A evolução do conceito – parte 2

23 de março de 2010

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Responsabilidade social: muito mais do que filantropia
Até a metade dos anos 1990, eram exceções as empresas que admitiam ter compromissos e responsabilidades para com o desenvolvimento de comunidades. A maioria se orientava pela máxima, preconizada pelo economista norte-americano Milton Friedman, de que a única responsabilidade de uma empresa deve ser a maximização dos lucros para os acionistas.
Temas como o combate ao trabalho infantil ou o enfrentamento à corrupção ocupavam espaço marginal na agenda corporativa. O mesmo se dava com questões como respeito a direitos humanos, diversidade, governança, ética e transparência. Mas essa situação mudou. E mudou rapidamente. Para tanto, contribuíram escândalos, com forte repercussão pública, como o da exploração de trabalho infantil escravo de crianças por parte da Nike (1998), a manipulação fraudulenta de balanços financeiros feita por WorldCom (2000), Enron (2001) e Parmalat (2003) e as constantes denúncias de trabalho em situação degradante nas lavouras de cana do País.
Organizações como a BSR, no mundo e o Instituto Ethos, no Brasil foram decisivas na proposição de novas maneiras de pensar e fazer negócios, mais respeitosas, mais éticas e mais sensíveis às pessoas e ao meio ambiente. Por causa do ativismo de seus representantes e da boa acolhida por parte da sociedade, um terreno antes estéril transformou-se em campo fértil para as idéias da sustentabilidade.
Na segunda metade dos anos 1990, convencer as companhias sobre a importância da responsabilidade social empresarial era uma tarefa desafiadora. Os que resistiam à aplicação do conceito o faziam por considerá-lo divergente da lógica do lucro. No discurso, havia boa aceitação. Na prática, pouca mudança. Segundo Oded Grajew, um dos fundadores e primeiro presidente do Instituto Ethos, a reversão desse quadro só foi possível por causa da mobilização de públicos que ele classifica como “indutores” – acadêmicos, consumidores, comunicadores, sindicatos e organizações não-governamentais – lideranças capazes de puxar um movimento de revisão de valores e práticas no modo de conduzir negócios.

“Tivemos que convocar a imprensa e explicar do que se tratava, porque ninguém entendia o que estávamos falando”, lembra Grajew. “No Brasil de dez anos atrás, só se admitia o envolvimento de empresas na área social como ação filantrópica, para mero financiamento de projetos sociais”, relembra.
O conceito–como se sabe –avançou. E as empresas evoluíram. Hoje, o Instituto Ethos soma 1.332 associados – organizações de diferentes setores e portes – que empregam cerca de 2 milhões de pessoas e têm faturamento anual correspondente a 35% do PIB brasileiro. Em comum, elas compartilham o interesse de estabelecer padrões éticos de relacionamento com funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, acionistas, poder público e meio ambiente.
Na avaliação de especialistas, uma das mais importantes contribuições do Ethos para o avanço da responsabilidade social empresarial no Brasil foi a criação dos chamados Indicadores Ethos.
Elaborados na forma de desafios, distribuídos didaticamente em sete vetores, ele foram muito úteis como instrumento de planejamento e ferramenta educativa de sensibilização. E ainda hoje constituem referência básica para empresas, de todos os portes, que desejam se iniciar no assunto. “Uma empresa que preenche os mais de 600 indicadores acaba compreendendo o que é responsabilidade social empresarial e introduzindo o conceito em sua gestão”, acredita Grajew.
Dez anos depois, o Instituto Ethos tornou-se uma referência internacional. Seu exemplo inspira movimentos semelhantes em outros países. E o Brasil aparece sempre como protagonista do tema. “Nesse campo, nossos líderes vêm exercendo influência no resto do mundo. Somos considerados um país que caminha velozmente nessa direção, embora enfrentemos tantas desigualdades de distribuição de renda, corrupção endêmica, e um certo descaso em relação ao meio ambiente. Existe no Brasil facilidade para incorporar novas visões e modelos, de forma muito intensa, embora nem sempre aprofundada”, pontua o especialista Homero Santos.
