Pensamento sustentável – O futuro próximo dos negócios sustentáveis

Pensamento sustentável – O futuro próximo dos negócios sustentáveis


Uma das perguntas mais freqüentes que chegam a esta coluna diz respeito a como a sustentabilidade vai se inserir na gestão dos negócios nos próximos cinco ou dez anos. A tarefa de prever futuro já fez mais a ruína do que a glória de muitos analistas de tendências. Por isso, evitá-la costuma ser uma atitude de bom senso. Sem, no entanto, a pretensão de aqui encarnar a figura de John Naisbit, autor de Megatrends, nem de arriscar datas e números absolutos em um tempo marcado por incertezas relativas, arrisco-me a especular a respeito de algumas possibilidades para um futuro próximo, considerando –é claro– as dinâmicas hoje observadas nas corporações brasileiras.
A persistir o curso atual de deslocamento do conceito de sustentabilidade da periferia para o centro das decisões estratégicas de negócio, certamente cada vez mais empresas enxergarão os dilemas socioambientais sob a perspectiva da oportunidade. Em vez de focarem a proteção de ativos, identificarão novas alternativas para criação de valor. Esse processo será puxado pelas líderes de mercado, sempre mais sensíveis às expectativas da sociedade, e também pelas organizações cujo negócio seja particularmente impactante ás comunidades e ao meio ambiente, aquelas que dependem de recursos naturais escassos ou que alterem, de modo significativo, o equilíbrio e o modo de vida de populações normalmente excluídas. Capitaneadas por líderes mais éticos, elas colocarão sua energia na formação de novas lideranças capazes de compreender que, mais do que um imperativo moral, ser sustentável valoriza ativos, gera valor econômico para o negócio, preserva o planeta e melhora a vida das pessoas.
Para atender a essa nova visão empresarial, investirão mais recursos em suas áreas de pesquisa e desenvolvimento, visando criar produtos e serviços socioambientalmente responsáveis a partir da análise do que querem, esperam e valorizam consumidores preocupados com o tema. E eles vão querer e esperar cada vez mais. Por convicção altruísta conveniência egoísta.
Qualquer pessoa que tenha a chance de escolher, em iguais condições de preço, qualidade e disponibilidade, um carro, um eletrodoméstico ou um computador ecologicamente corretos e socialmente justos, optará pela decisão de compra mais responsável. Aceitar o contrário seria o mesmo que validar a duvidosa tese de que os consumidores agem por má fé. Cada vez mais companhias informarão os seus consumidores sobre a origem responsável de seus produtos, utilizando rótulos, material de ponto de venda, portais, celulares e comunidades virtuais. Com isso, os indivíduos se tornarão naturalmente mais críticos e seletivos, retroalimentando um ciclo virtuoso marcado por recompensa ás empresas responsáveis e punição ás que não cultivarem esses valores. A mudança virá, portanto, de um equilíbrio dinâmico de pressão e adequação.
Em um futuro próximo, as empresas sustentáveis farão uma revisão profunda em seus modelos de produção. E também nas suas noções de competitividade. O lucro a qualquer custo será um credo passadista, malvisto, execrável. Muitas substituirão gradativamente o uso de energia suja por matrizes renováveis. Outras adotarão o reuso amplo de matérias-primas e recursos naturais. A maioria terá mecanismos de descarte, engajamento de parceiros de cadeia produtiva, sistemas eficazes de controle de emissão, planilhas baseadas em metas de desperdício zero em processos e relações comerciais sustentáveis com as populações vizinhas. Por outro lado, levando em conta que os mercados serão auto-regulados para valorizar a competição responsável, as empresas incorporarão, de vez, à sua cartilha, práticas que hoje seguem irregulares e fugidias, como o respeito aos direitos humanos, a valorização da diversidade, a eliminação de passivos socioambientais, a transparência nas relações com as partes interessadas e a promoção do bem-estar das comunidades. Tudo isso deixará de ser diferencial para inflar reputações e imagens. E passará a ser pré-requisito para atuação em qualquer mercado.
Otimismo, projeção utópica ou excesso de licença poética? O futuro ás próximas gerações pertence. E é em nome delas que ele guarda um lugar de destaque para a sustentabilidade nos negócios, seja por convicção seja por conveniência.
Um novo jeito de competir
 
Competitividade responsável. Anote bem o termo, pois, ao que tudo indica, se ouvirá falar muito dele nos próximos anos. E não apenas no contexto de empresas, mas também no de governos.
Como o nome sugere, trata-se de um tipo de competitividade que privilegia o desenvolvimento sustentável, partindo da premissa de que, cada vez mais, os mercados globais recompensarão os modelos de negócio com melhores resultados sociais, ambientais e econômicos. Segundo a AccountAbility, organização inglesa que cunhou a expressão, nações que estimulem práticas comerciais baseadas nesse novo conceito, por meio de políticas públicas, normas sociais e ações de cidadania, certamente obterão sucesso econômico mais consistente.
Competitividade lembra mercado. E mercado remete á noção de lucro. Logo, competitividade responsável é idéia que deriva de uma nova compreensão, por parte dos mercados, de que o padrão atual do lucro impaciente, aquele que remunera o investidor no curto prazo, com alta geração de passivo para pessoas (desigualdades, migrações desenfreadas, desrespeito a direitos humanos e corrupção) e meio ambiente (esgotamento de recursos naturais já escassos) chegou a um nível de irresponsabilidade que ameaça inviabilizar o que dá sustentação às sociedades. Sem sociedades sustentáveis, os mercados se tornam ilegítimos e enfraquecem.
Para os defensores da competitividade responsável, os atuais dilemas sociais como a pobreza, e ambientais, como as mudanças climáticas, representam, mais do que um risco, uma fonte de oportunidades para criação de valor econômico. Sintetizam um novo campo de possibilidades para os negócios que nascerá da capacidade empresarial de inovar em produtos e processos aliada à firmeza de governos na tarefa de criar regulamentações adequadas e encorajar novas formas de colaboração intersetorial.
Para definir o nível de competitividade responsável de um país, a AccountAbility criou um índice, a partir de 21 indicadores, divididos em três categorias (Impulsionadores de Políticas, Ação Empresarial e Habilitadores Sociais). Na pesquisa realizada, em 2007, com 108 países, o Brasil aparece na posição de número 56. E figura o grupo dos Cumpridores (os outros três são os Inovadores, Assertivos e Iniciantes), junto com Índia, México e outras 29 nações.
Aqui, como na maioria dos outros países cumpridores, os governos ainda não se deram conta da importância estratégica da competitividade responsável, muitas corporações seguem apegadas a modelos de negócios perdulários e a sociedade civil não se apercebeu de que esse conceito pode gerar oportunidades de valor não só para empresas mas também pra consumidores e comunidades. Há, portanto, muito trabalho por se fazer.

Ricardo Voltolini é publisher da revista Idéia Socioambiental e diretor da consultoria Idéia Sustentável

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