Por Katerina Elias-Trostmann
A economia cíclica apresenta oportunidades de realizar reduções importantes na produção de resíduos sólidos no país. Ao longo do ano passado, realizei uma série de pesquisas sobre as oportunidades para a implantação de uma economia cíclica no Brasil. A pesquisa englobou análises das oportunidades criadas e dos enquadramentos legais, econômicas e sociais existentes no Brasil.
Os resultados apresentam quatro oportunidades para uma economia cíclica: a Política Nacional de Resíduos Sólidos, incentivos financeiros, concentração de indústria e logística na região Sudeste do Brasil e empreendedorismo. A economia cíclica apresenta soluções estratégicas para algumas das questões mais complexas do mundo hoje em dia: esgotamento de recursos, produção de lixo na cadeia de valor, aumentos nos preços de recursos e degradação da biodiversidade e ecossistemas. Ou seja: as forças destrutivas do sistema econômico do século XXI.
A visibilidade do conceito da economia cíclica está aumentando: em 2008, legislação chinesa adotou conceitos da economia cíclica como parte da estratégia de desenvolvimento econômico nacional. No total, 30 parques eco-industriais foram aprovados para construção, facilitando o intercâmbio de resíduos sólidos entre fábricas, com aproveitamento de resíduos para matéria-prima e extração de energia. De modo similar, a União Europeia anunciou em 2012 um compromisso de se tornar uma economia cíclica, no programa “Uma Europa eficiente em recursos”.
Aumentos nos preços de energia e recursos (veja gráfico abaixo) demonstram claramente a necessidade urgente de mudar para uma economia não destrutiva, alternativa para o modelo atual, que consome recursos finitos de maneira infinita.
Baseado no conceito de ecologia industrial, a economia cíclica pretende analisar a indústria de forma integrada, tendo em conta as interações e relações entre a indústria e ecossistemas. A economia cíclica considera tanto a produção como o consumo sustentável no âmbito empresarial e da sociedade. Assim, ela promove desenvolvimento sustentável na medida em que procura reduzir a utilização de matérias-primas e energia no ciclo de vida de produtos.
A economia cíclica é uma oportunidade para crescimento econômico, possibilitando o desenvolvimento de uma economia restaurativa que protege o meio ambiente e recursos naturais. Isto pode ser conseguido por meio de uma ampla gama de estratégias, incluindo os fluxos de circuito fechado de materiais, fabricando produtos em ramo de Design para Re-fabricação e Design para Desmontagem, aplicando a certificação Cradle to Cradle e montando logística reversa para evitar que os resíduos sejam depositados em aterros e, como alternativa, utilizando os resíduos sólidos como matéria-prima em novas cadeias de produção.
Imaginando a economia cíclica no Brasil: 4 possibilidades
1. Politica Nacional de Resíduos Sólidos
Depois de 20 anos, o governo brasileiro introduziu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). A política tem foco em seis tipos de resíduos perigosos, tendo como objetivo a redução de produção de resíduos e a melhoria de sustentabilidade na gestão de resíduos sólidos urbanos.
As características fundamentais da política as tornam uma plataforma viável para a construção de uma economia circular:
– introdução da hierarquia dos resíduos, que determina as prioridades de pós-consumo, gestão de resíduos, salientando a necessidade de prevenção e redução, o que tem implicações sobre design de produto
– assegurando o princípio do poluidor-pagador, os produtores são obrigados a pagar pela gestão de resíduos sólidos
– dando prioridade ao desenvolvimento da logística reversa e cadeias de abastecimento, a fim de desviar os resíduos dos aterros sanitários e lixões e retornar no final do ciclo de vida de produtos para o produtor
Com respeito a esta última questão, a logística reversa facilita, sobretudo, o desenvolvimento de sistemas de produção industriais em ciclos fechados. A PNRS exige que os produtores em um determinado setor trabalhem em parceria para construir a logística reversa. Isso promove uma maior colaboração, o compartilhamento de informação e comunicação entre os jogadores-chave. Portanto, existem grandes barreiras institucionais, físicas e econômicas envolvidas no desenvolvimento de logística reversa.
