Vinte anos depois da ECO-92: qual é o balanço?

Vinte anos depois da ECO-92: qual é o balanço?

Por Fabián Echegaray

Vinte anos estão se passando da Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, realizada no Rio de Janeiro, que buscou consensuar um novo modelo sustentável de progresso.

A ECO-92 repercutiu tanto no campo dos conceitos como das práticas, emplacando a noção de desenvolvimento sustentável, forçando governos e empresas a implementarem planos e mudanças que conciliassem a vitalidade das economias com as necessidades da sociedade e do meio ambiente, e consagrando uma agenda comum de trabalhos. Aonde chegamos, duas décadas depois, na visão da opinião pública?

Pesquisa realizada pelo instituto Market Analysis com 806 adultos residentes em nove das principais capitais do país aponta que os brasileiros encontram-se relativamente divididos quantos aos avanços dos últimos vinte anos para criar uma sociedade mais igualitária e saudável e para proteger o meio ambiente, e mostra que eles só estão persuadidos quanto aos progressos alcançados no bem-estar econômico.

Enquanto 51% entendem que houve melhorias rumo a uma sociedade mais justa, outros 39% acham que nada mudou, e ainda 10% pensam que as coisas pioraram.

Com relação às questões ambientais, o quadro não é muito diferente – 53% acreditam que o Brasil melhorou, 34% que ficou igual e 14% acham que francamente piorou. O consenso é maior com relação ao progresso econômico e material das pessoas: 59% concordam com melhoras notáveis, 31% acham que ficou igual e só um em cada dez brasileiros acredita que a situação piorou.

Deveria nos surpreender essa ambivalência de opiniões? Muito pouco. Mesmo quando outros indicadores do humor social apontam para um otimismo recorde entre os brasileiros. Examinemos a proposta de constituir sociedades mais igualitárias, por exemplo.

De um lado, o combate à miséria teve conquistas enormes, com a redução de pessoas em extrema pobreza – dos 25,6%, em 1990, para 4,8%, em 2008. Ainda, a distribuição de riqueza tem dado passos importantíssimos nos últimos anos, como o ilustrado pela razão dos rendimentos dos 20% mais ricos em comparação com os 20% mais pobres que, em 1990, era 30,5 vezes superior e, em 2009, caiu para menos de 19 vezes.

Apesar disso, mantêm-se os sinais de injustiça social, tais como a prevalência da criminalidade (que há mais de uma década sobressai-se como o problema número um do país) e a discriminação dos não brancos e das mulheres em termos de renda e cargos de chefia (com negros e pardos chegando a ganhar metade do salário dos brancos pela mesma função).

Na esfera ambiental, os rumos das últimas duas décadas também deixaram um quadro misto: definiram-se políticas e legislação para reduzir a pegada ecológica dos setores da economia e apoiar a geração de energia limpa; mas buscou-se afrouxar leis (como o Código Florestal) e passou-se a privilegiar megaprojetos hídricos sob intenso questionamento, como Belo Monte, e a favorecer termelétricas com financiamento público.

Criaram-se alianças pró-sustentabilidade entre governo, sociedade civil e empresas, que resultaram nas moratórias da soja e da carne como forma de reduzir o desflorestamento, porém isso se segue de uma fiscalização muito pobre, o que significou quase 345 mil km2 de desmatamento só na Amazônia, desde 1990.

Até na área dos progressos econômicos, entendidos como mais bem-estar e abundância material, existem sinais cruzados. Se a massiva entrada de 50 milhões de brasileiros para a classe média simboliza o sucesso da mobilidade social e do crescimento econômico da última década e meia, a voracidade do consumo desses cidadãos impactou a saúde pessoal, com níveis inéditos de obesidade, doenças coronárias e diabetes, assim como a saúde coletiva, por exemplo, ao favorecer aumentos na poluição do ar, fruto do boom automobilístico.

Essa ambivalência reflete-se na maneira particular como a geração da ECO-92 enxerga retrospectivamente os rumos seguidos pelo país a respeito de melhorar o bem-estar econômico, criar sociedades mais iguais e saudáveis e proteger o meio ambiente. Os jovens daquela época, hoje adultos com 40 a 50 anos de idade, demonstram uma visão bem menos positiva das últimas duas décadas se comparados com as gerações mais novas e mais velhas.

É claro que não temos como afirmar que todos os brasileiros que em 1992 viviam a plenitude da sua juventude, com 20 a 30 anos de idade, estivessem por dentro da agenda da Conferência do Rio, mas certamente eles não conseguiriam nem ignorar o evento nem sentirem-se blindados perante a convocatória gerada naquele momento em favor da sustentabilidade.

Para esse grupo – a geração da ECO-92 – o cenário global da Rio+20 traz bem menos notícias boas. Por exemplo, no terreno do bem-estar material, 52% deles entendem que as coisas melhoraram, frente a 56% dos mais jovens e 68% dos mais velhos que pensam assim.

Em relação à qualidade do progresso social, 47% da geração ECO-92 percebe avanços, em comparação aos 50% dos mais jovens e 59% dos mais velhos. Por último, apenas 46% da geração em questão aprova a evolução dos cuidados com os recursos naturais e o meio ambiente, diante de 55% dos mais jovens e 56% dos mais velhos.

O aniversário de um dos maiores eventos mundiais em favor do desenvolvimento humano e ambiental, projetado agora na Conferência da Rio+20, encontrará a geração que o protagonizou talvez menos entusiasmada com a história das promessas feitas em 1992. Isso não faz dela mais pessimista ou apática diante da tarefa de construir uma sociedade sustentável.

De fato, são pessoas dessa geração as que exercerão um papel de liderança durante e depois da Rio+20. Liderança cujo primeiro desafio pode ser, justamente, o de favorecer uma leitura menos complacente e conformista entre os mais jovens e os mais velhos sobre o passado e o futuro econômico, social e ambiental do Brasil.

Fabián Echegaray é Ph.D em Ciência Política pela Universidade de Connecticut (EUA) e diretor-geral da Market Analysis, instituto de pesquisas especializado em sustentabilidade e responsabilidade social.

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