Entrevistas – Diga-me quem financias – Parte 3

Entrevistas – Diga-me quem financias – Parte 3

IS – E qual é a justificativa dos bancos?
GP – Existe uma desculpa recorrente, o discurso está muito afinado entre eles. A justificativa é que se não fizerem isso, os bancos chineses o farão. Estes, por sua vez, têm pontuação zero em quase tudo. Só que quase todo banco chinês tem alguma parte de acionistas americanos e europeus. Como eles, acionistas, não fazem pressão? Ao não financiar um projeto sujo, de forma geral, diminui-se o volume de capital para esse tipo de iniciativa, e assim o custo de capital pode aumentar.
IS – Qual foi a reação dos bancos frente aos resultados da pesquisa?

GP –
Os bancos já estão atentos. Porém, vemos hoje a luta para comunicar ações sem ter feito o dever de casa adequadamente – ou comunicar além do que se fez. Isso está criando para os bancos um passivo de reputação. E o relatório é uma forma de materializar esse passivo. O que se espera é que, a partir da pesquisa, eles tentem corrigir essa atitude.
IS – A visibilidade dos resultados foi diferente em cada país?
GP – Em outros países a visibilidade é um pouco maior, porque esses temas estão na agenda há mais tempo e as ações são mais impactantes na mídia. Aqui, a discussão ainda está muito intelectualizada, limitada aos formadores de opinião; então o impacto é menor. Por outro lado, ainda é um começo. Começamos a dar um empurrão e os bancos estão preocupados com os passivos de reputação que criaram.
IS – Também existe essa distância entre discurso e ação nos bancos brasileiros?

GP –
Existe, é claro, uma diferença em como cada banco brasileiro está comunicando isso. Vemos algumas afirmações absolutas  e vazias que confundem o público. Mas há outras que reconhecem a sustentabilidade como um processo e convocam: “Estamos fazendo, venha com a gente, nos ajude”. Isso é mais  responsável e honesto.
IS – Quais itens figuraram como pior e melhor desempenho dos bancos?

GP –
A parte de taxação foi o pior desempenho, que representa a forma como os bancos trabalham com os clientes a questão dos paraísos fiscais, por exemplo. Esperamos que isso aponte um caminho, porque a maioria das notas foi zero. Em geral, as pontuações mais altas foram as que os Princípios do Equador davam pontos. Além disso, são temas um pouco mais antigos e discutidos.
IS – Como se saíram os bancos brasileiros?

GP –
Os bancos brasileiros ficaram no meio do caminho. Os piores foram os  asiáticos, que pontuaram praticamente tudo zero; alguns um, dois pontos; e poucos ganhavam pontos apenas por conta de políticas coletivas, como os Princípios do Equador. O Bradesco e o Itaú ficaram iguais porque só tinham políticas coletivas, por exemplo. O Banco do Brasil ficou um pouco à frente dos outros dois porque, ainda que as políticas fossem vagas e aspiracionais, destacavam um pouco mais de direitos humanos e foram um pouco além.
IS – Como avaliar sob os mesmos critérios bancos inseridos em realidades tão distintas?

GP –
Não quisemos fazer uma soma dos resultados dos diversos setores, porque ficaria distorcido. De forma geral, os grupos internacionais têm políticas para todo o grupo. O ABN foi considerado como grupo, o Santander também. Vemos alguns bancos se sobressaindo em algumas áreas, como os belgas em relação aos direitos humanos, mas é porque há um histórico de luta  no país nessa questão. Como principal mote de advocacy na Bélgica está na questão de direitos humanos e na indústria bélica, então há muito tempo existe pressão sobre o setor financeiro e os bancos já subiram nesses conceitos. É interessante perceber que, em cada país, podemos usar o relatório de uma maneira, pois em cada um a relevância é diferente.
IS – No Brasil, as notas ambientais foram fraquíssimas…

GP –
No Brasil, trabalharemos muito com questões sobre agricultura, biodiversidade, florestas e direitos do trabalho, que são temas bastante presentes.
IS – Por que não aplicar o mesmo arcabouço metodológico a todos os bancos no Brasil?
GP- Queremos fazer isso aqui e já sinalizamos para alguns bancos. Imaginamos que alguns deles vão ter pontos, de início, muito baixos, mas pelo menos é interessante para os maiores, que já fazem alguma coisa. Na versão brasileira, podemos pensar em mais setores e temas, além dos existentes. Ficou de fora, por exemplo, a siderurgia e a metalurgia, que têm fortíssimo impacto e papel importante no Brasil.
IS – Esse tipo de pesquisa pode gerar competitividade?

GP –
Sim, inclusive nossa intenção é  deixar o conteúdo do relatório online e não esperar dois anos para fazer um novo, até para estimular a competição e a rapidez de mudanças. Quando um banco transformar uma de suas políticas, já alteramos no site imediatamente. É uma competição saudável, uma agenda positiva. Nossa intenção é trabalhar de forma setorial, convocar todos eles a discussão.
IS – Qual é o próximo desafio para melhorar o desempenho dos bancos?

GP –
Os bancos estão interessados em discutir. O desafio maior é fazer com que percebam – e sigam – os melhores exemplos. Pretendemos estimular essa evolução tanto de forma positiva quanto ao mostrar – caso estejam com um discurso em que se vangloriam mas, na prática, o relatório revelar que estão mal –, a inconsistência da teoria e da ação. Daremos preferência ao engajamento a uma agenda positiva, mas estamos dispostos a cutucar de forma séria se essa questão da comunicação continuar da maneira que está.

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