Desde a era Jack Welch tudo o que a General Eletric faz desperta a atenção do universo dos negócios, acelera o pulso da concorrência e mobiliza os analistas de tendências. Não foi diferente há dois anos quando Jeffrey Immelt, o seu presidente, anunciou que tornaria a empresa “verde” e faria dela líder em um novo mercado puxado pelas mudanças climáticas. A idéia agradou ambientalistas, alguns governos e sociedades. Mas houve quem desconfiasse de que, na prática, ela esbarraria na dificuldade natural de fazer mudanças em processos de produção e estratégias de negócio já consagrados e lucrativos.
tese dos incrédulos baseava-se no fato incontestável de que GE, ícone do capitalismo global, é sinônimo de empresa sólida e tradicional que vende de tudo– de lâmpada residencial a motor de avião – e que parte considerável do seu faturamento de U$ 163 bilhões/ano advém de produtos que estão longe de serem ecologicamente responsáveis, como, por exemplo, turbinas movidas a carvão ou equipamentos de exploração de petróleo e gás.
Abrir mão de investimento em produtos tradicionais e, portanto rentáveis, embora claramente impactantes do ponto de vista da emissão de gás carbônico, põe em risco o crescimento da empresa no curto e médio prazos, deixando os acionistas de orelha em pé. Mantê-los, no entanto, atrasa em alguns anos o tão propalado projeto da liderança “verde” em questões de mudanças climáticas. Esta é a encruzilhada de Immelt.
As metas da GE são ousadas: com a sua “linha verde” Ecoimagination, a empresa espera vender U$ 14 bilhões em produtos menos agressivos ao Planeta, crescendo 10% ao ano até 2010. Mas –segundo uma reportagem do The Wall Street Journal — os clientes estão à beira de um ataque de nervos, cobrando “menos discurso ambientalista” e mais “realismo” nos negócios. Para acalmar os parceiros, e afastar a imagem de “abraçador de árvore”, que repudia sempre com veemência, o próprio Immelt tem admitido que não forçará a barra para “mudar o fluxo econômico da empresa”. O recado não poderia ser mais claro: “esverdear” uma empresa como a GE tem o seu limite e o executivo já disse que não vai ultrapassá-lo sob nenhuma hipótese. Produtos novos e sustentáveis são bem-vindos. Mas os “velhos” produtos vão seguir firmes enquanto houver mercado para eles.
O dilema do CEO da General Eletric é igual ao de tantos outros presidentes de empresas com produtos baseados em matrizes energéticas poluidoras e que dependem de recursos naturais escassos. Insere-se no contexto de uma complexa transição em curso do paradigma de negócio do bottom line trimestral, que, apesar de em declínio ainda não morreu, para o do triplle bottom line que, a despeito de estar em ascensão, ainda não se instalou por completo. Nem todo mundo está disposto a sacrificar a rentabilidade no curto prazo em nome de uma visão socioambiental de longo prazo. Muitos se escoram na tese –duvidosa, mas conveniente — de que nem mesmo os consumidores valorizam tanto quando deveriam, em suas compras, ou mesmo estão dispostos a pagar pelo diferencial da sustentabilidade.
As resistências que Immelt tem encontrado não diferem das que enfrentam os presidentes de bancos que recusam emprestar dinheiro a madeireiras ambientalmente irresponsáveis, CEOs de fabricantes de cosméticos que almejam reduzir embalagens apesar do valor conferido a elas pelos consumidores ou mesmo dirigentes de grandes varejistas que atribuem ao fator compromisso ambiental o mesmo peso de importância do preço na escolha de fornecedores.
Entre a cruz dos produtos que geram lucro sem destruir o meio ambiente e a espada da cobrança por resultados imediatistas com os produtos tradicionais, o mundo dos negócios vive o imperativo das contradições. Modelos mentais antigos serão substituídos por outros mais adequados às demandas de uma sociedade cada dia mais exigente e um planeta com recursos sob permanente ameaça. Mas isso não ocorrerá da noite para o dia. Como em todo processo de adaptação, todos os envolvidos enxergarão aos poucos que os novos ganhos compensam em muito as velhas perdas. Immelt não vai desistir da sua linha Ecoimagination. E é bom que não desista mesmo. O tempo joga a favor de suas idéias.
Ricardo Voltolini é diretor de redação de Idéia Socioambiental e consultor de Idéia Sustentável
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