Recursos humanos, sustentabilidade corporativa e o capitalismo vigente

Recursos humanos, sustentabilidade corporativa e o capitalismo vigente

Especial 20 anos de Ideia Sustentável: Recursos Humanos e Sustentabilidade

Por Luiz Eduardo Neves Loureiro

Há algum tempo, o conceito de ecologia, até então restrito a grupos de ideólogos ou de ativistas avessos ao desenvolvimento, foi ampliado e, com eventos como a ECO 92 – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento -, ocorrida no Rio de Janeiro, outras instituições passaram a ser responsabilizadas pela preservação do meio ambiente e pelo bem-estar social de toda a população global.

Salvo raríssimas exceções, as grandes corporações aderiram ao novo conceito por imposições legais ou pela necessidade de adotarem normas que as diferenciavam da concorrência ou as beneficiavam comercialmente.

Durante esse período, o RH passou ao largo das decisões estratégicas sobre sustentabilidade e, no máximo, participava da implantação de alguns projetos, principalmente quando estes se referiam a ações sociais e de conscientização interna ou de voluntariado nas comunidades do entorno. Os projetos técnicos, relacionados à ecoeficiência, normalmente eram conduzidos pelas áreas técnicas e, ao RH, cabia, junto com o Marketing, a comunicação e divulgação para toda a empresa.

Contudo, a sustentabilidade se consolidou como ciência e, mais do que isso, tornou-se uma importante alternativa para as organizações se viabilizarem em um ambiente de recursos escassos, legislação cada vez mais restritiva e de um mercado consumidor exigente e consciente do poder da sua escolha na contribuição para o futuro ambiental e social do planeta.

Sustentabilidade passou, então, a fazer parte da estratégia das grandes empresas. Apresentar-se ao mercado como uma “empresa verde” tornou-se obrigatório.

Contrariando um dos importantes fundamentos da sustentabilidade, o de fazer as coisas acontecerem de dentro para fora, toda atenção foi dada para vender os conceitos para o mercado e, até então, muito pouco era feito da porta para dentro. Nesse contexto, o RH foi, mais uma vez, preterido, e a grande contribuição que poderia dar no processo de mudança cultural foi substituída por expressivas campanhas de marketing institucional ou diretamente ligadas a produtos.

Mas sustentabilidade não pode ser vista apenas como uma nova ciência ou oportunidade de exposição da marca. Ela é uma filosofia, um estilo de vida, e está diretamente ligada à ética e aos valores pessoais e sociais. Por isso, continuar deixando o departamento de Recursos Humanos à margem da sua implementação é o erro que muitas empresas têm cometido.

Em 2008, quando as estratégias e ações sustentáveis de grandes empresas vinham tomando corpo e pareciam tornar o caminho para a sustentabilidade corporativa sólido e irreversível, devido à contaminação positiva que gerava nos concorrentes diretos e em toda a cadeia produtiva, veio a crise do subprime. Com a crise ficou claro que, nas empresas, o que não é cultura é projeto, e o que é projeto é muito fácil interromper pela redução ou extinção de recursos financeiros.

Com isso, a sustentabilidade, que na maioria das empresas não era cultura e sim um projeto, foi posta em segundo plano. O pretexto usado foi o da sobrevivência das organizações e, infelizmente, alguns líderes empresariais usaram a mesma crise para desistirem de planos nos quais nunca acreditaram de verdade.

Agora, com o arrefecimento da crise financeira, ou apesar dela, novas e consistentes ações têm de ser tomadas para garantir a perenidade da nossa sociedade, que continuará se organizando da mesma forma em cidades, vilas e comunidades, mas não consumirá as mesmas coisas e nem do mesmo jeito.

Além disso, a geração digital, que até há pouco era um novo e insignificante player em um mercado muito diversificado e classificado prioritariamente pelas classes econômicas, passou a ter uma grande representatividade no mercado consumidor e nos quadros de colaboradores das empresas, tanto em termos quantitativos quanto pela capacidade de mobilização e multiplicação que possuem – e usam – para defender suas ideias ou para refutar aquilo em que não acreditam.

O conceito da “socioeficiência” voltou a fazer sentido. Esse conceito, que faz analogia à já conhecida ecoeficiência, prega o bem-estar social dos funcionários de forma plena, no trabalho e na vida, deixando-os mais satisfeitos e, consequentemente, mais produtivos e aderentes à visão estratégica e aos projetos corporativos.

O conceito é muito conhecido pela grande maioria dos profissionais de RH, ainda que não usem o mesmo termo para identificá-lo. Contudo, a sua prática é constantemente dificultada pelo pragmatismo e imediatismo nos resultados que alguns executivos insistem em cultivar. Esses executivos pouco se preocupam com os meios e com o processo: para eles, o resultado final – financeiro principalmente – é o que conta.

Em muitos casos, inúmeros infelizmente, o pragmatismo rompe a barreira do razoável e se transforma em desrespeito ao ser humano, chegando, no extremo, à deplorável prática do assédio moral, que acaba com a produtividade das empresas, macula suas reputações e, o que é pior, destrói a autoestima e a dignidade das pessoas, deixando-as suscetíveis a patologias e somatizações.

Muitos profissionais de RH sofrem com isso, pois precisam demonstrar – ou provar – para a alta direção que o malfeito desses executivos não pode ser ignorado em função do resultado imediato apresentado por suas áreas ou departamentos. E assim a sustentabilidade continua sendo retórica para muitas empresas, simplesmente por não conseguirem engajar as pessoas mais importantes do mercado que são seus próprios colaboradores.

Juntemos a isso a crescente terceirização de serviços internos nas grandes empresas. Essa prática, de utilidade indiscutível, também está, regra geral, desconectada da ação e controle do RH. O escopo do trabalho a ser terceirizado é normalmente definido por uma área técnica, que busca a melhor qualidade possível; a contratação é feita pela área de compras, que visa ao menor preço; e a formalização é feita pelo departamento jurídico, com a intenção de minimizar riscos. O resultado é uma relação pouco sustentável agravada pelo fato de que o RH, por exigência legal, precisa fazer algumas diferenciações entre as equipes próprias e as terceirizadas, ainda que estejam atuando sob o mesmo teto.

Considero que o RH é refém de uma ordem estabelecida e aceita, segundo a qual a sustentabilidade corporativa ainda está condicionada à existência de todas as condições favoráveis, tais como: economia aquecida, mercado comprador, câmbio favorável e taxa de desemprego estável (mas não muito baixa).

Quando alguns desses fatores não se apresentam da forma ideal, a busca indiscriminada e indisciplinada pelos resultados volta a predominar e, em muitos casos, os abusos e desrespeito às pessoas, que podem permanecer latentes por longos períodos, volta a tirar o sono dos profissionais de RH.

O mundo ideal será aquele em que, nas empresas, todos entendam a importância dos resultados financeiros e ajam para que sejam atingidos e consolidados; respeitem e preservem o meio ambiente pela sua extrema importância à vida e por sua finitude; e amem incondicionalmente todas as pessoas, a partir daquelas que estão fisicamente mais próximas.

Parece utópico, mas será realmente impossível se o RH não for verdadeira e definitivamente inserido nas estratégias da sustentabilidade corporativa.

Luiz Eduardo Neves Loureiro é diretor de Desenvolvimento Humano Organizacional da 4winners.

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