Entrevistas – A urgente tarefa de redimir o Planeta (parte 2)

Entrevistas – A urgente tarefa de redimir o Planeta (parte 2)

IS – Quais são as chances do etanol vingar no Brasil como importante fonte de energia?
LT – Durante um tempo, fui editor de ciências da Reuters e assisti aos experimentos brasileiros. Em princípio, o etanol pareceu uma solução brilhante. Então o preço do gás diminuiu, e ele passou a parecer estúpido. O preço do gás aumentou, e voltou a ser brilhante novamente. O Brasil está preso a isso. Tornou-se um líder mundial não só fazendo, mas na ciência do processo. Tem muito a ensinar ao mundo. Nos EUA, o governo está se articulando muito rápido para produzir milho para etanol. Não está claro se essa é a alternativa mais eficiente. Parece que outras culturas, nesse caso, podem ser melhores. E também pode ser um caso de competição entre comida e combustível. Talvez a produção de etanol aumente o preço da comida em todo o mundo, afetando os mais pobres. Portanto, acho que é algo para ser feito com muito cuidado e base científica. Recentemente, em um debate de rádio, um especialista disse: “O etanol é maravilhoso, tem o poder de eliminar o carbono de 200 carros por dia”. E a outra dizia: “O etanol produzido nos EUA é tão ineficiente que gastamos mais energia  produzindo do que a obtida no produto final”. Esse tipo impasse precisa ser resolvido.
IS – Mas o etanol, em sua opinião, é uma solução viável  para o Brasil?
LT – Eu achei que era. Acredito que será mais e mais usado no Brasil. O país desenvolveu uma tecnologia muito boa para usar toda a cana-de-açúcar de maneira eficiente. Isso mostra ao mundo um caminho de avanço. De qualquer forma, os EUA estão colocando diversas barreiras ao etanol brasileiro, mas seria muito mais simples importá-lo para fazer a experiência.
IS – Quais são melhores alternativas ao Petróleo, além do etanol?
LT – São várias as opções. Todo fato novo na produção de automóveis nos interessa na WBC. O fato de a Toyota, pela primeira vez, vender mais carros que a General Motors nos Estados Unidos, é um fenômeno importante.  O primeiro passo são os carros híbridos. O próximo serão os movidos a hidrogênio, ainda que a produção desse combustível ainda se mostre problemática. Acredito que a nanotecnologia terá eventualmente grande valia. É fundamental  usar todas as energias renováveis. Por outro lado, estou mudando minha opinião em relação a, por exemplo, a energia nuclear. Acho que ela terá um papel maior do que pensei há alguns anos. Porque acredito que agora pode ser produzida de modo seguro. E há motivos de sobra para experimentar essa alternativa. Qualquer que seja a nova forma de energia, é preciso tratar de políticas que encorajem as empresas a investir nelas. Não temos nada disso agora. Um dia teremos que capturar carbono e armazená-lo. Mas é uma alternativa cara! E não existe nenhuma razão de negócios para uma empresa colocar recursos. Algumas já estão experimentando. Mas, para começar, os governos devem estabelecer regulamentações claras. As empresas com as quais trabalho têm objetivos urgentes, mas existem outras que não se engajaram ainda. A batalha ainda está sendo travada.
IS – O senhor acredita que, nesse tipo de discussão,  as empresas estão à frente dos governos?
LT –Sim, há um número de empresas líderes que estão muito à frente dos governos. Mas também existem aquelas que não estão fazendo nada. Então é difícil generalizar, porque trabalho com empresas muito avançadas nessa questão.
IS – Existem diferenças entre as visões políticas  de esquerda e de direita em relação ao aquecimento global e à sustentabilidade?
LT – A antiga divisão entre esquerdistas e conservadores está se quebrando. Brinco frequentemente que eu seria um conservador se os conservadores conservassem qualquer coisa. Mas, na realidade, muitas vezes “conservador” significa apenas reacionário, ou um sinônimo de “não faço nada”. O problema é a esquerda decidir beneficiar somente o trabalhador. E, do outro lado, a direita tomar medidas que apenas prejudiquem os trabalhadores, levando-os a perder emprego e trabalho. Para mim, o certo a se fazer em energia e clima é não ser conservador, tampouco esquerdista, mas focar-se no planeta e nas pessoas como um todo.
IS – O debate sobre sustentabilidade nunca esteve não forte, pelo menos no Brasil. Porém, algumas das mudanças necessárias para a efetivação desse mundo são difíceis de serem concretizadas. Exigem mudanças radicais. O que as empresas devem mudar fundamentalmente?
LT – Mudança é sempre difícil, especialmente em uma grande empresa. Mas em 1992 inventamos a palavra ecoeficiência, que é fazer mais com menos. Tem sido interessante observar como algumas das empresas líderes levaram a sério esse conceito e começaram a produzir usando menos energia e outros recursos e materiais. Hoje costumo ouvir com mais freqüência: “Por que não produzimos menos produtos e faturamos mais dinheiro?” Isso não parece fazer sentido. Mas o que fizeram foi, em vez de criar bens materiais, vender, por exemplo, segurança para grandes empresas. É um programa que não contém nada além de conhecimento. Temos feito mais empresas pensarem sobre isso. Precisamos promover mais este tipo de revolução. O que elas têm que mudar, afinal? As idéias. E questionar: “Como podemos fugir do velho paraíso de produzir muitas coisas e vendê-las, para vender serviços e conhecimento, de forma a não consumir tão intensamente os recursos?”. Essa é a mudança necessária.
IS – Em relação á preocupação com a sustentabilidade, é possível apontar as diferenças entre os países que compõem os chamados BRICs?
LT – Não quero falar sobre o Brasil, porque não conheço profundamente a realidade do país. A Rússia, no meu modo de ver, vive uma situação muito caótica. E A Índia, decididamente, não está preocupada com as mudanças climáticas, porque, na condição de representante da indústria de serviços, não se vê como grande vilã. A China joga um papel importante porque suas escolhas influenciam muito o restante do mundo. Tivemos recentemente uma reunião na China, em que oficiais daquele país disseram: “Sabemos que temos que controlar nossas emissões de carbono, a poluição e o uso da água”. Embora tanto o governo quanto as empresas sejam sensíveis ao assunto, eles estão atrasando o lançamento de sua estratégia em relação ao aquecimento global porque não entram em consenso.  Eles simplesmente ainda não sabem o que fazer, porque também precisam tomar conta do seu contingente de pobres.
IS – Empresas e governos de todo o mundo estão apostando que o Brasil pode fazer diferença em termos de desenvolvimento, economia e sustentabilidade, ainda que não esteja crescendo economicamente tanto quanto  a China ou a Índia. O senhor concorda?