No entanto, no desenvolvimento da logística reversa, as indústrias brasileiras poderiam preparar-se para estratégias cíclicas de design, fabricação e reuso de resíduos sólidos como matéria-prima.
2. Fundos econômicos
Várias fontes de financiamento existem para incentivar a produção sustentável:
– Fundo Nacional para Mudanças Climáticas – apoie projetos que desenvolvam a logística reversa
– FINEP Brasil Sustentável investe em projetos que promovem a produção sustentável e inovação em tecnologia
– BNDES Funtec investe em inovação sustentável em tecnologia
Os três fundos citados fazem parte de programas nacionais que fornecem investimento para dar apoio a negócios sustentáveis, tecnologia e serviços para superar as barreiras de mercado. Brasil Sustentável, por exemplo, tem acesso a US$987 milhões em financiamento, que se destinam ao desenvolvimento de produtos sustentáveis, tecnologias e inovação. 75% serão destinados a projetos que incentivam inovação nas empresas, e 25%, para subsídios no desenvolvimento de novas tecnologias em áreas prioritárias que têm relevância para a economia circular.
Além disso, o governo brasileiro lançou recentemente o Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis. O Plano define objetivos e metas de sustentabilidade para seis setores chaves que visam à transição para uma sociedade brasileira mais sustentável. Este plano constitui o quadro regulamentar necessário para crescimento no mercado de bens e serviços sustentáveis.
Uma das maiores barreiras é a demanda do mercado por produtos sustentáveis: atualmente, apenas 5% dos consumidores brasileiros se consideram “consumidores conscientes” (Instituto Akatu). Isso impede a inovação e os esforços de sustentabilidade, como o retorno do investimento para os produtos sustentáveis continuar baixo. Outros desafios incluem o “Custo Brasil” e processos burocráticos que agem como barreiras à entrada no mercado.
3. Região Sudeste
A região Sudeste oferece fatores favoráveis para uma economia cíclica, sendo que:
– a maior parte da atividade industrial no Brasil está concentrada nas regiões da cidade de São Paulo e Rio de Janeiro, que entre eles contribuem em média com 25% do PIB do Brasil anualmente
– a maioria dos resíduos são produzidos no Sudeste, impulsionada pelas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro
– parques eco-industriais estão florescendo no estado do Rio de Janeiro, originalmente criado por uma iniciativa do governo e agora liderado pelo setor privado
– a melhor infraestrutura rodoviária encontra-se no Sudeste, facilitando o desenvolvimento da logística reversa a um custo mas favorável
– a maior parte do financiamento do BNDES mencionado no ponto 2 acima foi para empresas sediadas na região Sudeste do Brasil
4. Empreendedorismo
Finalmente, empreendedores têm uma oportunidade de fazer crescer nichos de mercado na concepção e produção de produtos sustentáveis, dada a sua capacidade de inovar em produtos, exemplificado pelas empresas TerraCycle, NovoCiclo e EPEA Brasil. Esses atores tiram benefícios do fato de não estarem “trancados” em processos de fabricação de alta produção de carbono. A Lei Nacional de Resíduos Sólidos oferece a oportunidade de gerar novas oportunidades no mercado, com apoio de financiamento oferecido pela FINEP e BNDES para empresários e a PME, o que reduz as barreiras à entrada.
O governo brasileiro não tem desenvolvido o melhor ambiente operacional para start-ups e empresários, mas a boa notícia é que a mudança é iminente: no mês passado, o governo anunciou que investimento de R$ 200.000 para cada um das 100 start-ups selecionadas por demonstrarem o maior potencial de crescimento e oportunidades para expansão.
Tomados em conjunto, os quatros pontos citados representam uma rede de oportunidades para um novo sistema econômico, modelos de negócios e de consumo que ajudarão o Brasil a se desenvolver em uma sociedade sustentável e resiliente.
Katerina Elias-Trostmann é diretora de Desenvolvimento de Negócios no UK Green Building Council.
A Ideia Sustentável constrói respostas técnicas eficientes e oferece soluções com a melhor relação de custo-benefício do mercado, baseadas em 25 anos de experiência em Sustentabilidade e ESG.