Hoje, cresce o consenso de que as empresas que não incorporarem à sua gestão princípios de responsabilidade social perderão mercados e consumidores. Serão, portanto, menos competitivas. O estudo Competitividade Responsável, realizado pela consultoria inglesa AccountAbility , desde 2003, com 108 países, aponta uma evidente correlação entre responsabilidade e competitividade. Não por acaso, as nações mais desenvolvidas são também as que se mostraram mais avançadas na adoção de práticas empresariais responsáveis, as que dispõem das melhores políticas públicas relacionadas ao tema, as que têm governos mais vigilantes e consumidores mais conscientes. Suécia, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Reino Unido ocupam os primeiros lugares no ranking da competitividade responsável. O Brasil está na posição de número 56. Tem muito a avançar.
“O objetivo do relatório não é identificar vencedores ou perdedores, mas encorajar todos os países a elaborarem estratégias para promover a competitividade responsável. Todos serão beneficiados à medida que adotarem essa prática”, ressalta Alex MacGillivray, diretor de programas da Accountabilitty.
A onda da sustentabilidade
Há pensadores, como Robert Dunn, um dos fundadores da BSR, que consideram equivalentes os conceitos de responsabilidade social e sustentabilidade. Há os que os vêem como originários de uma mesma idéia (a de que os negócios devem criar valor para comunidades e meio ambiente), os que os tratam como noções sucedâneas e complementares (destacando a ênfase social em um e a ambiental em outro), e ainda os que, como Andrew Savitz, autor de Empresa Sustentável, enxergam na sustentabilidade uma lógica mais afinada com a dos negócios, na medida em que prega a geração de valor mediante a economia de recursos, o engajamento das cadeias produtivas e o desenvolvimento de produtos socioambientalmente responsáveis. Esse aspecto mais pragmático — segundo Savitz — explica por que o termo se popularizou entre empresas nos últimos dois anos.
Qualquer que seja a linha de pensamento, no entanto, em um ponto todas convergem:  o triple bottom line (equilíbrio entre os fatores econômicos, ambientais e sociais), idéia-chave no conceito de sustentabilidade aplicada aos negócios, deve ser a medida de sucesso empresarial nas primeiras décadas deste século.
A incorporação da sustentabilidade à estratégia do negócio tem resultado em benefícios concretos para as empresas. A redução de custos decorrente da diminuição de desperdícios e economia de insumos, a maior atração e retenção de talentos, o aumento da produtividade, a facilidade de financiamento e a valorização de ativos são alguns deles (veja mais no box benefícios da sustentabilidade).
Quantos mais sustentáveis, mais as companhias tendem a ser percebidas como sólidas e perenes. Quanto mais perenes, mais interessantes elas se apresentam aos olhos dos investidores. Afinal, sabe-se, o capital procura sempre segurança, constância e prosperidade. Prosperidade está relacionada a futuro. E futuro só se constrói hoje com práticas sustentáveis. Segundo a pesquisa Investors Opinion Survey da McKinsey & Co, em parceria com o Banco Mundial, os investidores estão dispostos a pagar entre 18% e 28% a mais por ações de empresas que adotam melhores práticas de administração e transparência.
O mercado de fundos de investimento socialmente responsável cresceu, entre 1995 e 2005, de um patamar de 12 bilhões de dólares para um outro de 179 bilhões de dólares. O que atrai os chamados investidores “engajados” são práticas de responsabilidade socioambiental realizadas pela instituição financeira que administra o fundo – como, por exempo, a neutralização de emissões de carbono – ou então carteiras compostas por empresas listadas em índices como o do Dow Jones de Sustentabilidade ou o ISE – Índice de Sustentabilidade Empresarial da Bovespa.
Ponto de mutação
O consultor Andrew Savitz tem uma definição curta, nada acadêmica e provocativa para sustentabilidade. Segundo ele, trata-se do ponto de intersecção entre a estratégia do negócio e os interesses da sociedade e do planeta. “Ser sustentável é produzir lucro com bem-estar social. As corporações vêm sendo pressionadas a mudar na direção da sustentabilidade porque seus stakeholders estão mais críticos e porque o planeta dá sinais de que não suportará tanta gente consumindo tantos recursos”, afirma.