LT – O resto do mundo olha para o Brasil como um país que trocou uma posição ingênua de querer poluição – era esse o discurso de 1972 – para outra de respeito ao planeta. Desde 1992, tornou-se muito preocupado e atento a essas questões. Sendo um país grande com tantos bons cientistas, vocês podem, na verdade, descobrir como produzir etanol de uma maneira eficiente, descobrir como cultivar grãos de soja em um solo muito pobre. Então as pessoas enxergam o Brasil como uma nação que resolve problemas. Um país que coloca na cabeça que vai solucionar a questão de ser o quarto maior emissor de gases do efeito estufa. Assim, pode realmente transmitir o exemplo para os outros membros dos BRICs. Olhamos para o Brasil com a esperança de que seja um modelo para as economias emergentes, ainda que ele não seja mais uma.
IS – Quais são as principais discussões nas quais  o WBCSD está envolvido atualmente?
LT – Vivemos um momento muito empolgante, porque decidimos passar para uma nova forma de advocacy. Antes, passávamos muito tempo conversando e debatendo questões.  Mas hoje em dia estamos tentando soluções de reivindicação. Então produzimos uma política para energia e clima. Procuramos conectar a abordagem de Kyoto com a forma com que as políticas energéticas são feitas pelos governos. Com essa ligação, podemos, por exemplo, ter um setor da indústria que terá suas próprias metas de carbono. Os governos estão interessados no fato de que grandes empresas de todo mundo conseguem entrar em acordo, enquanto os governos não. Nosso trabalho em desenvolvimento, em paralelo, é simplesmente fazer com que países e empresas se dêem conta de que seu futuro está nas economias emergentes do mundo em desenvolvimento. Estando nesses lugares, eles serão uma força para o bem, e não para o mal. No aspecto dos ecossistemas, estamos trabalhando com outras organizações para criar meios de proteger o meio ambiente, como o Forest Stewardship Council (FSC), que garante a não-agressão dos sistemas. Precisamos de mais mecanismos como esse. Esse trabalho está apenas começando, mas é empolgante. Além disso, também temos o foco na discussão do papel dos negócios na sociedade. Até onde podemos ir? Quando termina nossa ação e começa a do governo? O que as empresas podem fazer sozinhas e do que elas dependem? Por fim, em energia e clima, nosso limite é demandar a mudança de políticas.

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