Por Victor Bicca
O ano de 2010 foi um marco para o setor de resíduos sólidos no Brasil. Além de o Congresso Nacional ter aprovado a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o governo federal concluiu o marco legal, emitindo sua regulamentação e pavimentando o caminho para os futuros acordos setoriais.
E agora, o que podemos esperar? Com certeza, muita movimentação. Não só do novo governo, que tem a tarefa de avançar na discussão da implementação da nova política, mas também das prefeituras, que deverão iniciar o processo de adequação de suas cidades aos preceitos da nova lei, com o fim dos lixões e implantação da coleta seletiva, bem como do setor empresarial, cuja missão será montar e ampliar os sistemas de logística reversa de seus produtos.
Dentro dessa movimentação toda, chama a atenção o aparecimento de alguns modelos de gestão de resíduos sólidos defendidos por entidades do setor empresarial. Modelos que, na verdade, buscam trazer para o Brasil sistemas desenvolvidos em outros mercados, normalmente com características socioeconômicas, culturais e geográficas totalmente diversas das nossas.
O grande mérito da nova política foi ter conseguido incorporar as chamadas cooperativas de reciclagem, ou cooperativas de catadores, modelo existente há anos no Brasil e responsável pelos altos índices de reciclagem brasileiros. Hoje mais de um milhão de brasileiros trabalham como catadores, garantindo uma renda mensal que possibilita o sustento de suas famílias. Na esteira deles, vemos mais de 600 cooperativas de reciclagem operando no País, muitas delas já participando oficialmente da coleta seletiva de diversas cidades brasileiras.
Nesse sentido, nosso esforço futuro tem de ser o fortalecimento do modelo encampado pela Política Nacional de Resíduos Sólidos e não a discussão de modelos alternativos de execução da logística reversa, visto que as cooperativas de catadores, além da alma da nova política, já são uma realidade de sucesso no País, e não uma proposta a ser construída e testada por anos à frente para atingir o mesmo nível de amadurecimento. O Brasil está entre os líderes mundiais em reciclagem de latinhas, PET, papelão, embalagens longa-vida, entre outros.
Em vez de perdermos tempo discutindo modelos novos e diferentes daqueles já previstos na nova lei, temos sim de avançar na discussão da desoneração da cadeia produtiva da reciclagem, da ampliação de seu parque nacional, da implantação dos sistemas de coleta seletiva e, principalmente, do processo de capacitação e organização dos catadores dos lixões que serão extintos. Também não podemos esquecer o desafio de diminuirmos o número de intermediários nessa cadeia produtiva e da simplificação da montagem e gestão das cooperativas. Se não dermos ênfase a esses desafios, estaremos fadados ao insucesso, ou pior, à regressão dos nossos índices de reciclagem e conquistas sociais recentes.
A discussão da gestão de resíduos sólidos no Brasil passa, além é claro das questões socioambientais, pela competitividade do setor empresarial. O fortalecimento do modelo de cooperativas de catadores, além do cumprimento dos objetivos sociais e ambientais na Política Nacional de Resíduos Sólidos, também garantirá a competitividade das empresas brasileiras, uma vez que representa o equilíbrio do custo/benefício. Por sua vez, a manutenção dos parâmetros de competitividade do setor empresarial significará a sustentabilidade do modelo, permitindo o avanço das cooperativas de catadores e, por fim, o aperfeiçoamento de toda a cadeia de reciclagem no Brasil.
Victor Bicca é presidente do Cempre – Compromisso Empresarial para a Reciclagem
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