Sobre esses sinais, o relatório “Mudanças Climáticas – 2007” do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) não deixou nenhuma dúvida: 90% das mudanças climáticas são causadas pelo homem, algo que há 10 anos seria impossível alegar com base científica. Ao conferir números dramáticos à responsabilidade da intervenção humana na Terra, ainda que feita em nome do progresso e do desenvolvimento econômico, o documento da ONU contribuiu, a seu modo, para criar um senso de urgência e acelerar o processo de expansão da cultura de sustentabilidade entre empresas.
O receio de uma anunciada crise de ordem ambiental, social e econômica tem levado mais corporações a refletirem sobre mudanças de modelos de produção, economia de recursos naturais e adoção de fontes de energia alternativas ao combustível fóssil. Embora o ritmo desse movimento ainda não seja o desejável, ele é maior do que há dois anos.  “As empresas que não adotarem a sustentabilidade como estratégia de negócio – e não somente no discurso, já estabelecido, mas, principalmente, na apresentação de resultados -, estarão fora do mercado em, no máximo, 15 anos. Não importa o tamanho. Aquelas que não se recriarem, vão desaparecer”, prevê Fernando Almeida, presidente do Cebds.
Risco vira oportunidade
Ao que tudo indica, as empresas estão mesmo mudando modelos de produção. Seja pela convicção de que não há caminho mais seguro que o da sustentabilidade, seja pela conveniência de proteger seus ativos evitando as eventuais sanções de regulações, mercados e consumidores cada dia mais críticos e preocupados com o tema. No século 21, não se pode mais ser empresa impunemente. A sociedade quer e espera mais das corporações. Segundo Homero Santos, antes prevalecia, por exemplo, uma crença de que a responsabilidade sobre os produtos terminava na fabricação, financiamento, comercialização ou em outro tipo de relação comercial. “A visão tradicional era que o comprador tinha que dar fim ao produto. A responsabilidade da empresa, na visão sustentável de hoje, encerra-se no final do uso do produto, incluindo o seu descarte”, ressalta.
Algumas empresas já deram o primeiro passo no sentido de transformar o risco em oportunidade de negócio, investindo na pesquisa e desenvolvimento de linhas de produtos sustentáveis, muitos dos quais considerados alternativos ao principal negócio da companhia. Apesar de ousada, essa aposta tem rendido bons frutos. Um exemplo notável é o da General Eletric. Em 2005, a megacorporação global lançou a Ecoimagination, uma linha com cerca de 60 produtos que incluem desde turbinas com baixa emissão gases de efeito estufa até sistemas de automação para casas que visam reduzir o consumo de água e energia.
Em 2007, as vendas de produtos dessa linha atingiram quase 10% das vendas globais da GE, totalizando 14 bilhões de dólares. Segundo estimativas da própria empresa, o faturamento da Ecomagination cresce três vezes mais rápido que a média de todos os produtos da companhia. Deverá atingir 25 bilhões de dólares em 2010. Nada mal para uma companhia que nunca havia se preocupado com o assunto.
Outra aposta bem-sucedida foi o Prius, automóvel híbrido (gasolina + bateria elétrica) da Toyota, lançado em 1997. Com 2,348 milhões de carros vendidos em todo o mundo, entre janeiro e março de 2007, a fabricante japonesa conquistou o posto de maior montadora do mundo, desbancando a liderança de mais de 70 anos da General Motors (GM). A postura verde –como se vê—atrai lucro, rentabilidade e bons negócios.
A nova onda de sustentabilidade
As empresas que até agora incorporaram, com bons resultados, a sustentabilidade em suas práticas de negócios, o fizeram para  preservar a reputação de liderança, para impactar positivamente seus mercados, para aplacar pressões regulatórias ou mesmo por influência das crenças de seus fundadores e dirigentes.
Manter-se sustentável dependerá de sua capacidade de responder às novas pressões ambientais, econômicas e sociais, como, por exemplo, a explosão demográfica e o aquecimento global. Na opinião de John Elkington, fundador da consultoria SustainAbility e um dos mais importantes especialistas mundiais em sustentabilidade, a responsabilidade social como hoje se conhece será ineficaz diante das novas forças da globalização.
