O custo do necessário ajuste ambiental

O custo do necessário ajuste ambiental

No final do ano passado, o alto dirigente de uma empresa multinacional deixou escapar em reunião que só faria investimentos expressivos em novos modelos de produção e em produtos com baixa emissão de carbono  quando os consumidores estivessem dispostos a pagar o “preço da novidade.”
Em defesa de sua tese, o executivo amparou-se no argumento de que os brasileiros são poucos críticos á abordagem do tema pelo mundo empresarial e ainda não perceberam o valor dessa questão a ponto de a considerarem central em suas decisões de consumo. Será?
Para buscar possíveis respostas, vale recorrer às conclusões da pesquisa Os Brasileiros Diante das Mudanças Climáticas. Realizado em 2007 pela Market Analysis,  este importante estudo constatou a existência de quatro grupos ao fazer o cruzamento entre as variáveis “relação entre as esferas econômica e ambiental” e ” avaliação do desempenho ambiental de empresas.”
O mais numeroso (35%) compõe-se de indivíduos conservadores com visão baseada em conceitos da sociedade industrial. São os chamados “materialistas despreocupados”. Para eles, pouco importa o quanto as empresas impactam o meio ambiente contanto que continuem a movimentar a economia, gerando empregos e produtos com preços acessíveis. Segundo o estudo, feito nas oito principais capitais do País, eles se encontram concentrados no Recife, Salvador, Brasília e Porto Alegre. Em seguida, destaca-se o grupo dos “críticos ambientalistas” (24%). Como o próprio nome sugere, esses indivíduos não só valorizam muito a questão ambiental como consideram insatisfatória a performance ambiental das empresas. Um em cada quatro brasileiros joga no time dos  super engajados. E é mais fácil encontrá-lo em São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
Um terceiro grupo, o dos “apoiadores ambientalistas”, reúne 22% de consumidores. Igualmente entusiastas da temática, diferenciam-se do anterior por estarem satisfeitos com os esforços corporativos pela causa. Belo Horizonte é a cidade que mais concentra esses indivíduos. Ainda de acordo com a pesquisa, um em cada oito cidadãos ajuda a formar o bloco dos “materialistas críticos.” Morando principalmente no Rio de Janeiro e em Salvador, eles priorizam a abordagem econômica em relação á ambiental, mas mesmo assim acham que as empresas não cumprem suas responsabilidades socioambientais.
Há outros elementos interessantes a considerar no estudo da Market Analysis. Na busca de respostas sobre o nível de engajamento ambiental do consumidor brasileiro, a pesquisa chegou a quatro “reações” cruzando as variáveis “eventual impacto negativo do corte de carbono para a economia” versus “ameaça para o indivíduo e sua família representada pela mudança de clima.”
A reação de paralisia (44%) é a que engloba o maior número de pessoas. Confusos com o modo como o tema vem sendo discutido na agenda pública, eles identificam muitas perdas. Mas, ao mesmo tempo, acham que o ajuste ambiental produzirá impactos negativos para a economia. O segundo grupo, denominado “consenso sustentável”, compreende 36% que discordam da idéia de que uma redução de carbono vai necessariamente diminuir a atividade econômica. Preocupados com a ameaça das mudanças climáticas, eles se mostram receptivos a intervenções no modelo produtivo e estão entre os que melhor aceitam iniciativas, produtos e serviços sustentáveis.
Artigo publicado no jornal Gazeta Mercantil em 29/01/2008.
Os outros dois grupos equivalem a 20% da população. Cerca de 7% compõem o grupo dos que desconfiam do aquecimento global e não abrem mão do atual modelo de produção e consumo. São resistentes a qualquer ônus ambiental e, portanto, à proposta da sustentabilidade. O último grupo abriga 13% de “otimistas ingênuos” que, além de não identificarem nenhum impacto adverso das mudanças climáticas acham desnecessário mudar modos de viver e consumir.
Por qualquer ângulo que se olhe este conjunto de dados, a posição do dirigente mencionada no início desse artigo parece, no mínimo, discutível. O próprio estudo indica, é verdade, que os brasileiros, apesar de muito preocupados, situam-se mais no campo das intenções do que no das ações. Mas contra os 35% de “materialistas despreocupados”, há, por exemplo, 46% de “ambientalistas” –uns mais “críticos” e prontos para demandar produtos ambientalmente responsáveis, outros “apoiadores” da idéia, com postura que pode evoluir mediante revisões de pensamento estimuladas pelo crescente debate do tema na sociedade. Ainda que os 20% de desconfiados e resistentes á proposta da sustentabilidade mantenham essa posição, por ignorância ou teimosia, o percentual dos que admitem o consenso sustentável deve crescer substancialmente nos próximos anos com adesão dos que vão se libertar da paralisia depois de entender que o necessário ajuste ambiental não constitui barreira para a economia.

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