, só falta um ajuste aqui e outro ali. E quatro, está em completa conformidade com as práticas internacionais.
IS – E a parte operacional e metodológica da pesquisa, como foi estruturada?
GP – Primeiro, definimos   os sete setores e temas e, depois, os quatro aspectos de transparência e accountability. O Banktrack estabelece, de certa forma, o posicionamento político do que seria a sustentabilidade em cada um dos setores e temas definidos, e isso demandou o consenso de todas as organizações membros. Em paralelo, os bancos foram solicitados em relação a suas políticas. O que já foi aprovado ou não, o que é público, entre outras coisas. Depois que fechamos a pontuação em todos os setores, dois consultores da Profundo, sediada na Holanda, pontuaram cada banco. Os resultados foram enviados para todas as instituições analisadas com a explicação detalhada das notas. Em seguida, os bancos tiveram a oportunidade de responder. Dos 45 que participaram da pesquisa, cerca de 35 retornaram. Poucos conseguiram mudar sua pontuação.
IS – Neste cenário, que resultados a pesquisa trouxe?
GP – O interessante do relatório é que pontua todas as políticas coletivas para avaliar o que leva, na prática, à sustentabilidade, e mostra que os bancos estão pontuando muito baixo em relação ao que são consideradas as melhores práticas internacionais. Ao levar em conta que já existem referências no mercado, podemos concluir que adotar as práticas não é um bicho de sete cabeças. Na área de barragens e hidrelétricas, por exemplo, é possível submeter-se aos princípios da Comissão Mundial de Barragens das Nações Unidas. Em silvicultura, pode-se usar o selo do Forest Stewardship Council (FSC) em todos os financiamentos concedidos. Outro ponto relevante é que, às vezes, os bancos até pontuam bem, mas não divulgam a política e, por isso, ficam com zero.
IS – Como deve ser feita a divulgação? No que implica esse compromisso público?

GP – Se não há divulgação, significa que o banco não estabeleceu o compromisso, pois não tem como a sociedade ter escrutínio. Às vezes eles não comunicam por conta de questões estratégicas. Para tornar pública, é necessário colocar no site, no relatório de sustentabilidade ou em algum veículo de comunicação externa. No caso do setor militar ou comércio de armas, por exemplo, os bancos diziam não financiar, mas isso não estava escrito, então não há compromisso público. Se houvesse uma mensagem dizendo que eles não financiam esse tipo de projeto, teriam quatro pontos. Como não tem, ficam com zero. Isso aconteceu em setores em que existe “o bom” e “o mal”, por exemplo, em mudanças climáticas, o banco pode relatar que tem várias linhas de financiamento para energias renováveis, mas tem muito mais dinheiro indo para outras fontes não-renováveis. A política de financiar o limpo não impede a instituição de financiar o sujo.

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