“A próxima onda positiva já está sendo construída em uma escala de tempo acelerada. E chegará ao seu pico em 2010. Tratadas de forma correta, as crises de hoje – como as mudanças climáticas e o enorme contingente de pessoas de baixa renda – vão nos levar às soluções de amanhã, apresentando novas e potenciais oportunidades de mercado ainda não devidamente exploradas”,  completa Elkington.
“Olhando como nasceram os movimentos anteriores, acredito que a próxima onda, aquela que sucederá a da sustentabilidade, será a do real engajamento das pessoas, da coerência entre o que se fala e o que se faz”, completa Boechat.
O desafio do engajamento se mostrará ainda mais complexo para os países em desenvolvimento, como os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China). Segundo previsão da Goldman Sachs, eles se tornarão potências econômicas até 2050. “O contexto de atuação desses países não será o mesmo. As previsões ambientais não são animadoras e a velocidade com que avança o aquecimento global sinaliza a necessidade de fortes mudanças nos hábitos de consumo e produção. A sustentabilidade da crescente população da Terra, principalmente nos países mais pobres, requererá grandes transformações culturais e econômicas. As práticas de mercado terão que ser revistas para acompanhar todas as outras mudanças”, afirma Boechat.
Na análise de Dunn, conciliar o crescimento econômico com o bem-estar social e ambiental é o grande desafio prático não só para os países em desenvolvimento, mas para todos que vivem e viverão no planeta nas próximas décadas. “Vejo como imprescindível a formação de líderes visionários, em todos os países, capazes de realizar investimentos criteriosos e de saber educar pessoas para a importância de se considerar as conseqüências do longo prazo em tudo o que se faz”, afirma.
Boechat acredita que, diante de tão complexos desafios, será necessário acelerar a transição da era da competitividade para a da cooperação. “Os estados-nação não vão dar conta da série de limitações que vêm sendo impostas pelo meio ambiente e por uma consciência humana crescente de que deve haver justiça na distribuição de renda e na promoção da qualidade de vida. É preciso pensar em como a questão da competição e da cooperação vai ser arranjada no jogo entre estados, nações e grandes corporações. Trata-se de um jogo novo que nunca aconteceu antes na humanidade”, conclui Boechat.
Benefícios da sustentabilidade
1 Facilidade em contratar os melhores talentos
2 Retenção de talentos
3 Aumento da produtividade dos empregados
4 Redução dos custos de produção
5 Aumento das receitas e do valor de mercado
6 Redução das despesas nos sites comerciais
7 Aumento das receitas e do valor de mercado
8 Redução de risco e maior facilidade de financiamento
Estágios da sustentabilidade
1.Pré-cumprimento legal
2.Cumprimento legal
3.Além do cumprimento legal
4.Estratégia integrada
5. Proposta e paixão
Nenhuma obrigação além dos lucros Adaptação às leis Postura pró-ativa Integração da sustentabilidade à estratégia do negócio Sustentabilidade é incorporada como valor, competência
Avanços da sustentabilidade
Ontem
-Adaptação da empresa às pressões legais e da sociedade (postura reativa)
-Dimensões ambiental e social são compreendidas como fatores geradores de custos extras e ele¬mentos de risco para o negócio
-Controle ambiental dos processos produtivos
– Projetos sociais de caráter filantrópico e assistencialista
– Aspectos ambientais e sociais gerenciados por equipes/ departamentos diferentes dentro da empresa
Hoje
-Aspectos ambientais e sociais integrados a estratégia da empresa (postura pró-ativa)
-Práticas na área social extrapolam a filantropia, incluindo também o diálogo franco com as partes interessadas, questões éticas, de transparência e governança
-Sustentabilidade como fator determinante para a perenidade do negócio
-Incorporação dos aspectos ambientais e sociais à estratégia do negócio auxilia na identificação de novas oportunidades de negócios
-Mobilização de todos os setores da empresa para a gestão integrada dos aspectos econômicos, ambientais e sociais

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