Nigel Topping

Nigel Topping

Em entrevista à Ideia Sustentável após o pré-lançamento do relatório 2010 do Carbon Disclosure Project (CDP) Brasil, Nigel Topping aponta os principais desafios e tendências para o reporte de emissões entre as empresas, a evolução desse processo no Brasil e os dilemas que envolvem taxas verdes e regulamentações socioambientais.
IS – Desde que o CDP foi criado, o senhor observa uma evolução no reporte de emissões de carbono das empresas? O que espera para o reporte do uso de água?
Nigel Topping – Existem dois pontos principais nessa evolução. O primeiro é o nível crescente de interesse dos investidores sobre o assunto. Em 2003, eram cerca de 50 investidores, representando 4 trilhões de ativos e agora são 535, que administram 64 trilhões. O segundo ponto diz respeito ao processo de reporte das companhias. No primeiro ano 250 revelaram seus dados e atualmente contamos com mais de 4.400 empresas de capital aberto.
O reporte de água é algo mais complicado em certos aspectos, especialmente quando se pensa na mensuração. Os números que compreendem o uso global do recurso não são tão úteis, é mais importante que a companhia possa identificar onde os estão riscos iminentes dentro de sua própria cadeia de suprimentos. Em outros aspectos o processo é basicamente o mesmo. Precisa-se saber onde os recursos estão sendo utilizados e então mapear os riscos e buscar oportunidades a partir deles.
Primeiro, estamos tentando disseminar a consciência, pois muitas companhias nem ao mesmo começaram a pensar sobre ao tema, especialmente porque ele está frequentemente associado à cadeia de suprimentos e não a toda a corporação. Desejamos acelerar o desenvolvimento de padrões globais, mas como não há prática anterior, queremos trabalhar como parte da solução.
IS – Como o senhor avalia a evolução do reporte de emissões em nosso País?
Topping – Há essa famosa divisão entre países desenvolvidos e os BRICs e o nível muito alto de participação do CDP no Brasil tem sido importante para investidores e empresas ao redor do mundo. As corporações brasileiras estão revelando suas emissões tanto quanto as americanas ou européias e isso mostra que a questão é global e a resposta pode ser a mesma globalmente.
Acredito que isso também tem pressionado mais as empresas européias e americanas, porque muitas pensam estar a frente em termos de práticas e políticas do as de alguns países emergentes e não deve haver esse tipo de competição entre as companhias.

IS – O senhor acredita que o carbono possa vir a ser um fator competitivo para as empresas? Por quê? As empresas já estão conseguindo obter vantagens no ambiente de negócios por causa de uma gestão de emissões de carbono mais efetiva?

Topping – Definitivamente  é uma questão competitiva  que algumas empresas já notaram e varia muito de negócio para negócio, de setor para setor. Primeiramente porque há riscos regulatórios, fiscais, especialmente nas cadeias de suprimentos nas quais é difícil identificar riscos reputacionais. Uma vez que você conhece os riscos, percebe que eles podem ser competitivos, gerar oportunidades.
Além disso, quando os percebe, pode cortar custos e usar o mesmo processo para desenvolver inovações, como tecnologias limpas que ajudam os consumidores a economizar dinheiro.
Outra das mais importantes questões competitivas, que as empresas têm discutido cada vez mais, é a importância dos colaboradores, principalmente pessoas mais jovens. Estamos na geração zeta, formada por jovens com cerca de 20 anos que possuem um profundo entendimento das questões sustentáveis sustentabilidade pois cresceram ouvindo falar sobre elas.
E isso é parte de uma questão maior que está emergindo entre as empresas: “qual é o propósito dos negócios?” Essa pessoas mais jovens têm conversado com executivos seniores que não questionam isso. Então já é uma questão competitiva e há empresas que estão ganhando com ela.
IS – O senhor acredita que o reporte de emissões de carbono deveria ser obrigatório, como pregam alguns especialistas e políticos? Por quê?
Topping – Deveria ser obrigatório e não apenas para emissões, mas também para outras questões como riscos e oportunidades de governança. Digo isso porque sabemos, por meio de pesquisas, que grande parte do valor das corporações não está representado no balanço financeiro das empresas, mas também em outros aspectos sobre os quais os investidores não possuem informação. E não havendo disponibilidade de determinada informação, como vimos na recente crise financeira com a invisibilidade do subprime, podem tomar más decisões. E dessa forma indivíduos, instituições e governos perdem dinheiro.
Acredito que os governos vão agir para que as companhias revelem alguns aspectos de áreas não financeiras, provavelmente relacionados, primeiramente, às mudanças climáticas.  Esse movimento tem ocorrido, por vezes, de forma voluntária, impulsionado pelo poder de decisão de investidores. Mas deve tornar-se um mecanismo obrigatório.
Em setembro publicamos o “Climate Change Reporting Framework” que está pronto para ser adotado por governos que desejam a relação de dados de acordo com essa estrutura.

IS – O senhor observa evolução na gestão e governança das emissões de carbono nas empresas? O mapeamento de emissões está se tornando uma prática cada vez mais comum?

