Estudo NEXT – RH na autoescola

Estudo NEXT – RH na autoescola

Por Denize Dutra

Quando nos deparamos com as dez tendências identificadas pelo estudo de Ideia Sustentável, fica ainda mais evidente o papel do RH como agente de transformação nas organizações, sejam elas de mercado ou públicas.

As novas ideias, para serem adotadas, exigem mudança de modelo mental e, para que isso aconteça, teremos de ir muito além do alinhamento estratégico com os negócios; precisaremos ser agentes de mudanças profundas, na revisão de crenças e de conceitos que sempre nortearam nossas ações. Teremos ainda de adotar novos padrões de comportamentos no trabalho, nas relações com todas as partes interessadas, no consumo, no uso de recursos, na própria forma de perceber o trabalho.

Ao longo da minha carreira, conheci muitos profissionais fantásticos, verdadeiros exemplos daquilo que o RH cobra dos demais gestores. E mesmo as experiências que não foram positivas serviram de alavanca para uma profunda autocrítica sobre o papel desse profissional e as limitações que ele precisa vencer para um dia ocupar o “banco do motorista”.

Quando solicitaram a minha reflexão, especificamente, sobre a tendência: “Criar um ambiente organizacional favorável que estimule e recompense os colaboradores interessados em contribuir com inovações para o melhor cumprimento das metas de sustentabilidade da empresa. Incorporar o vetor sustentabilidade a um plano de incentivos visando a recompensar os colaboradores via condicionamento de remuneração variável a resultados de triple bottom line”, percebi que seria muito difícil abordar esse ponto sem me referir às demais tendências, que estão interconectadas.

Acredito que a primeira reflexão é entender o que seria esse “ambiente organizacional favorável”, quando pensamos na realidade brasileira, na qual ainda predominam aspectos da cultura organizacional com grande distância de poder, de individualismo, de visão de curto prazo, de paternalismo, de caça aos culpados, de punição, enfim, fatores que estão na contramão do favorecimento à inovação para o melhor cumprimento das metas de sustentabilidade da empresa.


O segundo ponto é o sistema de remuneração das organizações, que, apesar do discurso do RH alinhado aos negócios, de participação em resultados, de integração entre estratégias, desempenho e remuneração, ainda vemos, na prática, pouca transparência, falta de critérios claros, valorização do individual em detrimento da equipe e de resultados de curto prazo, indicadores financeiros e pouca valorização de indicadores de desenvolvimento social e ambiental.

Os dois pontos acima já demonstram que, mais do que uma das dez tendências do RH e sustentabilidade, estamos diante de um grande desafio para esse setor diminuir a distância entre o real e o desejado, para deixar de ser o passageiro do banco de trás e passar para o banco do motorista!

Considerando que somos um país com dimensões continentais, de muita diversidade cultural e com múltiplas influências de modelo de gestão, já se percebe um avanço em algumas organizações, especialmente naquelas internacionalizadas e de capital aberto, que, por contingências das diversas normas hoje em vigor, acabam por ter de cuidar mais do vetor sustentabilidade em suas três dimensões (econômica, social e ambiental) e alinhar suas políticas de RH, inclusive de remuneração e recompensas, a essas atuais demandas.

Talvez por isso, em algumas empresas, o RH já senta no banco do passageiro da frente, mas ainda está longe de assumir a direção desse processo. Não quero parecer pessimista ou desacreditar dessa possibilidade; apenas acho importante entendermos que esse processo dependerá de muitas mudanças de paradigmas e, principalmente, de muita capacitação dos profissionais e executivos de Recursos Humanos.

Nesse sentido, não poderia deixar de citar Edgar Morin e questionar se estamos dispostos a mudar nosso papel de atores para o de autores dessa nova história. Essa autoria se faz com escolhas, e escolhas dependem de conhecimento sobre a realidade e suas tendências, de clareza de valores, de senso de propósito e missão, de autonomia.

Quando o RH deixou a fase de mero Departamento de Pessoal, que cuidava da formalização das relações capital-trabalho, para a fase das relações humanas, era natural que experimentasse o outro extremo, focando o olhar apenas no trabalhador e em suas condições de trabalho, sem valorizar os demais stakeholders do negócio. Isso pode ter feito sentido num momento político, social e econômico, mas já não atende às reais demandas organizacionais e da sociedade.

Precisamos contribuir para transformar o entendimento de que empregadores e empregados sempre terão interesses conflitantes. Se o negócio não for economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente sustentável, não teremos geração de renda, tributos e desenvolvimento social. Ou seja, todas as partes interessadas, inclusive os acionistas, precisam ser beneficiados.

Temos de abandonar de vez o discurso hipócrita do lucro como pecado. Uma das grandes questões que a sustentabilidade traz à tona é exatamente a importâncias das relações éticas entre todas as partes envolvidas. O que não cabe mais é o lucro a qualquer preço, no qual os fins justificam os meios.

Por outro lado, investir no capital humano, sem considerar qual o valor agregado que isso trará para todas as partes envolvidas, também tira a credibilidade da área de RH. Queremos colocar o ser (recurso) humano como protagonista ou como vítima desse processo que visa à sustentabilidade das organizações e das sociedades, em que as mesmas estão inseridas?

Já vemos algumas iniciativas de organizações que estão buscando incorporar o vetor sustentabilidade a um plano de incentivos, visando a recompensar os colaboradores via remuneração variável a resultados de triple bottom line, na medida em que suas entregas e competências requeridas estão associadas não apenas a indicadores econômicos, mas também aos indicadores sociais e ambientais.

Além das dimensões organizacionais, acredito que essa tendência contribui para o fortalecimento de uma carreira sustentável. Os colaboradores podem focar mais atenção no desenvolvimento de competências duráveis (intra, interpessoais e de gestão) e na constante atualização das competências técnicas, já que, nesse campo, o grau de obsolescência é muito elevado.

A valorização da gestão do conhecimento garante a sustentabilidade da carreira, por meio da aprendizagem grupal, bem como a perenidade das próprias organizações, que precisam desse ativo intangível para cumprirem a sua missão.

Denize Dutra é diretora da consultoria Denize Dutra Gestão e Desenvolvimento e coordenadora do MBA em Gestão Estratégica e Econômica de RH da FGV-SP.

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