Ranking do Banktrack avalia grau de sustentabilidade nos maiores bancos do mundo

22 de janeiro de 2008

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Revista Idéia Socioambiental/São Paulo
No final de dezembro, o Banktrack, organização internacional sem fins lucrativos criada para fiscalizar e monitorar o setor financeiro, divulgou o relatório Mind the Gap, documento que mostra, por meio de um ranking de pontuações, a distância entre a teoria e a prática no que se refere à responsabilidade socioambiental em 45 bancos de todo o mundo.
Entre as instituições que mais pontuaram estão o multinacional HSBC e o holandês Rabobank. No Brasil, as empresas analisadas foram o Banco do Brasil, Bradesco e Itaú, que obtiveram resultados pouco acima da média dos outros bancos, porém baixos se tratados na escala de zero a quatro estabelecida pela pesquisa. “O Banktrack trouxe, de certa forma, um posicionamento político do que seria a sustentabilidade em cada um critérios analisados”, explica o economista Gustavo Pimentel, gestor responsável pelo Eco-Finanças da ONG Amigos da Terra Brasil, porta-voz do Banktrack no País.
As instituições foram escolhidas de acordo com maior número de ativos, empréstimos realizados, financiamento de projetos e seguros oferecidos. Depois de consultar cada banco em relação às suas políticas em 14 áreas – setores e questões – [veja quadro] e quatro categorias de transparência e accountability, os dados foram compilados e avaliados na escala de zero (política inexistente ou não pública), um (vaga ou ainda uma aspiração), dois (não consistente o suficiente), três (boas práticas, faltando poucos ajustes) e quatro (total conformidade). A base de comparação para as notas são práticas internacionais que se tornaram paradigmas de sustentabilidade, tais como a certificação de florestas do FSC (Forest Stewardship Council) ou, em outro nível, a Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
“O primeiro ponto importante da pesquisa é que parte da premissa de que a responsabilidade socioambiental no setor financeiro está ligada ao seu portifólio e não à ação interna”, argumenta Pimentel. Segundo o representante do Banktrack, o que diferencia os bancos em relação à sustentabilidade não é a implementação do conceito na base do seu negócio, mas a aplicação dele como critério para oferecer crédito e financiar projetos. A tarefa de adequar-se aos modelos de práticas socioambientalmente corretas, porém, não é difícil – observa Pimentel. “Já existem referências no mercado. Estabelecer uma política não chega a ser um bicho de sete cabeças”, acredita.
Políticas públicas e específicas
Uma das conclusões do relatório é que muitos bancos têm adotado a sustentabilidade em suas políticas de crédito, mas diversos atribuem pouca importância ao tema. Exemplo disso é que porcentagem significativa das instituições analisadas – geralmente localizadas na Ásia – não pontuou em nenhuma das categorias. Apesar de muitas notas zero, os três representantes brasileiros mostraram-se, em quase todos os quesitos, pouco acima da média geral [veja quadro]. A pontuação do Bradesco e do Itaú foi idêntica. Pimentel explica que isso acontece por conta das políticas coletivas, não criadas por um banco e de acordo com suas necessidades e planejamento, mas fruto de um acordo grupal assinado por diversas empresas. “O Banco do Brasil ficou um pouco à frente dos outros dois porque, ainda que fossem vagas e aspiracionais, as políticas tratavam mais de direitos humanos, especialmente as coletivas.” O economista acredita que tais iniciativas coletivas são importantes porque proporcionam um movimento inicial de sensibilização para o tema e demonstram preocupações com indivíduos e instituições e também com valores como os de cidadania, respeito e interesse público. Mas – adverte – se quiserem melhorar no ranking é necessário que as organizações implantem políticas específicas. Na avaliação do economista, os acordos de natureza coletiva acabam sendo usados muitas vezes como “prova cabal de que estão fazendo algo numa área específica”. “Mas não é bem assim”, reforça.
Outros pontos críticos mereceram destaque no relatório, como, por exemplo, a não publicação de diversas iniciativas no site ou no relatório de sustentabilidade. Para o Banktrack, não tornar públicas as políticas tira a elegibilidade para a avaliação. Há bancos, por exemplo, que não financiam setores considerados pouco sustentáveis. Mas deixaram de tirar, por exemplo, uma nota quatro porque não estabeleceram isso como um compromisso público. Para Pimentel, não basta um banco deixar de financiar. É fundamental que ele se posicione contra, como nos casos mais notáveis da indústria armamentista e militar. Segundo o economista, muitos bancos investem recursos em energias limpas. Mas no geral, ao analisar todo o quadro de financiamento, o dinheiro aplicado em energias não-renováveis é sempre muito maior. “Existe uma desculpa recorrente. O discurso está muito afinado entre eles. Dizem que se não fizerem esse tipo de investimento, os bancos chineses, que têm as piores pontuações, o farão. Porém, quase todo banco chinês tem como acionistas americanos e europeus. Por que não fazem pressão?”, questiona Pimentel.
Ruim para a reputação
Pimentel se diz preocupado com a forma como as empresas estão comunicando a sustentabilidade. “Vemos afirmações absolutas que criam um passivo reputacional, trazem riscos e contribuem para reduzir o conceito. Slogans criativos podem passar a impressão de que as empresas fazem mais do que realmente estão fazendo. Isso confunde intenções na percepção dos púbicos”, diz. Seria mais “honesto e responsável”, em sua opinião, reconhecer que o processo rumo à sustentabilidade é uma longa jornada, repleta de dilemas a serem resolvidos, e convidar os clientes e a sociedade a apoiá-los e a participar dessa construção.
Na avaliação de Pimentel, relatórios como o do Banktrack podem ajudar os bancos a eliminarem este “passivo de reputação” e a melhorarem suas práticas. Afinal, eles dão ao público a possibilidade de conhecer, por meio de fatos, o que o setor financeiro tem feito em relação à sustentabilidade. Quanto mais positivos os resultados, mais o público confiará em que as intenções da responsabilidade socioambiental representam mais do que espasmos de marketing institucional.
Para as próximas edições do relatório, inclusive, Pimentel prevê a significativa melhora das pontuações. Um dos motivos é a quantidade de políticas já desenhadas que ainda devem se tornar públicas. “A intenção do relatório é justamente a de criar uma agenda positiva, com estímulos para que os bancos melhorem seu desempenho”, afirma.
O Banktrack tomou o cuidado, segundo Pimentel, de não formar um ranking geral das instituições, tendo em vista que cada uma está incluída em contextos históricos, políticos, sociais e econômicos específicos que influenciam na pontuação menor ou maior neste ou naquele quesito. “Podemos usar o relatório em todos os bancos, mas em cada país o documento sempre tem ênfases distintas. No Brasil, por exemplo, vamos trabalhar muito em cima da agricultura, biodiversidade, florestas e direitos do trabalho.”
Não é apenas a ênfase da pesquisa que varia de país para país, mas também a sua visibilidade e valorização. Nos Estados Unidos e países europeus, de acordo com Pimentel, houve destaque maior para o relatório porque o tema da sustentabilidade nas empresas é mais avançado do que em países em desenvolvimento. “Lá eles estão na agenda há mais tempo e as ações produzem maior impacto na mídia. Aqui, a discussão ainda está muito intelectualizada, restrita aos formadores de opinião, com impacto menor. Estamos no começo de um processo. Mas os bancos já perceberam que precisam se preocupar com os passivos reputacionais que criaram”, defende.
No futuro próximo, o Banktrack planeja realizar um estudo similar restrito ao Brasil e com uma quantidade maior de bancos. O objetivo é, além de traçar um panorama nacional, incentivar o setor financeiro local a transformar em práticas suas boas intenções de sustentabilidade.
O estímulo promete gerar uma competição saudável no setor financeiro, já naturalmente marcado por forte concorrência. Pode ser combustível desse movimento uma nova ferramenta do Banktrack para atualizar online os novos resultados dos bancos em todas as categorias. Na prática, não haverá necessidade de esperar até a próxima edição do relatório para avaliar evoluções no atendimento às políticas sugeridas pelo estudo da ONG internacional. A página da organização na internet (www.banktrack.org) possui também o perfil de todas as instituições do ranking.
Uma prova de que um estudo como o do Banktrack pode gerar mudança positiva foi um fortuito episódio de bastidores ocorrido no processo de levantamento de informações. Na troca de e-mails, sobre o que a ONG internacional chama de dodgy deal (negócio controverso), o executivo de um dos bancos avaliados enviou seu comentário por e-mail, esquecendo-se de excluir o representante do Banktrack da lista de endereços eletrônicos. No comentário, ele manifestava, sem meias palavras, a sua preocupação de que a participação do banco em um negócio controverso poderia gerar futuramente graves prejuízos de imagem. Se o objetivo era fazê-los se dar conta da gravidade do problema, deu certo.