Topping – Se pegarmos as 500 maiores empresas globais, é algo comum – a grande maioria delas revela seus dados e realiza esse processo todo ano, não há questionamento ou necessidade de explicar a importância dessa ação para essas corporações.
Mas no geral, do lado de fora desse grupo, o processo está praticamente nos primeiros dias. Se olharmos para o mais recente relatório de reporte de emissões veremos que muitas empresas estão começando a responder agora e muitas não o fazem.
As empresas ainda estão aprendendo sobre como pensar a questão e organiza-la e os investidores ainda estão aprendendo como usar esse tipo de informação. Já demos o primeiro passo, agora estamos desenvolvendo uma linguagem própria para os negócios em relação às mudanças climáticas, diferente da científica.
IS – O senhor acha razoável que o volume de emissões de carbono venha a ser taxado por governos por meio de impostos verdes? Conhece experiências nesse sentido?
Topping – É uma questão complicada, porque taxas servem para elementos ruins e não bons, mas frequentemente esse princípio não é seguido. Taxamos empregos, por exemplo, algo que pesa muito para as pequenas empresas, e não taxamos emissões, que são maléficas para todo mundo.
Falando de modo geral, é útil taxar elementos que devemos reduzir, pois dessa forma indica-se um preço ao mercado. E há muitas formas de fazer isso. Vemos exemplos de sucesso como o sistema de comércio de emissões da Comissão Européia e o chamado Carbon Reduction Commitment  (Compromisso de redução de carbono) no Reino Unido.
Também Reino Unido, quando a taxa para aterros surgiu, veio em um momento em que muitos diziam, “a propósito, temos gasto muito dinheiro com isso e é provável que essa quantia dobre nos próximos cinco anos”. Então, as taxas funcionam quando já se tem um custo material sendo percebido.
Os desafios são políticos tanto quanto para qualquer outra questão, um exemplo disso é a clássica taxa verde para comércio de peróxido na América. Quando ela foi proposta todos diziam “nossa, isso vai custar uma fortuna”, mas na verdade o capitalismo é muito eficiente na resolução de problemas.
Então, as pessoas sempre reclamam de taxas ou sistemas de comércio que tenham um possível custo envolvido, mas quando eles são estabelecidos, muitos acreditam ser uma maneira eficiente de resolver os problemas. Os americanos introduziram padrões para a eficiência de combustível ao invés de taxá-lo. Acredito que todos esse mecanismos  são necessários porque temos custos conhecidos, e o sistema capitalista toma más decisões sem informação.
IS – Que medidas mais concretas governos, empresas e sociedades podem e devem tomar para uma efetiva redução nas emissões de carbono?
Topping – Medidas como internalização de custos, formas efetivas de regulação, aplicação de padrões eficientes para consumo de combustível, laptops, carros, uso de ar-condicionado, construção de edifícios.
E por outro lado suporte do governo para pesquisa e desenvolvimento, criação de fundos para universidade, pesquisas ou redução de taxas, desenvolvimento de tecnologias limpas. Mas precisamos encontrar a coragem e convicção política para isso.
O caso de Marina Silva é muito interessante, vocês tiveram uma candidata verde para presidente que obteve aproximadamente 20% dos votos e estou certo de que teve influência sobre os outros candidatos e mudou a discussão da agenda política.
Tecnologias existem, medidas existem, mas é necessária a coragem política de dizer “nós temos que fazer isso”, uma liderança política mais ambiciosa para dar um fim a essa espécie de disputa entre América e Europa, Índia, Brasil, China. Precisamos ter uma estrutura global clara.
IS – Qual sua expectativa para a COP-16, em Cancun, no México?
Topping – Às expectativas gerais são muito baixas, incluindo a nossa. Estive em Copenhagen e foi uma confusão. Lá, todos queriam incluir sua questão na agenda das mudanças climáticas, como direito de minorias, etc. Dezenas de líderes tentando negocia-las foi algo muito complicado. De certa forma, o fato de haver muito menos pressão sobre o México é algo positivo, talvez possamos ter algumas surpresas por parte de China, Brasil, Índia e das economias em desenvolvimento. Não espero muito, mas é curioso que estou esperançoso já que não espero muito avanço.
IS – Quando o IPCC da ONU anunciou o aquecimento global, no final de 2006, os cientistas pregavam um desafio denominado 80-20 (reduzir em 80% as emissões de carbono ao longo de 20 anos). Isso evidentemente não ocorrerá. Observa-se, inclusive, um aumento do volume de emissões. Como alterar a rota?
Topping – É possível. Muito disso depende de liderança, da coragem dos líderes. A tecnologia para tanto existe, o que precisamos é de uma liderança política mais ambiciosa para parar essa espécie de disputa entre América e Europa, Índia, Brasil, China.
Precisamos ter uma estrutura global clara. Porque, atualmente, se a floresta Amazônica  está sendo destruída pelas mudanças aclimáticas, então o Brasil ganha porque tem uma melhor negociação e posição. Se o sudoeste americano fica sem água por causa das mudanças climáticas então os americanos têm vantagem, é um tipo de jogo maluco e injusto. Mas definitivamente é possível mudar e cada ano que passa o problema tem ficado pior.

IS – As sociedades estão fazendo bem a sua parte? O que falta?


Topping –
Os consumidores têm muito poder nas mãos, tomam bilhões de decisões todos os dias por meio do que compram. Então temos uma série de pontos, um é tomar decisões mais conscientes e dizer às empresas que se está fazendo isso. Dizer a alguém da empresa por meio dos networks de diálogo existentes nos negócios. Se uma pessoa ouve três, quarto vezes “eu comprei esse produto porque ele é verde” isso começa a impactar o comportamento dos outros.
Também acredito que seja realmente importante as pessoas estarem atentas a mensagem que transmitem por meio do que compram.  E é por vezes difícil para os indivíduos porque eles sentem como se fosse um grande problema.  Às vezes tudo muda por meio de uma conversa.

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