Educação de líderes em sustentabilidade

Educação de líderes em sustentabilidade

Dá para preparar na escola de negócios um líder em sustentabilidade como os que entrevistei no livro Conversas com Líderes Sustentáveis?

Essa foi uma das perguntas mais frequentes nos encontros realizados pela Plataforma Liderança Sustentável em 2011.

A resposta é sim. Mas as escolas de negócio terão de mudar a sua maneira de ensinar.

Antes de apresentar argumentos, socorro-me na crítica ácida e divertida de Harold J. Leavitt, lendário professor de Stanford, para quem “escolas de negócio desenvolvem um processo estranho que distorce aqueles que são sujeitos a ele e os converte em criaturas com mentes desequilibradas, corações de pedra e almas sem vida”.

Descontado o exagero da imagem, o que me interessa especificamente da afirmação de Leavit é o juízo sobre um tipo de educação ainda muito apegado a um pensamento empresarial do século passado, a uma lógica  cartesiana e mecanicista, excessivamente centrado no ferramental técnico, que compartimentaliza as disciplinas do conhecimento e ignora os novos papéis das empresas no relacionamento com a sociedade e o meio ambiente.

Se realmente quiser formar líderes para a sustentabilidade, a escola não poderá apenas “depositar” conhecimento teórico na cabeça dos alunos ou treinar competências. Precisará, sim, desenvolver novos modelos mentais para que os jovens líderes passem a rodar com um novo software, diferente daquele em que as empresas eram entidades autistas, meio ambiente e sociedade representavam um universo paralelo à existência corporativa e a racionalidade econômica bastava para explicar o mundo e a vida.

A saída, claro, está em incorporar a sustentabilidade nos programas de educação de gestores. Mas isso não pode ser feito como normalmente se faz, por inércia, apenas tratando-a como um conteúdo suplementar. Deve, sim, ser um elemento transversal de todo o processo educacional, capaz de ampliar a visão sobre a maneira de pensar e fazer negócios. E de impregnar, portanto, disciplinas tradicionais como macro e microeconomia, planejamento, marketing, estratégia e gestão de pessoas.

São dois os desafios impostos aos educadores. Um é curricular, diz respeito ao que ensinar. Para fazer frente aos atuais desafios de sustentabilidade, os currículos, ainda hoje muito fragmentados, precisam abrigar diferentes campos de conhecimento, abrindo espaço para abordagens mais sistêmicas. Valorizar as questões éticas e promover análises transdisciplinares a respeito de questões políticas, sociais, tecnológicas e ambientais estão entre as medidas recomendáveis.

Outro desafio é, obviamente, pedagógico e está na dimensão do “como ensinar”. Para formar uma linhagem de líderes críticos, capazes de questionar premissas empresariais ainda hoje sacralizadas – como, por exemplo, a noção de externalidade, a obsessão pelo resultado trimestral, a não incorporação dos custos socioambientais nos produtos ou ainda a obsolescência programada –, a escola de negócios terá de elaborar propostas de ensino mais horizontais, menos fundadas na transferência vertical de conteúdos, encorajando a convivência com outros pontos de vista, ainda que conflitantes com as velhas teorias ensinadas há mais de 70 anos.

Deverá ser, também na sociedade, exemplo vivo de comportamento sustentável, envolvendo professores em atividades voluntárias para a comunidade, controlando suas emissões de carbono ou adotando práticas de ecoeficiência em suas instalações. Afinal, o exemplo, como se sabe, educa muito mais do que a palavra.

Sobre educação para a sustentabilidade, recorro a uma autoridade no assunto, Peter Senge, professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Segundo ele, a educação só funcionará, de verdade, “se as escolas que aprendem e ensinam estiverem em comunidades que aprendem e ensinam para a sustentabilidade”. Isso significa, na prática, uma revisão radical de modelos, baseada numa visão mais pluralista, que pode combinar fundamentos do pensamento sistêmico e contribuições do modelo integral (organizado por Ken Wilber), que considera, além dos sistemas, as dinâmicas psicológicas dos indivíduos que aprendem, as influências comportamentais e culturais.  Impõe-se a adoção de novos formatos e mudanças profundas nos papéis e responsabilidades dos educadores.

Um modelo defendido por Senge é o da Team Academy, uma experiência finlandesa de educação corporativa estruturada menos no PowerPoint e mais nas vivências, em que se aprende fazendo. Não há professores no sentido tradicional. Mas tutores de aprendizagem. Segundo o autor de Quinta Disciplina, um dos fatores limitantes do formato atual de ensino é que ele torna os alunos exageradamente obedientes ao que se ensina. E a obediência viola um importante princípio da aprendizagem que é o de o aprendiz aprender o que quer, agindo em torno de algo que realmente o preocupa.

Na opinião do professor do MIT, grande parte do aprendizado que nos interessa em sustentabilidade ocorre em nossas vidas, não em salas de aula de treinamento corporativo. Para ele, nenhuma instituição, por melhor que seja, tem o poder de formar pessoas. O máximo que pode fazer é oferecer os ambientes e as situações para que cada indivíduo crie a sua própria demanda de educação para a sustentabilidade.

No livro Conversas com Líderes Sustentáveis perguntei a Guilherme Leal, copresidente do Conselho da Natura, se ele acredita que as escolas de negócio podem educar líderes para a sustentabilidade.  Reproduzo sua resposta provocativa: “Não há um modelo mágico. Teremos de aprender desse jeito difícil de aprender que está aí. No entanto, se acharmos que, de alguma forma, não somos capazes de criar modelos mais criativos, mais instigantes e mais permissivos aos valores da sustentabilidade, então teremos de aceitar de bom grado o fracasso das escolas na formação dos novos líderes”.

Concordo com Leal e Senge. Melhor pensar agora na formação de nossos líderes do que depois, mais tarde, quando dermos pela falta deles. A educação só mudará com a mudança das pessoas.

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