Veja mais no site: www.ideiasustentavel.com.br
<(Quadro)
A pontuação dos bancos brasileiros no relatório de sustentabilidade do Banktrack
Pontuação

Políticas de setor Bradesco Banco do Brasil Itaú
Agricultura 0 1 0
Represas 2 2 2
Pesca 0 1 0
Silvicultura 0 1 0
Indústria militar e comércio de armas 0 0 0
Mineração 1 1 1
Petróleo e gás 1 1 1
Políticas de questões
Biodiversidade 1 1 1
Tóxicos 1 1 1
Mudanças Climáticas 1 1 1
Direitos humanos 1 1 1
População indígena 1 1 1
Trabalho 1 2 1
Taxação 0 0 0
Transparência e contabilidade
Transparência institucional 2 2 2
Transparência no negócio 0 0 0
Contabilidade institucional 2 0 2
Contabilidade no negócio 0 3 0
Fonte: Relatório Mind the Gap – BankTrack
0. O banco não possui políticas nesta questão/setor
1. A política do banco nesta questão/setor é vaga ou “aspiracional”, sem compromissos claros
2. A política do banco nesta questão/setor inclui alguns elementos importantes, mas não é consistente o suficiente
3. A política do banco nesta questão/setor é bem definida e consistente, mas não atinge os melhores padrões disponíveis em alguns aspectos
4. A política do banco nesta questão/setor é completamente consistente com os melhores padrões existentes
Para ter acesso à pesquisa completa, acesse www.banktrack.org.

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