Curtis Ravenel

Curtis Ravenel

Otimismo consciente
Por Cristina Tavelin

Com cerca de um terço do mercado global em dados financeiros nas mãos, a multinacional americana Bloomberg LP não poderia deixar de olhar para riscos e oportunidades da sustentabilidade. Fundada no início dos anos 80 pelo atual prefeito de Nova Iorque, Michel Bloomberg, em parceria com outros investidores e com a gigante do setor financeiro Merrill Lynch, a empresa fornece ferramentas de software para finanças, serviços de análise de dados e gera notícias para corporações em todo o mundo.

Em passagem pelo Brasil, Curtis Ravenel, chefe global de sustentabilidade da Bloomberg, conversou com Ideia Sustentável sobre os desafios corporativos para os próximos dez anos. Ravenel – que se diz “conscientemente otimista” sobre a integração da sustentabilidade no setor financeiro – já atuou no Conselho Consultivo de Reciclagem, em Washington DC (EUA), e hoje é considerado um dos principais especialistas em informações e pesquisas sobre responsabilidade corporativa em nível global.

Ideia Sustentável: Na sua avaliação, as empresas avançaram mais do que os governos na Rio+20?

Curtis Ravenel: Sim. Em geral, as empresas têm sido bem-sucedidas. Muitas delas saíram bem da crise financeira enquanto os governos passaram por tempos mais difíceis com queda de receita e recessão econômica.  Certamente, empresas com ações no longo prazo têm sido capazes de superar esse tipo de situação muito bem. Acredito que seja muito mais fácil tomar decisões e realizar mudanças no nível corporativo, em comparação com o governamental. E o setor privado realmente está evoluindo em relação a questões de sustentabilidade. Por exemplo: em 2005, cerca de 780 empresas reportavam suas atividades socioambientais. Hoje, temos quase 6.000. É interessante notar esse avanço. Entretanto, não significa que estejam fazendo o suficiente.

IS: Como avalia o cenário para o setor privado a partir dos compromissos assumidos na Conferência da ONU?

CR: As empresas não se comprometeram com nada que não possam cumprir. Certamente são capazes de alcançar as ambições anunciadas; muitas delas já estavam fazendo e comunicando suas ações. Então, acredito que não haverá desafios demais para as companhias assumirem suas obrigações e compromissos.

IS: Acredita que esses compromissos vão começar a sair do papel em breve?

CR: É difícil dizer, mas se as empresas estabeleceram-nos publicamente, acredito que sim. O que me deixa otimista é que muitas delas, quando começam a olhar para questões sustentáveis de maneira séria, são capazes de encontrar valor real – não apenas para a marca, do ponto de vista de relações públicas, mas também do econômico; são capazes de economizar dinheiro e se comportar de maneira mais sustentável. Quando investem em seu capital humano, por exemplo, têm taxas de retenção de emprego mais altas e se tornam mais produtivas e eficientes.

Os impactos ambientais negativos geralmente resultam de algum tipo de ineficiência nas operações. Então, o mais encorajador é o tamanho da oportunidade em gestão de riscos e no desenvolvimento de novos produtos e serviços para lidar com as mudanças climáticas. Existem oportunidades únicas e precisamos ter habilidade para descobri-las. Mas precisa-se muito mais. As empresas que estão fazendo algo devem ir além; e as que não estão fazendo nada têm de começar a agir.

IS: As grandes corporações devem impulsionar a sustentabilidade entre as pequenas empresas? Como podem atuar nesse sentido?

CR: Elas realmente precisam ajudar. Por exemplo, empresas como Walmart ou Microsoft agora estão requisitando que seus fornecedores se engajem com o tema, pois eles podem ser determinantes para a sustentabilidade delas mesmas. A maior parte das pequenas empresas faz negócios com grandes corporações e, quando solicitadas para serem mais verdes, geralmente encaram a mudança. As corporações possuem habilidade para influenciar, serem líderes e ajudar na criação de boas relações de trabalho. Vemos a mesma coisa no setor de investimentos, em que os proprietários estão solicitando aos gestores para manejarem seu dinheiro de forma mais sustentável.

Estou nesse meio há 27 anos e, efetivamente, sou otimista. Conscientemente otimista. Há muitas empresas desenvolvendo ações interessantes. Não é um movimento completo, mas alguns líderes, em diferentes setores, estão começando a impulsionar um modelo de negócios mais sustentável.

IS: Quais os principais riscos e oportunidades para as corporações nos próximos 10 anos, considerando uma gestão sustentável?

CR: Realmente acredito naquilo que chamamos de “noção estendida de capital” – que vai além do financeiro, incluindo aspectos humanos e ambientais. Nos próximos dez anos devemos ter uma metodologia de precificação de carbono. No Japão, Austrália, partes da China, Califórnia (EUA) e Europa, já existem métodos para isso. E, mesmo que não haja em outros países, eles acabarão sendo influenciados devido à solicitação crescente desses dados. As bolsas de valores estão requisitando informações sobre o desperdício e uso de água e energia pelas empresas. O próximo passo é encontrar uma maneira comum a todos para fazer isso. Agora as companhias estão coletando informações socioambientais e de governança. Uma vez com esses dados em mãos, poderemos valorá-las. As metodologias para avaliar serviços de ecossistemas terão cada vez mais adesão. Há muito trabalho sendo realizado nesse sentido e veremos seus resultados nos próximos dez anos. As empresas terão de precificar os recursos de qualquer forma – a comunidade financeira e de investimentos irá requisitá-los mesmo que os governos não exijam.

IS: Então, o maior desafio será a criação de uma metodologia comum?

CR: Para responder a pergunta diretamente: sim, o maior desafio será desenvolver uma metodologia de uso coletivo para precificar apropriadamente os recursos e ecossistemas. Serviços públicos, empresas, indivíduos, comunidade científica, comunidade financeira – todos concordam que o caminho é muito complexo. Mas já fizemos coisas complexas antes. Será um trabalho difícil, mas acontecerá.

IS: Na sua opinião, quais características um líder deve ter para lidar com mudanças e conduzir uma organização de forma sustentável?

CR: Há uma série de características. Primeiro, precisa ter uma visão clara do que deseja alcançar, ser confiante e colaborativo, não apenas com seu próprio público interno mas também com os setores com os quais normalmente estabelece uma relação competitiva. Também creio que deve ser apaixonado pelo tema e precisa ver em sentido mais amplo a comunidade e o significado de ser bem-sucedido. Colaboração, paixão e uma visão holística no longo prazo, esse é o tipo de olhar que precisamos hoje – e não aquele estagnado nos relatórios financeiros de curto prazo.

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